segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

Mianmar afunda e esquerda não sabe


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Esta publicação já era pra ter ido ao ar no próprio dia de publicação das matérias (1.º de dezembro) ou no máximo no dia seguinte, mas por razões de calendário, só consegui concluir e lançar agora. Além disso, dada a importância política e histórica do tema, decidi não renunciar à tradução dos textos, mesmo estando com o prazo apertado pra finalizar minha tese de doutorado. Traduzi com a ajuda do Google Tradutor e depois retoquei pessoalmente estes dois artigos em inglês sobre os reveses do Exército de Mianmar contra grupos guerrilheiros dissidentes, país do Sudeste Asiático chamado “Birmânia” no passado, que sofreu um golpe militar em fevereiro de 2021 e desde então é governado por uma das juntas mais violentas do mundo. O primeiro é um editorial do Japan Times dizendo que o fim da ditadura não implica a volta automática da democracia, e o segundo é uma reportagem da Associated Press republicada pela NBC News, que fala mais do aspecto militar.

Não é “falso moralismo”, mas decidi os trazer aqui porque não vi um artigo ou vídeo sequer vindo de qualquer parte das esquerdas brasileiras criticando o golpe ou mostrando os rebeldes, muito menos chamando a atenção pro jogo duplo da China, que inicialmente apoiava o Exército de Mianmar e suas atrocidades, mas agora parece estar aos poucos transferindo seu peso pra oposição. De qualquer forma, meu objetivo principal é confirmar uma constatação que vários observadores internacionais já fizeram sobre esse barulho todo com Israel e os palestinos: quando são brancos eurodescendentes ou judeus que cometem opressão, crimes ou violações, as esquerdas beiram a histeria, mas quando são árabes, asiáticos, negros etc. se entrematando, elas comodamente se calam. E olha que em Mianmar as vítimas são muito mais numerosas, sobretudo desde o genocídio ou deslocamento forçado da minoria muçulmana rohingya pelos mesmos militares.



Membros de um grupo das forças étnicas armadas com um blindado supostamente tomado dos militares de Mianmar no estado de Shan em 24 de novembro. (Associated Press)


Devemos impedir a queda de Mianmar rumo a um Estado falido

Grupos rebeldes armados ganham terreno enquanto a junta perde o controle

A situação em Mianmar está se deteriorando, e a junta governante está perdendo o controle do país.

Infelizmente, não é a oposição democrática que está em vantagem; em vez disso, os muitos grupos rebeldes armados que estão desafiando o governo parecem estar vencendo e ameaçando com o caos.

Embora a junta deva ceder o poder, Mianmar não pode se tornar um Estado falido. As forças que buscam um Mianmar democrático e tolerante devem convergir e encontrar um terreno comum. O mundo deve ajudar a nutrir esse processo.

Mianmar não sabe o que é paz desde que os militares derrubaram o governo democraticamente eleito em fevereiro de 2021, após uma eleição em que o partido da junta foi derrotado. Esse golpe desencadeou uma guerra civil, com as forças pró-democracia se reunindo sob a bandeira do Governo de Unidade Nacional (GUN), um governo no exílio.

Vários dos grupos insurgentes lutam há muitos anos contra os diversos governos de Mianmar, incluindo o derrubado pela junta, por seus próprios direitos. Tem sido um conflito horrível. Segundo a ONU, a junta matou cerca de 4 200 manifestantes e outros cidadãos. Além disso, suas brutalidades deslocaram cerca de 2 milhões de pessoas em Mianmar, enquanto outro milhão foi impelido pela fronteira para países vizinhos.

Nos últimos meses, as forças rebeldes, em sua maioria milícias étnicas que operam nas fronteiras do país, lançaram ofensivas coordenadas. A Operação 1027, batizada conforme o dia em que começou (27 de outubro), invadiu municípios e postos militares na fronteira com a China ou perto dela.

Embora seja difícil obter informações precisas, cerca de 160 postos militares podem ter sido tomados pelos rebeldes. Membros do GUN dizem que mais ataques vão se seguir e que a ofensiva vai ser generalizada, incluindo greves e protestos nas cidades.

Embora a perda de território seja significativa (o chefe em exercício do GUN disse que as forças de resistência controlam cerca de 60% do território de Mianmar), tão ou mais prejudicial é a perda de receitas provenientes das travessias de fronteira, estimada em 40% do comércio transfronteiriço, e dos impostos que gera. Relatos recentes de ataques à capital, Nepiedó, evidenciam a fragilidade do governo.

A ampla dispersão e o combate (e as perdas) em múltiplas frentes tem minado o moral entre os soldados do governo. As deserções estão aumentando: segundo uma estimativa, cerca de 14 mil soldados podem ter abandonado a luta. O governo tem recorrido a uma campanha aérea que acarreta ataques indiscriminados e a morte de civis.

Alguns grupos também acusam o governo de usar armas químicas, o que seria um crime de guerra, se comprovado. O Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos disse que os militares também efetuam assassinatos em massa e queimam aldeias para dissuadir os civis de ajudarem seus inimigos.

Há uma fórmula pra negociações de paz. Em 2021, os líderes da Associação das Nações do Sudeste Asiático e o general Min Aung Hlaing, chefe da junta governante, concordaram em cinco pontos: o fim imediato da violência; diálogo entre todas as partes; a nomeação de um enviado especial; assistência humanitária da ASEAN; e a visita de um enviado especial da ASEAN a Mianmar pra encontrar todas as partes. O GUN também exige a libertação de todos os presos políticos, estimados em cerca de 20 mil pessoas.

A junta, no entanto, tem se recusado a encontrar membros do NUG, e a ASEAN, relutante em abandonar seu compromisso de não interferir nos assuntos internos dos Estados-membros, não tem conseguido avançar. A posição do grupo é ainda mais prejudicada pela disposição de alguns governos membros a continuarem comerciando normalmente com o governo militar de Mianmar.

Crucial pra eficácia da ASEAN é a presidência do grupo, um posto que roda anualmente entre os membros. Espera-se que o país que o detém mobilize a organização e promova seus interesses. A Indonésia detém atualmente o martelo e, embora seja um dos membros mais enérgicos e ambiciosos do grupo, não tem sido capaz de sair do impasse. A presidência em 2024 vai ser do Laos, do qual poucos esperam muito, ou nada.

Se a ASEAN for marginalizada, a China provavelmente vai desempenhar um papel mais importante no futuro de Mianmar. Ela apoia a junta e usa esse apoio pra ganhar influência num país que é central pra geopolítica do Sudeste Asiático. Mianmar é rico em recursos naturais, tem uma localização estratégica e é subdesenvolvido. As sanções que o Ocidente impôs à junta criaram uma oportunidade pra China.

Porém, nos últimos meses, a China pode estar nuançando seu apoio ao governo militar ao trabalhar com o Exército da Aliança Democrática Nacional de Mianmar, um grupo que está combatendo a junta. A China teme que a anomia nas regiões de fronteira, famosas pela produção de drogas e pelo tráfico de pessoas, se espalhe até a China. A área também é conhecida por abrigar gangues que estão realizando golpes digitais no mundo todo, o que estaria irritando a China.

No final do mês passado, caminhões que traziam mercadorias da China pra Mianmar foram incendiados depois que o governo reprimiu os golpistas. No dia seguinte, a China anunciou que seu exército realizaria exercícios na área pra “testar a capacidade de manobra rápida, a proteção das fronteiras e as capacidades de ataque de fogo das tropas em teatros de operações”.

Diplomatas chineses continuam encontrando os membros da junta pra discutir “a cooperação em matéria de paz e estabilidade e Estado de direito ao longo das zonas de fronteira”. Ao mesmo tempo que clama pelo cessar-fogo, a China também diz que mantém sua política de não interferência nos assuntos internos de Mianmar.

Embora a ASEAN tenha sido marginalizada, o mesmo aconteceu com a ONU, onde a China tem poder de veto, de fato protegendo o governo de Mianmar contra ações da organização. E embora o GUN mantenha o assento do país na ONU, ele tem lutado pra ganhar reconhecimento internacional, o qual nem o Japão nem os Estados Unidos concederam.

O resultado é um esforço diplomático que tem sido dificultado por partes determinadas a bloquear qualquer progresso, a menos que seja nos próprios termos. Isso não é apenas frustrante, mas ajuda a agravar a crise humanitária.

Os milhões de pessoas deslocadas pelos combates brutais estão sobrecarregando os serviços públicos e, por ruim que seja essa situação, foi encoberta por crises em outros países, sobretudo em Gaza e na Ucrânia. A ONU reclama que só recebeu cerca de um terço dos fundos necessários pra atender às necessidades em Mianmar. As sanções ocidentais à junta também prejudicam a capacidade do governo de cuidar dos refugiados internos.

Por mais preocupante que seja a situação, a perspectiva de Mianmar se tornar um verdadeiro Estado falido é ainda mais alarmante. O colapso poderia instigar à intervenção não só da China, mas também da Índia, que divide uma fronteira de 1 643 km com Mianmar. O governo de Délhi não cederia à influência de Pequim num país que considera essencial pra seu futuro económico.

O processo de paz precisa ser revigorado. O reconhecimento do GUN é um primeiro passo crucial. A ASEAN também precisa ajudar a convencer a junta de que ela não pode seguir no poder e que a democracia precisa ser restaurada; o país e a própria credibilidade da organização o exigem.

Não se pode permitir que Mianmar, um país central no Sudeste Asiático em termos de tamanho, localização e importância geopolítica, entre em colapso.

O Conselho Editorial do Japan Times



A tomada do poder em 2021 pelo comandante do exército, general Min Aung Hlaing, levou milhares de manifestantes pró-democracia às ruas das cidades de Mianmar. (Associated Press)


Os militares de Mianmar estão perdendo terreno contra ataques coordenados, nutrindo as esperanças da oposição

Um analista disse que a ofensiva foi “de longe o momento mais difícil” que os líderes militares do país do Sudeste Asiático enfrentaram desde que tomaram o poder por meio de um golpe de Estado, há quase três anos.

BANCOQUE – Cerca de duas semanas após o início de uma grande ofensiva contra o governo militar de Mianmar, lançada por uma aliança de três milícias bem armadas de minorias étnicas, um capitão do exército, lutando numa área de selva perto da fronteira nordeste com a China, lamentou nunca ter visto uma operação tão intensa.

Seu comandante na 99.ª Divisão de Infantaria Leve de Mianmar foi morto em combates no estado de Shan na semana anterior, e o soldado de carreira de 35 anos disse que os postos avançados do Exército estavam desordenados e sendo atingidos por todos os lados.

“Nunca enfrentei esse tipo de batalhas antes”, disse o veterano combatente à Associated Press por telefone. “Esses combates em Shan são inéditos.” Oito dias depois, o próprio capitão morreu defendendo um posto avançado e foi enterrado às pressas perto de onde caiu, segundo sua família.

A ofensiva coordenada no nordeste inspirou forças de resistência a atacarem no país todo, e os militares de Mianmar estão recuando em quase todas as frentes. O exército diz que está se reagrupando e que vai recuperar a iniciativa, mas aumenta a esperança entre os opositores de que este poderia ser um ponto de virada na luta pra expulsar os líderes do exército que depuseram, há quase três anos, a presidente democraticamente eleita Aung San Suu Kyi.

“A atual operação é uma grande chance pra mudar a situação política em Mianmar”, disse Li Kyar Win, porta-voz do Exército da Aliança Democrática Nacional de Mianmar (EADNM), uma das três milícias conhecidas juntas como Aliança das Três Irmandades, a qual lançou a ofensiva em 27 de outubro.

“O objetivo e o propósito dos grupos da aliança e de outras forças de resistência são os mesmos”, disse ele à AP. “Estamos tentando eliminar a ditadura militar.”

Pegos de surpresa pelo ataque denominado Operação 1027, os militares perderam mais de 180 postos avançados e pontos fortes, incluindo quatro bases principais e quatro passagens de fronteira economicamente importantes com a China.

Ambos os lados afirmam ter infligido pesadas perdas ao oponente, embora não estejam disponíveis números precisos de vítimas. Cerca de 335 mil civis foram deslocados durante os atuais combates, elevando o total pra mais de 2 milhões de refugiados em todo o país, segundo a ONU.

“Este é o maior desafio no campo de batalha que os militares de Mianmar enfrentaram em décadas”, disse Richard Horsey, especialista sobre Mianmar do Grupo Internacional de Crise.

“E pro regime, este é de longe o momento mais difícil já enfrentado desde os primeiros dias do golpe.”

Complicando as coisas pros militares, a China parece apoiar tacitamente a Aliança das Três Irmandades, como resultado, ao menos em parte, da crescente irritação de Pequim com o aumento no comércio de drogas ao longo de sua fronteira e a proliferação em Mianmar de centros a partir dos quais se realizam golpes digitais, frequentemente por gangues chinesas organizadas com trabalhadores traficados da China ou de outros lugares da região.

À medida que a Operação 1027 ganha terreno, milhares de cidadãos chineses envolvidos em tais operações são repatriados sob custódia policial na China, dando a Pequim poucas razões pra exercer pressão sobre a Irmandade pra que ela pare de lutar.

Os militares, conhecidos como Tatmadaw, seguem sendo muito mais numerosos e bem treinados do que as forças de resistência e possuem blindados, poder aéreo e até meios navais pra combater as fracamente armadas milícias organizadas por vários grupos étnicos minoritários.

Mas com as perdas inesperadamente rápidas e generalizadas e com as forças sobrecarregadas, o moral está afundando e mais tropas estão se rendendo e desertando, dando origem a um otimismo cauteloso entre seus diversos oponentes.

Os ganhos atuais são apenas parte de uma longa luta, disse Nay Phone Latt, porta-voz do Governo de Unidade Nacional (GUN), a principal organização de oposição.

“Eu diria que a revolução atingiu um novo nível, em vez de dizer que atingiu um ponto de virada”, afirmou.

“O que temos agora são os resultados de nossa preparação, organização e construção ao longo de quase três anos”, concluiu.

A ofensiva – A tomada do poder em 1.º de fevereiro de 2021 pelo comandante do Exército, general Min Aung Hlaing, levou milhares de manifestantes pró-democracia às ruas das cidades de Mianmar.

Os líderes militares responderam com repressões brutais, prenderam mais de 25 mil pessoas e mataram mais de 4 200 até 1.º de dezembro, segundo a Associação de Assistência a Prisioneiros Políticos, e investigadores independentes da ONU no início deste ano acusaram o regime de ser responsável por múltiplos crimes de guerra.

Suas táticas violentas originaram as Forças de Defesa Popular, ou FDP’s, forças de resistência armada que apoiam o GUN, muitas das quais foram treinadas pelas organizações étnicas armadas que os militares têm combatido nas regiões de fronteira do país durante anos.

Mas a resistência estava fragmentada até a Operação 1027, quando três dos grupos étnicos armados mais poderosos do país (o Exército da Aliança Democrática Nacional de Mianmar e o Exército de Libertação Nacional Ta’ang no estado de Shan, a nordeste, e o Exército Arakan no estado de Rakhine, a oeste) reuniram uma força de cerca de 10 mil combatentes, segundo estimativas de especialistas, e rapidamente invadiram posições militares.

Percebendo a fraqueza e inspirado pelos primeiros sucessos desses ataques, o Exército de Independência de Kachin lançou na sequência novos ataques no estado de Kachin, a norte, e depois se juntou ao Exército Arakan pra ajudar a liderar um grupo FDP na tomada de uma cidade em Sagaing, no centro do país, coração do tradicional apoio étnico bamar ao Tatmadaw.

No estado oriental de Kayah, também conhecido como Karenni, uma aliança de organizações étnicas armadas lançou seus próprios ataques, iniciando uma ofensiva direta em 11 de novembro à capital do estado de Loikaw, onde o Tatmadaw tem uma base de comando regional.

Nos ferozes combates por Loikaw em curso, os militares estão usando artilharia e bombardeios pra atacar as posições das milícias.

Mas Khun Bedu, chefe da Força de Defesa das Nacionalidades de Karenni, uma das maiores milícias envolvidas no ataque, disse que era fundamental tomar a base do Tatmadaw.

“Temos tempo e é uma boa oportunidade”, disse à AP.

Completando o cerco às forças do Tatmadaw, o Exército Arakan atacou postos avançados em seu estado natal de Rakhine, no oeste do país, em 13 de novembro. Seu sucesso tem sido lento, com o Tatmadaw empregando o poder naval na costa ocidental pra bombardear posições, junto com artilharia concentrada e ataques aéreos, de acordo com um relatório do Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS).

Morgan Michaels, que assinou o relatório e dirige o projeto Myanmar Conflict Map do IISS, advertiu que o Tatmadaw tem sido capaz de concentrar forças em pontos fortes, abandonando posições e se retirando, e continua sendo uma força formidável.

“Os combates ainda não acabaram e os ataques por ar e terra estão aumentando e se intensificando”, disse. “Portanto, temos que ver quais são os desdobramentos.”

E apesar de falarem em livrar o país do regime militar, muitos dos combates também concernem aos vários grupos que tomam o controle do território, especialmente o EADNM, que foi expulso da região de Kokang no estado de Shan, incluindo a capital Laukkaing, há mais de uma década pelos militares.

“Os militares provavelmente poderiam encerrar grande parte disso com um acordo, se necessário”, disse Michaels. “Teria de renunciar a algo considerável, mas penso que poderia estancar a hemorragia dando uma concessão considerável ao EADNM, se fosse absolutamente necessário.”

Contudo, ao contrário da guerra civil na Síria, onde vários grupos têm objetivos diferentes e muitas vezes contraditórios, em Mianmar os grupos antimilitares não estão lutando entre si, disse ele.

“É importante enfatizar que muitos grupos têm o objetivo comum de derrubar, desmantelar ou esgotar severamente a capacidade do regime militar”, disse Michaels.

Era 15 de novembro quando a AP contatou pela primeira vez o capitão do Tatmadaw, o alcançando enquanto ele fugia de uma posição pela selva perto da cidade fronteiriça de Monekoe, um dos principais alvos da aliança.

Ele conseguiu se conectar com outros e depois liderou uma coluna de volta à região de Monekoe pra assumir o comando de um posto avançado em 22 de novembro, quando deu à AP uma avaliação sombria de sua situação.

“Estamos cercados por inimigos”, disse ele, acrescentando que mesmo as milícias locais leais ao Exército não eram confiáveis.

“Aqui é difícil distinguir quem é inimigo ou amigo”, disse.

O capitão, que falou sob condição de anonimato por medo de represálias contra ele ou sua família por falar com a mídia, disse que não havia tempo nem pra refeições.

“Temos que estar sempre prontos em posição de ataque”, disse, enquanto o som de tiros e uma explosão irrompiam ao fundo.

“Não posso continuar falando”, disse rapidamente. “Eles estão vindo atacar.”

O papel da China – Bem ciente da irritação de Pequim com a atividade criminosa ao longo de sua fronteira, a Aliança das Três Irmandades sublinhou, ao lançar sua ofensiva, que estava empenhada em “combater a fraude generalizada dos jogos online que tem atormentado Mianmar”.

O general Min Aung Hlaing tenta, sem sucesso, dar um fim em tudo isso e diz que a ofensiva está sendo financiada pelo tráfico de drogas.

À medida que as forças da milícia avançam em direção à cidade de Laukkaing, onde muitos dos centros de golpes estavam localizados, suas operações se dispersam e muitos suspeitos de alto nível são capturados e entregues à China.

Sabendo dos laços históricos da China com as milícias da Irmandade e da influência que ela exerce, os apoiadores dos generais que governam Mianmar realizaram várias manifestações nas principais cidades, incluindo em frente à Embaixada da China em Yangon, acusando o país de ajudar a aliança de milícias.

Wang Wenbin, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, evitou esta semana uma pergunta sobre tais alegações, dizendo aos repórteres que Pequim “respeita a soberania e a integridade territorial de Mianmar” e reiterando os apelos à paz.

Mas as ações de Pequim falam mais alto do que as suas palavras, disse Horsey.

“Se eles realmente desejassem o cessar-fogo, eles estariam em posição de o aplicar ou de avançar bastante pra o aplicar”, disse ele. “Eles não o fizeram, então isso é revelador.”

A morte do capitão – O último contato da AP com o capitão que lutava no estado de Shan foi em 23 de novembro. A chamada foi curta.

“Tenho algo pra preparar pra nosso posto avançado”, disse apressado. “Vou te ligar de volta.”

A ligação seguinte foi de um parente, em 25 de novembro, que disse ter sido informado de que ele foi morto num ataque noturno contra seu posto avançado e enterrado no local.

Não ficou claro onde exatamente se localizava o posto avançado, mas naquela noite só uma batalha foi relatada na região.

O Exército de Libertação Nacional Ta’ang, membro da Irmandade, disse que suas forças atacaram um grande posto militar avançado no município de Lashio em 23 de novembro e o tomaram na manhã seguinte.

Em seu relato fatual, as forças Ta’ang disseram ter tomado um obus, 78 armas menores e munições, e encontrado as sepulturas de “mais de 50 inimigos”.



sábado, 2 de dezembro de 2023

Nojeiras políticas do sábado!


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O primeiro meme, por cujo envio qual agradeço um amigo, dispensa explicações. O segundo, pelo qual agradeço outro amigo, tem a ver com a perseguição às comunidades de gênero na Rússia e ao envio em massa da população ativa masculina pra morrer de carne de canhão numa guerra inútil. A tradução vai terminar a explicação: 1) dois papais [homens, claro]; 2) nenhum papai. Homofobia e belicismo: a facho-esquerda duginista bananeira pira!

Agora, como alívio cômico, nesta edição do programa francês C dans l’air dedicada a como manifestantes em vários países muçulmanos estavam protestando contra a França após o 7 de Outubro em Israel e como as tensões intercomunitárias podiam respingar em Paris, um dos especialistas convidados (aqui abreviado) explica o medo que o presidente do Egito tem de abrir completamente a fronteira com a Faixa de Gaza e sofrer um afluxo de refugiados. Porém, parece que o apresentador Axel de Tarlé teve um problema pra pronunciar o nome do ditador, que em português acabou soando algo bem dúbio... Segue apenas a tradução sem transcrição:


Basbous – O Hamas é a ramificação palestina da Irmandade Muçulmana, e esta é a inimiga do regime no Egito. Abrir o caminho entre Gaza e o Sinai significa transportar o êxodo dos palestinos armados do Hamas e pôr o regime em dificuldades. Então...

Tarlé – Al-Xixi teme o Hamas, é isso?

Basbous – Obviamente!


Infelizmente, a curta trégua com troca de reféns e prisioneiros entre Hamas e Israel “flopou”, e eles já começaram a se bombardear mutuamente. Um dos representantes palestinos guardadinhos no Catar deu a seguinte declaração à GloboNews sobre como serão as próximas estratégias do grupo.


Nesta entrevista a um dos principais canais de TV públicos da França dada em 23 de agosto de 2023, o ex-presidente direitista Nicolas Sarkozy reconhece admirar Lula. Corrupto, grosseiro, pouco culto, policialesco, um dos piores governantes que o país já teve (não conseguiu se reeleger em 2012) e amigo de ditadores, em especial do líbio Gaddafi – de quem se suspeita ter financiado ilegalmente a primeira campanha do francês em 2007 –, vejam como o advogado admira o ex-metalúrgico. Com um fã-clube desses, eu preferia viver numa caverna, rs... Tradução sem transcrição:

“Sarkolula” – A política foi minha vida. Estaria mentindo se lhe dissesse que ela não me interessava mais. Aliás, esta é a prova: estamos falando a respeito. Sou apaixonado, interessado, às vezes fico exasperado ou entusiasmado...

Gilles Bouleau – Em seu livro o sr. expressa sua admiração por Lula, homem de esquerda no Brasil, e diz que ele é inoxidável e superou tantas provações, deixou o poder, foi condenado e preso, ele voltou e foi reeleito presidente...

“Sarkolula” – Ele teve um câncer na garganta que o privou... [da voz?]

Gilles Bouleau – Essa trajetória o inspira ou não? O sr. diz que o que ele fez, o sr. também está fazendo.

“Sarkolula” – Admiro e gosto do Lula, mas... eu jamais romperia com a França. E a política sempre vai me interessar. Mas não voltaria a responsabilidades ativas ou operacionais, porque meu tempo passou, e como dizia um grande autor [Jean Jaurès, outro político de esquerda], “O rio é fiel a sua fonte correndo para o mar.”


E não poderia deixar de terminar esta coletânea de hoje com um serviço de saúde pública:


sexta-feira, 1 de dezembro de 2023

Putin pacifista no mundo paralelo


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Ilustração tirada a partir de um print da TV Rain.


O ditador genocida Vladimir Putin fez por videoconferência uma aparição pra ler o discurso de abertura da sessão plenária do 25.º Concílio Popular Russo Mundial, ocorrida em Moscou no último 28 de outubro, mas com o político bunkerizado em Sochi, obviamente, já que nem o KPta quer sua companhia. Com a presença e presidência do padre de festa junina patriarca Cirilo da Igreja Ortodoxa Russa, que durante a Era Putin não só se tornou um braço espiritual do Estado terrorista como também tem legitimado a invasão criminosa da Ucrânia, o concílio completou 30 anos de existência, com seu objetivo de discutir o presente e o futuro da Rússia. Como uma organização e fórum públicos internacionais, conta com a participação de membros do governo, líderes de entidades públicas, membros do clero das principais religiões da Rússia, figuras destacadas da ciência e da cultura e delegados de comunidades russas do exterior.

Em meio a seus delírios de Rússia como “civilização à parte” (na verdade, em outro planeta ou mesmo galáxia), Putin parece fazer uma descrição de si mesmo acusando o “Ossidente Malvadaum” de atacá-lo militarmente e adotar “o racismo e o neonazismo” como ideologias oficiais. Claro que ele não diz que os “povos multinacionais” são os primeiros a servirem de carne de canhão em suas pretensões expansionistas, então fique apenas com esta montagem que inclui trechos do documentário Vergüenza y respeto sobre os roma (ciganos) argentinos, mas igualmente uma fonte infinita de memes. Logo abaixo, apenas minha tradução do trecho, sem transcrição em russo (a tela com o novo santo no meio dos ícones é uma piada à parte):


Estamos lutando pela liberdade não apenas da Rússia, mas do mundo inteiro. É nosso país que se encontra agora na vanguarda da formação de uma ordem mundial mais justa. Praticamente, a ideologia oficial das elites ocidentais se tornou hoje a russofobia e outras formas de racismo e de neonazismo. Elas se voltam não somente contra os russos, mas também contra todos os povos da Rússia. Em princípio, o Ocidente não precisa de um país tão grande e multinacional como a Rússia. Nossa diversidade e unidade de culturas, tradições, línguas e etnias simplesmente não se encaixa na lógica dos racistas e colonizadores ocidentais.


Ilomasque respondeu o ditador à altura:


quarta-feira, 29 de novembro de 2023

Bandeira do Quirguistão vai mudar


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Sadyr Zhaparov, presidente do Quirguistão – sabe onde fica? Não confunda com o Cazaquistão... –, parece não ver outros problemas mais urgentes pra resolver em seu país, e num arroubo bem boratiano típico de antiga república soviética centro-asiática, resolveu implicar com a bandeira nacional. Ele inventou que o “Sol” localizado no meio da flâmula parecia mais um girassol, que segundo suas palavras, na cultura quirguiz simboliza a servilidade e a inconstância...

Sim, pessoas. Com pretextos bem melhores, alguém poderia querer trocar a bandeira da Banânia, dizendo que tanto as cores quanto a forma foram herdadas do período imperial. Contudo, ninguém ousaria, pois ambos os aspectos se tornaram tal marca visual no exterior que começar do zero traria prejuízos incalculáveis. Mesmo assim, a proposta passou no Parlamento, com as devidas correções, e o que vocês veem acima é a nova versão aprovada. Abaixo, é o desenho usado desde 1992, pouco depois da independência:


Pra ter uma noção do inútil, veja o seguinte esquema, com a descrição em russo: 1) bandeira atual; 2) variante proposta pelos deputados; 3) variante elaborada com a participação do presidente; 4) variante mandada ao Parlamento.


terça-feira, 21 de novembro de 2023

Milei vai tirar a Argentina dos BRICS


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Nova tradução exclusiva de um artigo do site da Rádio França Internacional (RFI), que também tem versões em português europeu e brasileiro, mas não sei se deste texto. No original francês, ele se chama Après la victoire de Javier Milei à l’élection présidentielle, l’Argentine ne rejoindra plus les Brics (Após a vitória de Javier Milei na eleição presidencial, a Argentina não vai mais se juntar aos BRICS), publicada hoje e de autoria de Stéphane Lagarde, correspondente da RFI em Pequim. A foto de Milei também foi incorporada diretamente do site, e como a tradução e as notas entre colchetes são minhas, sou o único responsável por eventuais falhas:



Atualizações maldosas, rs (Mondino é cotada pra ministra do Exterior):




Buenos Aires não vai dar continuidade a sua adesão aos BRICS, segundo informou a nova equipe no poder na Argentina [na verdade, a posse é só em 10 de dezembro]. Uma adesão prevista pra janeiro de 2024 e encorajada pela China. O que a vitória do anarcocapitalista argentino Javier Milei vai mudar pra Pequim?

Com a mudança de equipe na Argentina, as autoridades chinesas passaram do embaixador argentino retomando um canto da propaganda maoista, diante do presidente chinês, ao som da motosserra, a arma favorita de Javier Milei durante a campanha presidencial, que aqui [em Pequim] também se encontra nas hashtags.

“Acordos secretos” – Pequim colocava a administração anterior em Buenos Aires entre os amigos da China, mas com a nova, será mais complicado. O presidente de extrema-direita prometeu examinar os “acordos secretos” firmados com um país que ele qualificou de “assassino”. Ele também denunciou o projeto da adesão aos BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) apoiada por Pequim. Isso não impediu as autoridades chinesas de parabenizarem Javier Milei por sua vitória. Os analistas apostam no pragmatismo bem assimilado pela nova equipe no poder em Buenos Aires pra estabilizar a relação com Pequim, bem como na dependência financeira da Argentina de seu segundo parceiro comercial depois do Brasil.

Nove contratos de empréstimos A Argentina, que se juntou à Belt and Road Initiative – as “novas rotas da seda” chinesas – após os Jogos Olímpicos de Inverno em Pequim no ano passado, concluiu nove contratos de empréstimos de mais de 8 bilhões de dólares com a China pros próximos 15 anos. Ora, a economia argentina, em queda livre, precisa urgentemente de divisas. Portanto, os laços com a China não deveriam mudar, mesmo se o presidente eleito prometeu dolarizar a Argentina, outra ruptura com seu antecessor. Em abril passado, o ministro da Economia Sergio Massa tinha anunciado o abandono do dólar nas transações com a China, seguindo os passos do vizinho brasileiro.



Achou que a cobrinha ancap tinha sumido? Errou!!!

sábado, 18 de novembro de 2023

Fã morre em show de Taylor Swift


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Entrando hoje no X, soube que esta moça do Mato Grosso, chamada Ana Benevides, de apenas 23 anos, foi com algumas amigas no show de Taylor Swift no estádio do “Engenhão”, na cidade do Rio de Janeiro, tendo voado de avião pela primeira vez na vida. Porém, com o calor incomum que fazia (como faz em boa parte do Centro-Sul, sem contar a seca na Amazônia), vários fãs passaram mal, e ela mesma desmaiou logo após a segunda canção da cantora, ironicamente chamada Cruel Summer... Levada com urgência ao hospital, acabou morrendo após uma parada cardiorrespiratória, mas a causa do óbito ainda está pra ser oficializada. A própria Taylor viu que as pessoas tinham sede e pediam água, e chegou a dar garrafas e pedir mais às equipes, bem no meio das músicas!

Muito podem julgar os “swifties” (assim como outras “-etes”, “lovers” e “minions” da vida) pelo sacrifício de pagar um dinheirão, ficar numa longa fila e se espremer no meio de uma multidão delirante. Mas pra além disso, pelas indicações dadas por várias testemunhas e outros fãs que também tiveram problemas ontem, parece que houve igualmente uma negligência gigante e uma péssima organização por parte da T4F (“Time for Fun”, outro nome irônico), empresa brasileira encarregada da estrutura. Sou a última pessoa a ir em tais eventos, mas não tenho direito de criticar o que cada um faz de sua vida. E se existe demanda, a oferta tem que corresponder às expectativas... Nos principais sites de notícias, já há volumosos relatos, mas decidi colocar aqui tudo o que fui achando pelo X nesta manhã. Como vemos pela foto acima, realmente conhecer Taylor era o sonho da vida da Ana.


Esta foi a “carta” que a própria Taylor publicou nos stories de seu Instagram após saber da morte da moça, que a arrasou demais. Apesar da ilusão que o modelo de “letra de mão anglo-saxã” possa causar, não é preciso ser grafologista pra ver que se trata de uma fonte de computador, pois não há nenhuma variação entre letras iguais. Eis minha própria tradução imperfeita:

Não consigo acreditar que estou escrevendo essas palavras, mas é com o coração despedaçado que informo que perdemos uma fã no começo da noite, antes [?] de meu show. Não consigo nem lhes dizer como isso me deixou devastada. As escassas informações de que disponho são que ela era incrivelmente lindíssima e muitíssimo jovem.

Não vou conseguir falar sobre isso no palco, porque me sinto dominada pela dor assim que tento falar a respeito. Quero dizer agora que sinto profundamente essa perda e que meu coração partido está com a família e amigos dela. Essa é a última coisa que eu sequer pensaria acontecer quando decidimos trazer essa turnê ao Brasil.


Essa foi a desculpa, ou melhor, a nota de pesar oficial da Time for Fuck T4F, querendo tirar o próprio da reta. Porém, a verificar a veracidade das informações do “Tribunal do Twitter”, nada como os próprios presentes pra trazerem mais alguns “detalhes sórdidos” que sequer a mídia hegemônica ousou replicar. Se for comprovado o tratamento com clonazepam (nome genérico do Rivotril!), sob o pretexto de que estariam com “ansiedade” ou, em última instância, “histéricas”, deprimindo ainda mais o sistema nervoso e fazendo a pressão despencar, portanto multiplicando os efeitos do calor, poderemos ter um escândalo médico-jurídico...







Achei por acaso esta conta de um clube de fãs da banda Coldplay, cuja nota também achei interessante e resolvi aproveitar pra treinar meu “inglês”, rs (original certamente cheio de erros). Leiamos:

Alguns de nossos seguidores já sabem, mas além de fãs do Coldplay, também somos de Taylor Swift. Ontem ela fez sua primeira apresentação pública aberta aqui no Brasil, e o que era pra ser um sonho realizado se tornou pra nós, fãs, um pesadelo.

Nosso país está atualmente enfrentando uma enorme onda de calor, e os organizadores do evento (TF4) foram completamente negligentes pra com o público. Eles não deixaram as pessoas entrarem com garrafas d’água, que eram caras pra comprar dentro da arena, parte da ventilação estava coberta pra impedir as pessoas de verem o show de fora, e isso é apenas parte do que conseguimos lembrar agora.

Nós, fãs, temos de pagar por taxas de serviço e recebemos um “apoio” tão negligente que, por resultado, mais de mil pessoas tiveram de ser atendidas por médicos e bombeiros. Uma moça, Ana Benevides, infelizmente faleceu de ataque cardíaco, condição que só um calor extremo pode provocar.

Se a TF4 tivesse fornecido um serviço decente, não estaríamos enfrentando agora mesmo essa situação. Exigimos respeito, exigimos justiça, não somente por uma companheira swiftie, mas por todos os fãs de música ao vivo aqui no Brasil. Nossas vidas valem mais do que o lucro. Por favor, assinem a petição abaixo. Obrigado.

(Trata-se de uma petição lançada por uma fã no serviço Change.org, que estava quase atingindo a meta quando publiquei este texto, exigindo uma lei pela qual o Congresso Nacional obrigue as organizações a fornecerem água gratuitamente em situações semelhantes. Imagino que a “bancada do Estado nulo” vai chorar muito os prejuízos que os pobres empreendedores poderiam sofrer com tal coerção, buááá...)


E infelizmente, como em toda parte no mundo, tais situações empoderam o lado venenoso das pessoas pra elas verbalizarem publicamente seus piores instintos. Um desrespeito não só com a Ana, mas também com os fãs que pagaram e com a própria artista. Um dos perfis se autoproclama “ninho adorador”, imagine o “cretianismo” que ele professa! Peço perdão por não ter tido tempo de censurar nem os palavrões, nem os nomes, inclusive nos tuítes acima...


sexta-feira, 17 de novembro de 2023

Jogo do bicho segundo rádio francesa


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/jogodobicho

Foi publicado ontem um artigo no site da Rádio França Internacional (RFI), que é a transcrição de parte de um podcast sobre tecnologia e informática. A autoria é de Sarah Cozzolino, correspondente do veículo na cidade do Rio de Janeiro, e se chama « Jogo do bicho » : un jeu de hasard illégal en plein essor au Brésil (“Jogo do bicho”: um jogo de azar ilegal em plena ascensão no Brasil); ela se esqueceu de dizer que, exceto as loterias, todos os jogos de azar são ilegais no país... Como se trata da Banânia, resolvi traduzir e republicar aqui, fazendo algumas adaptações e, quando necessário, notas explicativas ou opinativas entre colchetes. Espero que aproveite o texto!


O jogo do bicho (“jogo do animal”, pela tradução literal francesa) é um jogo de azar ilegal que está avançando pelas redes sociais no Brasil. As apostas são feitas pelo Instagram, pelo Facebook e pelo YouTube. Do que se trata e como tudo isso funciona? A correspondente no Rio de Janeiro explica.

Verdadeira instituição brasileira, uma espécie de patrimônio imaterial ilegal existente há mais de 125 anos no país, o jogo que se assemelha à tômbola consiste em apostar em animais associados a números. No jogo do bicho, cada um dos 25 animais corresponde a quatro números: do avestruz (1 a 4) à vaca (97 a 100), pode-se apostar qualquer quantia, o que torna esse jogo muito acessível. E ao contrário de um bingo, os sorteios ocorrem todos os dias, ou mesmo várias vezes por dia.

Segundo um estudo de 2014, esse tipo de loteria clandestina permitiu a arrecadação de até 3 bilhões de reais, ou seja, 568 milhões de euros.

Quais são as ligações que esse jogo de azar entretém com o crime organizado? – O jogo do bicho, se não é autorizado, é ao menos “tolerado”... Oficialmente, as penas vão de quatro meses a um ano de prisão simples, mas raramente elas são aplicadas.

Os “bicheiros”, que gerem as “bancas” do jogo, encabeçam uma verdadeira máfia, um comércio ilegal ligado a certas personalidades políticas, à polícia e também às milícias, especialmente no Rio de Janeiro.

Corrupção, lavagem de dinheiro... Os bicheiros geralmente são intocáveis graças a suas ligações estreitas com certos políticos municipais. Desde a década de 1930, o jogo do bicho é inclusive uma das fontes de financiamento das escolas de samba, que precisam levantar quantias enormes de dinheiro pra organizar seus desfiles, e entretêm fortes conexões com a máfia dos jogos ilegais.

Ao se desenvolver nas redes sociais, o jogo se torna incontrolável? – Tradicionalmente, os bicheiros são bastante identificáveis: sentados numa cadeira, numa esquina de rua movimentada, com uma calculadora na mão e uma maquininha de cartão na outra. Quando a polícia passa, a cadeira continua na rua vazia, mas quando o jogo atinge o pico, multidões se aglomeram.

Hoje, encontram-se anúncios pagos pro jogo do bicho no Facebook e no Instagram, prometendo ganhar facilmente quantias que batem os mil euros [o euro fechou a R$ 5,28 em 16/11]. Uma simples pesquisa no Google permite o acesso a sorteios de resultados ao vivo pelo YouTube, perfis ou grupos comerciais no WhatsApp... As apostas podem ser feitas com muita rapidez, via transferências bancárias gratuitas [acho que ela se refere ao pix]. Mas os golpes também são frequentes.

A empresa Meta, dona do WhatsApp e do Instagram, não quis se pronunciar sobre o assunto [por que $$$erá, né???], mas os promotores do jogo parecem se aproveitar de um vácuo jurídico. É que as plataformas de anúncios são registradas onde os jogos de azar são legais, sobretudo em Curaçao.


Com esse patrimônio da humanidade, eu queria encerrar a parte propriamente da tradução, rs. Se você ainda duvida de que a simples pesquisa no Google vai revelar a proliferação descarada do Bicho 2.0, veja estes resultados que obtive, simplesmente ao tentar confirmar a tradução de uma palavra: