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quarta-feira, 5 de março de 2025

Wałęsa e amigos em prol da Ucrânia


Endereço curto: fishuk.cc/walesa-ua

Meu amigo Claudio me mandou outro dia uma tradução desta carta aberta a Donald Trump publicada em 3 de março pelo ex-presidente polonês Lech Wałęsa (pron. “lérr vauénnça”) em sua página do Facebook e assinada por diversos outros prisioneiros políticos do tempo da Polônia socialista. Porém, a edição estava péssima, e decidi procurar o original, o que consegui por meio do New York Times, que a traduziu pro inglês e deixou o link original. O ex-líder sindicalista e fundador do célebre sindicato “Solidariedade”, que enfrentou os governos de Stanisław Kania e, após o golpe militar de 1981, do general Wojciech Jaruzelski, na virada entre as décadas de 1970 e 1980, expressou sua repulsa quanto ao (des)tratamento concedido pelo Imperador do Mundo ao presidente ucraniano Volodymyr Zelensky em Washington, no último 28 de fevereiro.

Embora de idade bem avançada e mesmo não tendo sido muito aprovado como primeiro presidente da Polônia pós-soviética, Wałęsa ainda tem sua voz muito respeitada e chegou a participar em manifestações de rua contrárias a vários retrocessos que o atual presidente ultraconservador Andrzej Duda queria impor. A sorte, pelo menos, é que na “Polska” até a extrema-direita é anti-Putler, o que não é necessariamente o caso em outros países da Europa e das Américas, e a contrariedade a Moscou nasceu de séculos de dominação imperial e repressão à cultura local, bem antes do bolchevismo.

Deixo a vocês o desfrute do conteúdo, lembrando apenas que entre nossas “ex-querdas”, ainda existe uma gigante incompreensão sobre a natureza do regime soviético e de seu surgimento e evolução nos países vizinhos a partir de 1945. Só porque esse bloco se dizia “antiamericano”, nossos “comunistas” se calaram diante da desumanização das populações locais, denunciando apenas os excessos ocorridos sob governos ditos “capitalistas” e “burgueses”. Infelizmente, esse desconhecimento, alimentado pela falta de domínio de línguas estrangeiras e pela tradução mais ampla somente de literatura enviesada (tanto pró-URSS quanto da direita moralista), acaba legitimando a defesa do indefensável, a qual termina se estendendo do terrorismo comunista pro genocídio putinista. Só pra ficar contra o Til Çan...

Associando essa distopia aos delírios do Tio Patinhas, Wałęsa joga nessa juventude aloprada um banho de água fria.



O Carnaval alemão costuma ser muito mais político (ou politizado) do que o nosso, mesmo no tocante aos carros alegóricos.


Depois da decisão dos EUA de suspender os fornecimentos à Ucrânia, se a resposta estivesse em minhas mãos, seria “Vamos fazer nossa parte”, nem um passo para trás. AMÉM.

Assinamos este texto:

Caro Senhor Presidente,

Assistimos com horror e desgosto à reportagem de sua conversa com o Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Esperamos que o sr. demonstre respeito e gratidão pela assistência material fornecida pelos EUA à Ucrânia na luta contra a ofensiva da Rússia. Agradecemos aos heroicos soldados ucranianos que derramaram seu sangue em defesa dos valores do mundo livre. Eles são os que estão morrendo na linha de frente há mais de 11 anos em nome desses valores e da independência de sua pátria atacada pela Rússia de Putin.

Não entendemos como o líder de um país que é um símbolo do mundo livre não consegue ver isso.

Também ficamos horrorizados pelo fato de que a atmosfera no Salão Oval durante essa conversa nos lembrou daquela que lembramos bem dos interrogatórios do Serviço de Segurança e dos tribunais comunistas. Promotores e juízes comissionados pela todo-poderosa polícia política comunista também nos explicaram que eles tinham todas as cartas na mão e nós não tínhamos nenhuma. Eles exigiram que interrompêssemos nossas atividades, argumentando que milhares de pessoas inocentes estavam sofrendo por nossa causa. Eles nos privaram de nossa liberdade e direitos civis porque não concordamos em cooperar com as autoridades e não lhes mostramos gratidão. Ficamos chocados que o sr. tenha tratado o presidente Volodymyr Zelensky de maneira semelhante.

A história do século 20 mostra que toda vez que os EUA tentaram se distanciar dos valores democráticos e de seus aliados europeus, acabaram ameaçando a si mesmos. O presidente Woodrow Wilson entendeu isso e decidiu levar os EUA à 1.ª Guerra Mundial em 1917. O presidente Franklin Delano Roosevelt entendeu isso quando decidiu, após o ataque a Pearl Harbor em dezembro de 1941, que a guerra em defesa da América seria travada não apenas no Pacífico, mas também na Europa, em aliança com os países atacados pelo Terceiro Reich.

Lembramos que sem o presidente Ronald Reagan e o envolvimento financeiro americano, a desintegração do império da União Soviética não teria sido possível. O presidente Reagan sabia que na Rússia Soviética e nos países que conquistou, milhões de pessoas escravizadas estavam sofrendo, incluindo milhares de prisioneiros políticos que pagaram por seu sacrifício em defesa dos valores democráticos com sua liberdade. Sua grandeza consistia, entre outras coisas, em ter chamado sem hesitação a URSS de “Império do Mal” e declarado uma luta decisiva contra ela. Nós vencemos, e uma estátua do presidente Ronald Reagan está hoje em Varsóvia, em frente à Embaixada dos EUA.

Senhor Presidente, a ajuda material (militar e financeira) não pode ser equivalente ao sangue derramado em nome da independência e da liberdade da Ucrânia, da Europa e de todo o mundo livre. A vida humana não tem preço, seu valor não pode ser medido com dinheiro. A gratidão é devida àqueles que sacrificam seu sangue e sua liberdade. Para nós, membros do “Solidariedade”, antigos prisioneiros políticos do regime comunista a serviço da Rússia Soviética, isso é óbvio.

Apelamos aos EUA para que honrem as garantias que eles e a Grã-Bretanha forneceram no Memorando de Budapeste em 1994, que estipula explicitamente um compromisso de defender a inviolabilidade das fronteiras da Ucrânia em troca dela entregar seu arsenal de armas nucleares. Essas garantias são incondicionais: não há uma palavra sobre tratar tal ajuda como troca econômica.


Lech Wałęsa, ex-prisioneiro político, líder do Solidariedade, presidente da Terceira República Polonesa
Marek Beylin, ex-prisioneiro político, editor de editoras independentes
Seweryn Blumsztajn, ex-prisioneira política, membro do Comitê de Defesa dos Trabalhadores
Teresa Bogucka, ex-prisioneira política, ativista da oposição democrática e da Solidariedade
Grzegorz Boguta, ex-prisioneiro político, ativista da oposição democrática, editor independente
Marek Borowik, ex-prisioneiro político, editor independente
Bogdan Borusewicz, ex-prisioneiro político, líder do movimento clandestino Solidariedade em Gdańsk
Zbigniew Bujak, ex-prisioneiro político, líder do movimento clandestino Solidariedade em Varsóvia
Władysław Frasyniuk, ex-prisioneiro político, líder do movimento clandestino Solidariedade em Wrocław
Andrzej Gincburg, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade
Ryszard Grabarczyk, ex-prisioneiro político, ativista do Solidariedade
Aleksander Janiszewski, ex-prisioneiro político, ativista do Solidariedade
Piotr Kapczyński, ex-prisioneiro político, ativista da oposição democrática
Marek Kossakowski, ex-prisioneiro político, jornalista independente
Krzysztof Król, ex-prisioneiro político, ativista pela independência
Jarosław Kurski, ex-prisioneiro político, ativista da oposição democrática
Barbara Labuda, ex-prisioneira política, ativista clandestina do Solidariedade
Bogdan Lis, ex-prisioneiro político, líder do movimento clandestino Solidariedade em Gdańsk
Henryk Majewski, ex-prisioneiro político, ativista do Solidariedade
Adam Michnik, ex-prisioneiro político, ativista da oposição democrática, editor de editoras independentes
Sławomir Najnigier, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade
Piotr Niemczyk, ex-prisioneiro político, jornalista e impressor de publicações clandestinas,
Stefan Konstanty Niesiołowski, ex-prisioneiro político, ativista pela independência
Edward Nowak, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade
Wojciech Onyszkiewicz, ex-prisioneiro político, membro do Comitê de Defesa dos Trabalhadores, ativista do Solidariedade
Antoni Pawlak, ex-prisioneiro político, ativista da oposição democrática e da Solidariedade clandestina
Sylwia Poleska-Peryt, ex-prisioneira política, ativista da oposição democrática
Krzysztof Pusz, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade
Ryszard Pusz, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade,
Jacek Rakowiecki, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade
Andrzej Seweryn, ex-prisioneiro político, ator, diretor do Teatro Polonês em Varsóvia
Witold Sielewicz, ex-prisioneiro político, impressor de editoras independentes
Henryk Sikora, ex-prisioneiro político, ativista do Solidariedade
Krzysztof Siemieński, ex-prisioneiro político, jornalista e impressor de publicações clandestinas
Grażyna Staniszewska, ex-prisioneira política, líder do Solidariedade na região de Beskidy
Jerzy Stępień, ex-prisioneiro político, ativista da oposição democrática
Joanna Szczęsna, ex-prisioneira política, editora da imprensa clandestina Solidariedade
Ludwik Turko, ex-prisioneiro político, ativista clandestino do Solidariedade
Mateusz Wierzbicki, ex-prisioneiro político, impressor e jornalista de editoras independentes



Alice Weidel, líder da AfD, é retratada como dando um “falso agrado” aos jovens eleitores alemães de primeira viagem.



As redes sociais são apresentadas como a “fábrica de doces” onde a extrema-direita fabrica suas “deliciosas” mentiras.

segunda-feira, 29 de abril de 2019

Irena Santor: “Tobie nic do tego” (1970)


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/tobienic


Enfim uma canção inteira traduzida diretamente do polonês: esse é um déficit que pretendo sanar gradualmente, pois sei que devo muito aos admiradores da Polônia e descendentes de poloneses no Brasil. Hoje temos a cantora polonesa Irena Santor, considerada a “rainha da canção polonesa”, com uma música gravada em 1970, Tobie nic do tego (Não é da sua conta), com letra de Zbigniew Stawecki e melodia de Ryszard Sielicki. Eu mesmo traduzi direto do polonês, montei o vídeo e legendei, tendo tirado o áudio desta página.

Esta canção apareceu duas vezes em álbuns de Santor: no disco LP Dla ciebie śpiewa Irena Santor (Irena Santor canta pra você), daquele mesmo ano, e no CD Moje piosenki vol. 10 (Minhas canções vol. 10), lançado em 1999. Percebam que a letra é um verdadeiro trava-língua, num idioma que por si mesmo já é um trava-língua pra maioria dos estrangeiros! Há muitas repetições de palavras e encavalamento de consoantes, sobretudo palatais, somados ainda a um ritmo dançante. Tudo isso junto dá o sabor da música, que por isso decidi traduzir.

Os anos 70 seriam considerados na Polônia comunista como uma espécie de “era de ouro”, quando após pequenas reformas sob o governo de Edward Gierek, a vida do povo melhorou razoavelmente. Temas como o dessa canção (a futilidade dos amores e a brevidade dos relacionamentos) desafiavam tanto o senso comum católico quanto o puritanismo pró-soviético, e Irena Santor soube muito bem quebrar todos esses padrões, virando uma “diva” em seu país. Nessa década, apesar da constante censura, a cultura polonesa, em especial a música, não deixou de prosperar e viveu momentos marcantes.

Irena Wiśniewska-Santor nasceu em 1934 e é uma cantora, atriz e estrela de musicais em atividade desde 1949. Conhecida por sua límpida voz de mezzo-soprano, sendo por isso uma referência aos mais jovens, começou sua carreira como solista do famoso grupo folclórico Mazowsze, e assim começou a viajar pelo mundo e ganhar prêmios. Estreou como atriz em 1968, apareceu em muitos shows de rádio e TV, foi jurada de programas de talentos e gravou trilhas até pra filmes soviéticos. Em 2017, por seu pioneirismo no país, recebeu um doutorado honoris causa pela Academia de Música de Łódź. Foi casada duas vezes, mas não teve filhos.

Assistam ao vídeo duas vezes, lendo uma legenda de cada vez, mesmo a polonesa, se puderem! Seguem abaixo minha legendagem, a letra em polonês, que copiei deste ótimo site de canções da Polônia, e a tradução em português:



Taki zły – no i co, no i co?
Na próżno tracisz czas.
Lubię cię – no i to, tylko to
Co łączy dwoje nas.
Tobie nic, tobie nic, tobie nic do tego,
Bo czy ja mam, czy ja mam innego
To już moja sprawa.

Widzisz sam, że to tak w życiu jest
Nie zawsze, jak się chce.
Niby już, niby tak, niby chcesz,
A serce mówi “nie”.
No i już, no i już, no i już po tobie
Że trochę żal? No to nic – więc odejdź,
Nie myśl o mnie źle.

Lecz bez reszty nie wierz w to,
Czasem mówię byle co,
A znaczy to, znaczy to na opak,
I nie bądź zły, nie bądź zły, bo chłopak
Musi klasę mieć.

Może trochę zwodzę cię,
Bardzo lubię taką grę.
A tobie nic, tobie nic do tego,
Bo jeśli w tym, jeśli w tym coś złego
Nic już nie mów mi.

Przyjdzie ktoś – no to co, no to co?
Niewiele każdy wart.
W kilka dni pryśnie czar niby szkło
Lub kruchy domek z kart.
No i znów, no i znów, no i znów od nowa,
Znów uczyć się nowych słów, całować
I przysięgi łamać.

Ja to znam, ja to znam, ja to znam,
Widziałam już nie raz,
Po co nam, po co nam, po co nam
Marnować cenny czas?
Lepiej idź, lepiej idź, lepiej idź do innej,
Tak różne są, różne są dziewczyny,
Któraś weźmie cię.

Lecz bez reszty nie wierz w to,
Czasem mówię byle co,
A znaczy to, znaczy to na opak,
I nie bądź zły, nie bądź zły, bo chłopak
Musi klasę mieć.

Może trochę zwodzę cię,
Bardzo lubię taką grę.
A tobie nic, tobie nic do tego,
Bo jeśli w tym, jeśli w tym coś złego
Nic już nie mów mi.

Czy ja mam, kogoś mam, kogoś mam
Koniecznie wiedzieć chcesz,
Powiem ci: wielu znam, wielu znam,
Sam zresztą o tym wiesz.
Tobie nic, tobie nic, tobie nic do tego:
Jak można mieć, można mieć jednego,
Kiedy tylu wokół?

Takiś ty – słyszysz mnie jeden raz
I zaraz burzysz most.
Zdradzę ci, zdradzę ci: żadna z nas
Nie lubi mówić wprost.
Powiem ci, powiem ci, powiem ci do tego,
Że ciebie chcę, ciebie chcę jednego,
Tylko ciebie chcę
Tylko ciebie chcę...

____________________

Tão mau, mas e daí, e daí?
Está perdendo tempo à toa.
Eu te amo, mas é só isso
Que ainda une nós dois.
Isso não é, não é, não é da sua conta,
Pois se eu tenho, se eu tenho outro
Já é um assunto meu.

Você vê que na vida nem sempre
Isso corre como se quer.
Parece que você ainda quer, sim,
Mas seu coração diz não.
Mas ainda, ainda, ainda um pouco
Sofro por você? Nada disso, então vá,
Não pense mal de mim.

Mas nem sempre acredite no que
Eu falo às vezes e que
Quer dizer, quer dizer o contrário,
E não seja mau, seja mau, pois um cara
Deve manter a pose.

Talvez eu te iluda um pouco,
Gosto muito de jogar assim.
E isso não é, não é da sua conta,
Pois se nisso, se nisso há algo ruim
Nem fale nada para mim.

Alguém vai chegar, e daí, e daí?
Todos merecem um pouco.
Em dias o encanto quebra como copo
Ou frágil casinha de papel.
Mas de novo, de novo, de novo do zero
De novo aprender novas palavras, beijar
E quebrar juras de amor.

Eu sei disso, sei disso, sei disso,
Já percebi várias vezes,
Para que perder, perder, perder
Nosso precioso tempo?
Melhor você, você, você procurar outra,
Há tantas, há tantas garotas diferentes,
Uma delas vai escolher você.

Mas nem sempre acredite no que
Eu falo às vezes e que
Quer dizer, quer dizer o contrário,
E não seja, não seja mau, pois um cara
Deve manter a pose.

Talvez eu te iluda um pouco,
Gosto muito de jogar assim.
E isso não é, não é da sua conta,
Pois se nisso, se nisso há algo ruim
Nem fale nada para mim.

Se eu tenho, tenho, tenho alguém
Você quer realmente saber?
Vou dizer: conheço, conheço muitos,
De todo jeito você sabe disso.
Isso não é, não é, não é da sua conta:
Como se pode ter, pode ter alguém
Com tantos em volta?

Você é assim: me escuta uma vez
E logo quebra a ponte.
Vou te decepcionar: nenhuma de nós
Gosta de falar claramente,
Mas vou te falar, te falar, te falar na cara
Que é só você, só você que quero,
Só você que quero,
Só você que quero...




terça-feira, 26 de março de 2019

Joanna Kulig – “Dwa serduszka” (2018)


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/serduszka


Este trecho ficou muito famoso no mundo do cinema por conter o tema principal do filme polonês Zimna wojna (Guerra fria), lançado em 2018 e que concorreu ao Oscar de melhor filme estrangeiro em 2019. O filme trata do período comunista da Polônia, e quem está cantando é a atriz protagonista, Joanna Kulig, no primeiro vídeo em versão jazz com arranjos de Marcin Masecki e letra adaptada por Mira Zimińska-Sygietyńska, e no segundo vídeo em coral popular com Kulig à frente. O poema original, na verdade, possui autoria anônima, e recebeu melodia própria de Tadeusz Sygietyński. A expressão serduszko pode significar em polonês o diminutivo de serce (coração) ou a figuração estilizada de um coração, que usamos em contextos apaixonados.

O filme Guerra fria é um drama que se passa na Polônia e na França entre as décadas de 40 e 60, e tem como centro do enredo um diretor musical que descobre uma jovem cantora e termina engatando um romance com ela. Nesta edição 91 do Oscar, a película concorreu aos prêmios de Melhor Filme Estrangeiro, Melhor Fotografia e Melhor Diretor, tendo sido muito aclamado ao estrear e ganhar a palma de Melhor Diretor no Festival de Cannes em 2018. Wiktor Warski (com o ator Tomasz Kot) e Zula Lichoń (interpretada por Joanna Kulig) levam uma relação de amor profundo, obsessivo e destrutivo, mas como vivem no período da Polônia comunista, têm que se adequar às regras do regime pra trabalhar. Tentando fugir pro Ocidente pra desfrutarem de liberdade criativa, veem uma oportunidade surgir na França, mas o destino acaba os separando.

Pianista e maestro de um grupo folclórico, Wiktor encontra Zula em 1949, quando fazia compilações de canções populares no interior, e se apaixona por seu caráter e talento de voz e dança. Entre as muitas viagens do músico e entre as muitas turnês do grupo folclórico da moça, eles vão se encontrando e se separando. Nesse meio Wiktor é inclusive preso num campo de trabalhos forçados na Polônia, acusado de traição e cruzamento ilegal de fronteiras, quando retornou um dia a seu país. Kulig gravou a faixa completa especialmente pro filme, e o famoso grupo folclórico Mazowsze também já tinha sua apresentação.

Eu mesmo traduzi e legendei o trecho da canção, tendo baixado um vídeo sem legendas com a cena do casal no bar L’Éclipse, em Paris, e outro vídeo sem legendas com a cena no teatro polonês, em cuja entrada há inclusive uma faixa escrita Partia – Naród (Partido – Povo). Apesar do primeiro ter legendas em inglês, foi o melhor que achei, pois um que estava sem intervenção nenhuma não tinha sincronia do som com a imagem. O final da letra, a qual copiei desta página, difere um pouco nas duas versões. Seguem as respectivas legendagens, a letra em polonês com as segundas estrofes diversas se seguindo, e a tradução em português:




Dwa serduszka, cztery oczy, ojojoj...
Co płakały we dnie, w nocy, ojojoj...
Czarne oczka co płaczecie,
Że się spotkać nie możecie,
Że się spotkać nie możecie...

Mnie matula zakazała, ojojoj...
Żebym chłopca nie kochała, ojojoj...
A ja chłopca hac! za szyję,
Będę kochać póki żyję,
Będę kochać póki żyję...

Mnie matula zakazała, ojojoj...
Żebym chłopca nie kochała, ojojoj...
Kamienne by serce było,
Żeby chłopca nie lubiło,
Żeby chłopca nie lubiło...

____________________


Dois corações, quatro olhos, oi, oi, oi...
Que choravam dia e noite, oi, oi, oi...
Olhinhos negros, vocês choram,
Pois não podem se encontrar,
Pois não podem se encontrar...

Minha mamãe me proibiu, oi, oi, oi...
De gostar de um rapaz, oi, oi, oi...
Mas o agarrei pelo pescoço,
Vou amá-lo por toda a vida,
Vou amá-lo por toda a vida...

Minha mamãe me proibiu, oi, oi, oi...
De gostar de um rapaz, oi, oi, oi...
Só sendo um coração de pedra
Para ele não amar o rapaz,
Para ele não amar o rapaz...



quarta-feira, 3 de maio de 2017

Kinga, filha do presidente da Polônia


Endereço curto: fishuk.cc/kingaduda


Mais uma garota parente de político famoso pra vocês conhecerem. Esta é Kinga Duda, filha do presidente da Polônia Andrzej Duda, eleito em maio de 2015 e empossado em agosto. Esta foi minha primeira tradução direta do polonês, língua que comecei agora a aprender devagar, ao contrário do hino nacional, pro qual me apoiei nas traduções em outras idiomas, sobretudo. O texto é bem curto, e usei dicionários online do polonês pra várias outras línguas.

Nascida em 1995, Kinga é a única filha do presidente polonês Andrzej Duda, nascido em 1972, e da professora de alemão Agata Kornhauser, um mês e meio mais velha. Formado em Direito, Andrzej começou sua carreira política no início dos anos 2000 e foi considerado um dos parlamentares mais ativos, tendo sido eleito inclusive pro Parlamento Europeu. Em 2015, com votação apertada nos dois turnos, foi eleito presidente da República pelo partido Direito e Justiça (PiS), de cariz conservador, nacionalista e um tanto eurocético. Mas logo no início do mandato, Duda criou polêmicas por estar supostamente violando a Constituição ao perdoar acusados de corrupção antes do veredito final. Parece que, assim como no Brasil e em Portugal, os poloneses sempre estão às voltas com seus políticos, nunca se sentindo totalmente representados por eles.

Católico convicto e praticante, Duda impediu que o presidente já atuante se reelegesse, e teve nos dois turnos uma votação mais considerável no leste e no sudeste, regiões mais próximas da Ucrânia e de Belarus, integrando um espaço cultural transnacional conhecido pelo catolicismo e pelo conservadorismo. A filha Kinga também é formada em Direito, e muito conhecida na Polônia, como “primeira-filha”, pelo apoio incondicional ao pai e pela “rivalidade” em beleza com Katarzyna (Kasia) Tusk, filha de Donald Tusk, primeiro-ministro da Polônia de 2007 a 2014 e atual presidente do Conselho Europeu. De fato, as duas são muito fotogênicas, visadas por revistas e versadas em postar fotos pessoais nas redes sociais. Kinga, contudo, preza mais pela discrição e formalidade, enquanto Kasia tem mais um perfil e comportamento de modelo.

Segundo um amigo meu polonês, o prenome “Kinga” ainda não está em desuso, mas apenas é menos comum. O vídeo sem legendas foi postado num canal de mídia da Polônia em 20 de maio de 2015, pouco antes do 2.º turno das eleições. Esse corte da legendagem, com duas tomadas mais aproximadas, fui eu que fiz. Num dos últimos comícios da campanha, acompanhada dos pais, Kinga diz que eles não devem se focar nas “mentiras e calúnias” contra Andrzej, mas em elegê-lo com a certeza dele ser uma pessoa íntegra e hábil. Pra traduzir, procurei uma transcrição, mas nenhum site tinha o texto exato, e assim fui juntando peças de cada um pra compor a fala real. Eu postei o vídeo com legendas no meu antigo canal do YouTube, e ele segue abaixo, acompanhado do texto em polonês, da tradução literal em português e do texto mais curto, colocado na legendagem:


Myślę, że wszyscy zdajemy sobie sprawę z tego, że na tej ostatniej prostej stanęliśmy twarzą w twarz z kampanią prawdziwie brudną, w której niektórym wydaje się, że wszystkie chwyty są dozwolone, że można posługiwać się kłamstwem i pomówieniem, żeby uderzyć w mojego tatę i naszą rodzinę. Ale my musimy się skupić na czymś innym. Musimy się skupić na tym, kogo wybierzemy w niedzielę. Ja będę stawiała na energię, na kompetentność, na uczciwość i dobre serce. Bo taki właśnie jest mój tata.

____________________


Literal: Penso que todos sabemos que nesta reta final encaramos uma campanha realmente suja, na qual alguns pensam que todo golpe é permitido, que se pode empregar mentiras e calúnias para atingir meu pai e nossa família. Mas devemos nos focar em algo diferente. Devemos nos focar em quem vamos eleger no domingo. Vou me apoiar na energia, na competência, na bondade e na honestidade. Pois exatamente assim que é meu pai.

Resumido: Pra mim todos sabemos que nessa reta final tivemos uma campanha bem suja, em que alguns pensam que virou um vale-tudo, podendo usar mentiras e calúnias pra atingir meu pai e nossa família. Mas é noutra coisa que temos de nos focar. É em quem vamos eleger domingo. Vou apostar na energia, competência, bondade e honestidade. Pois é assim que faz meu pai.


domingo, 20 de novembro de 2016

Hino Nacional da Polônia


Endereço curto: fishuk.cc/polonia


Este é o hino nacional da Polônia, chamado oficialmente Mazurek Dąbrowskiego (Mazurca de Dąbrowski), em alusão ao ritmo em que foi composta, mas também conhecida pelo seu primeiro verso, Jeszcze Polska nie zginęła (A polônia ainda não pereceu). Desde 1927 ela serve como hino do país recém-formado após a Primeira Guerra Mundial, cujo povo por mais de um século havia ficado sem Estado próprio, e teve a letra escrita por Józef Wybicki em 1797, sobre uma melodia popular de autor desconhecido.

A história do hino é muito comprida e complicada, então vou resumir aqui o que consegui ler. Na década de 1790 tropas polonesas estavam ajudando Napoleão Bonaparte em suas campanhas militares pela Europa, e uma de suas promessas era manter a existência e independência do Estado polonês, que na época existia na forma confederada da Comunidade Polaco-Lituana, ou Primeira República da Polônia. Citado na letra, Jan Henryk Dąbrowski (1755-1818), um general polonês muito respeitado e herói nacional, esteve entre os que ajudaram Napoleão nessas empreitadas. Józef Wybicki (1747-1822), jurista, poeta e ativista político e militar polonês, grande amigo de Dąbrowski, também participou das campanhas italianas das chamadas Guerras Revolucionárias Francesas, e quando estava em Reggio Emilia compôs a primeira versão das canção que se tornaria o hino da Polônia, e por isso ela também é conhecida como Canção das Legiões Polonesas na Itália. A letra faz referência a diversas passagens e personagens históricas (como o comandante militar Stefan Czarniecki), pontos geográficos (os rios Vístula e Varta) e figuras fictícias (Basia, ou Bárbara, e seu pai que lhe chora).

Tanto parte da letra quanto a melodia têm uso difundido na cultura dos países eslavos como elementos nacionalistas, e pode-se notar alguma semelhança entre o início do texto com o início dos hinos da Ucrânia e, um pouco menos, da antiga Iugoslávia, e entre sua melodia e a melodia deste último hino. A federação polonesa e lituana foi dissolvida por três potências estrangeiras em 1795, apesar de tentativas posteriores de restaurar a Polônia como Estado livre, e durante o século 19 a canção foi ganhando popularidade, até ser escolhida como hino da Polônia no final dos anos 1920 (com antigas partes do território alemão, russo e austro-húngaro o país havia sido recriado). A versão cantada hoje é encurtada e algo modificada, sendo que a original tinha inclusive referência aos Moskal, isto é, uma forma pejorativa de chamar os russos ainda hoje usada por ucranianos.

Eu não conheço polonês a fundo, por isso, embora conseguisse discernir alguns matizes e significados por meio da herança comum entre as línguas eslavas, traduzi essencialmente a partir do máximo de versões possíveis que achei nas Wikipédias em várias línguas. Até a época em que legendei o hino, não havia nenhuma tradução no YouTube, e mais ou menos um mês depois de eu ter carregado a minha, o canal Hinos Nacionais Cantados lançou sua versão própria, mas, sou sincero, de design bem inferior e letra bem infiel. Esse áudio, muito famoso, existe em várias fontes, mas eu baixei exatamente deste endereço. Seguem o vídeo legendado, a letra em polonês e a tradução em português:


1. Jeszcze Polska nie zginęła,
Kiedy my żyjemy.
Co nam obca przemoc wzięła,
Szablą odbierzemy.

Refrex (2x):
Marsz, marsz, Dąbrowski,
Z ziemi włoskiej do Polski.
Za twoim przewodem
Złączym się z narodem.

2. Przejdziem Wisłę, przejdziem Wartę,
Będziem Polakami.
Dał nam przykład Bonaparte,
Jak zwyciężać mamy.

(Refren 2x)

3. Jak Czarniecki do Poznania
Po szwedzkim zaborze,
Dla ojczyzny ratowania
Wrócim się przez morze.

(Refren 2x)

4. Już tam ojciec do swej Basi
Mówi zapłakany –
Słuchaj jeno, pono nasi
Biją w tarabany.

(Refren 2x)

____________________


1. A polônia ainda não pereceu,
Já que continuamos vivos.
O que os de fora nos tiraram
Vamos retomar na espada.

Refrão (2x):
Marche, marche, Dąbrowski,
Da terra italiana à Polônia.
Sob a sua liderança vamos
Retornar ao nosso povo.

2. Vamos cruzar o Vístula e o Varta,
Vamos ser poloneses.
Napoleão nos deu o exemplo
De como devemos vencer.

(Refrão 2x)

3. Como Czarniecki até Poznań
Após a ocupação sueca,
Para salvar a pátria
Vamos voltar pelo mar.

(Refrão 2x)

4. Lá um pai já está falando
Em prantos à sua Bárbara:
“Ouça, devem ser os nossos
Retumbando os tambores”.

(Refrão 2x)


Adendo (23/1/2019): Este registro foi feito por uma paranaense em Varsóvia, 11 de novembro de 2018, dia da Marcha da Independência, comemorando 100 anos da reconstrução da Polônia após a Primeira Guerra Mundial. São rapazes acendendo fogos e cantando o hino nacional em sua segunda estrofe e seu refrão. A marcha, liderada e convocada pelo presidente Andrzej Duda, foi criticada por ter acolhido muitos manifestantes extremistas que eram contra estrangeiros, gays, ateus, feministas etc. Uma coisa é irônica: num país que detesta o comunismo, as cores dos fogos são bem vermelhas.