sábado, 25 de junho de 2022

Turquia só quer ser chamada “Türkiye”


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Este artigo muito interessante em francês foi publicado no site da Rádio França Internacional em 21 de junho de 2022. Seu título traduzido é A partir de agora, a Turquia se faz chamar “Türkiye”: Ankara deseja impor internacionalmente a denominação “Türkiye”, e a autora é a jornalista Anne Andlauer, correspondente da RFI em Istambul. Recentemente, o presidente turco Erdoğan impôs o uso do nome nativo da Turquia (“Türkiye”) nas organizações internacionais, alegando diversos motivos culturais e nacionalistas bastante estranhos. A verdade é que ele não quer mais ver a difusão do nome inglês “Turkey”, que na mesma língua também significa “peru”, a ave que comemos no Natal, embora essa seja uma particularidade anglófona. Forças políticas na Turquia querem ver a iniciativa expandida pra outras línguas e outros domínios, sobretudo o jornalismo, embora na vida dos próprios perus turcos (que sofrem com crise econômica e autoritarismo) isso não tenha influência alguma.

Eu mesmo traduzi o texto diretamente do francês, e todos os erros e imprecisões são de minha responsabilidade. O grande problema é que várias expressões idiomáticas e trocadilhos que só fazem sentido em francês nem sempre puderam ser traduzidos literalmente, ou a aproximação não foi suficiente. Por exemplo, no primeiro subtítulo, diz-se que o nome “Turkey” seria muito “basse-cour”, que designa comumente o espaço numa casa ou sítio onde são criados animais domésticos, como galinhas, cabras e coelhos. Mas a tradução literal dos elementos também daria “baixa corte”, ou seja, algo não nobre, ou plebeu. Deixei como “galinheiro”, que traz livres conotações em português. Perto do fim do texto, a expressão “peruada”, às vezes significando “palpite, galanteio, sondagem, passeio, dar uma volta”, substitui “histoire de dindes”, literalmente “história de perus”, mas significando “conto de Natal”.

Como o tema é bem interessante, dediquei uma segunda parte de minha própria autoria a uma breve explicação sobre por que essa ave tem tantos nomes, sem ser exaustivo. Embora por razões diversas, podemos lembrar também casos recentes de países que mudaram de nome e desejaram ser chamados de outra maneira em outras línguas, como a Suazilândia, que se tornou Essuatíni, a Birmânia, que se tornou Mianmar, e a Bielorrússia, que se tornou Belarus. E no final, um gráfico muito interessante e didático que achei na internet.


A Turquia mudou oficialmente de nome na arena internacional. Não se diz mais Turkey em inglês, Turquie em francês ou Türkei em alemão, mas “Türkiye” em turco e em todas as línguas.

As Nações Unidas (ONU) registraram oficialmente essa mudança no início do mês, a pedido das autoridades turcas e na sequência de uma circular presidencial assinada em dezembro passado. Nela, Recep Tayyip Erdoğan justificava essa decisão explicando que a denominação “Türkiye representa e expressa da melhor forma a cultura, a civilização e os valores da nação turca”. Assim, pede-se a todas as instituições internacionais (OTAN, União Europeia etc.) e todos os representantes estrangeiros que utilizem “Türkiye” e nada mais em seus documentos oficiais, suas declarações públicas, suas publicações nas redes sociais... Os jornalistas também são estimulados a habituar-se à novidade.

Um nome considerado muito “galinheiro” – Mesmo se ninguém no governo turco diz abertamente, era a tradução em inglês do nome do país, Turkey, que trazia problemas. Sem inicial maiúscula, a palavra também significa “peru”, isto é, a ave, o galináceo cuja imagem aparece na tela quando você digita “turkey” numa página de busca. Ao que parece, a conotação não agradava às autoridades, que então quiseram modificar o que é de alguma forma a “marca”, a “imagem de marca” do país na arena internacional.

A ideia não é nova: desde os primeiros anos da República, fundada em 1923 sobre os escombros do Império Otomano, alguns já haviam lamentado a associação, no espírito dos falantes de inglês, entre o jovem Estado e a ave de galinheiro. Na década de 1990, certas empresas tinham optado por exportar seus produtos sob a denominação Made in Türkiye. A partir de agora, todas elas devem fazê-lo.

Na prática, a mudança não é tão simples. Nas versões em línguas estrangeiras dos sites oficiais do governo e da administração turcos, bem como de suas embaixadas no exterior, todas as novas publicações estão usando o termo Türkiye. Mas nos artigos mais antigos, ainda se encontram Turkey, Turquie, Turquia para todos os gostos.

Da parte das autoridades estrangeiras, percebe-se um esforço, sobretudo nas conferências de imprensa com seus homólogos turcos, para empregar o termo apropriado. Mas a memória costuma traí-los quando o discurso se torna mais improvisado. Quanto às embaixadas e aos consulados daqui, nada mudou em seus sites oficiais. Estados Unidos, Alemanha, França, Rússia... Por enquanto, cada país continua com sua tradução de Türkiye.

Afagar o nacionalismo turco – Esse novo nome dado à nova Turquia não desperta um interesse excepcional entre os turcos, para quem seu país se chama Türkiye de qualquer jeito. Por outro lado, nas redes sociais, é interessante observar quem continua usando uma tradução em suas publicações em outras línguas, e quem adotou prontamente o Türkiye, num gesto de zelo nacionalista. Isso porque, obviamente, Erdoğan não está meramente fazendo uma peruada com essa decisão: ele mesmo constantemente se ocupa em insuflar o fervor nacionalista. Essa mudança de nome na arena internacional, muitas vezes comentada pelo atual presidente, alimenta esse discurso a um ano das eleições e do centenário da República da Turquia... ops, quer dizer, da República da Türkiye.


A ave que chamamos peru e que recebeu a designação científica de Meleagris gallopavo recebeu o nome inglês de turkey por causa de uma confusão linguística e histórica. Ela começou a ser importada de Madagascar em 1540 por mercadores que chegaram à Europa após um desvio pela Turquia. Quando ficou conhecido na Inglaterra, entendeu-se que o peru tinha vindo da Turquia, portanto recebeu o nome turkey. Nota: embora na época o Império Otomano não se chamasse Turquia, a etnia já tinha esse nome.

Em turco mesmo, a bela ave se chama hindi, porque teria vindo da Índia; mesmo em francês, no século 16, Rabelais falava de poulle d’Inde (galinha da Índia, daí o dinde atual). O próprio hindi emprestou seu piiruu do português, embora outros digam que seja do persa pil morgh (galinha-elefante, por ser o maior dos galináceos). Em alguns países árabes, como o Líbano, peru se diz diik habash (galo da Abissínia, isto é, da Etiópia); no Egito, diik ruumi (galo romano), e na Grécia, galopoúla (galinha gaulesa).

Porém, o grande problema é que no início da Idade Moderna, muitos confundiam o Meleagris gallopavo com a Numida meleagris, nossa galinha-d’angola (guineafowl em inglês), esta sim vinda da África. O peru-selvagem (do qual descende o peru-domesticado), na verdade, veio da América do Norte, sobretudo dos EUA atuais, continente que inicialmente foi confundido pelos navegadores com as procuradas Índias. No fim das contas, os primeiros portugueses que conheceram o peru foram os que mais se aproximaram, pois achavam que ele vinha da região do atual Peru.

Este conteúdo vem de um artigo escrito por Laura Lavenne, mais pesquisa minha na Wikipédia e no Wikcionário. Segundo outro artigo, escrito por J. M. Moreau, outra hipótese é que o nome inglês turkey tenha vindo do som emitido pelo peru, que aos ouvidos ingleses soava não como “glu, glu, glu”, mas “turk, turk, turk”.



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terça-feira, 21 de junho de 2022

Como desbloquear e ler artigos pagos


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Você já teve vontade de ler um artigo na página eletrônica de algum periódico, mas se deparou com aquele irritante bloqueio que afirmava ser “conteúdo exclusivo para assinantes”? Você já foi seco clicando no título de alguma matéria, mas não conseguiu a informação de que tinha vontade? Como diriam as Organizações Tabajara, seus problemas acabaram! Ou pelo menos em parte, a menos que você realmente não queira pagar os velhos jornalões, embora atualmente as assinaturas estejam relativamente baratas.

Na maioria dos casos, você quer apenas ler ou consumir um conteúdo específico, e não desfrutar eternamente das propaladas benesses de assinar os jornais ou mesmo, por exemplo, o portal UOL. Muitas formas de driblar essa restrição já foram publicadas nas redes, e a aparente parada do serviço Outline.com, que desbloqueava textos após postarmos seus endereços, obrigou-nos a procurar por saídas. Num momento crítico pro Brasil e pro mundo, em que a informação deveria ser um bem público e em que a democracia se vê atacada por todos os lados, com as mídias sociais invertendo a função que tinham quando surgiram, as corporações ainda veem os conteúdos mais banais como um meio de encherem os bolsos.

Nada mais justo do que uma pequena gambiarra de vez em quando. Até porque aqueles que dizem se bater pela democracia, na verdade, ajudaram a naturalizar a opressão durante todos esses anos. Outra grande sacanagem é que a Folha, por exemplo, não avisa quando um conteúdo é pago ou não, enquanto o Estadão coloca um cadeadinho ao lado de cada manchete exclusiva. A solução é simples e também funciona nos celulares, mas exige um pouco de atenção por parte do usuário: devemos desautorizar a execução de JavaScript pelo navegador, porque ele é que possibilita o recurso ao fechamento.

O JavaScript é uma tecnologia que facilita e incrementa muito nossa experiência de navegação na internet moderna. Várias falhas que nos irritavam durante o consumo de mídias nos anos 2000 hoje são raramente encontradas quando vemos vídeos, conversamos em plataformas sociais ou consumimos conteúdo interativo. Por isso, não é recomendado que se deixe o recurso desligado o tempo todo, pois pode atrapalhar muito o uso de outros sites mais modernos. Usando o Microsoft Edge como exemplo, que também deve valer pro Google Chrome por ter a mesma tecnologia, é possível adicionar exceções, mas nesse caso não tive sucesso, e quem souber fazer isso, sinta-se à vontade e me informe por e-mail. A questão é que a simples desativação do JavaScript já permite abrirmos qualquer artigo que queiramos xeretar.

Caso você tenha acesso a textos jornalísticos mais antigos, sobretudo das décadas de 1990 e 2000, verá não só como a aparência é muito mais simples, mas também quase sempre conseguirá abrir a página procurada. Isso mostra como o JavaScript veio melhorar a experiência dos internautas, bem como possibilitou mais recursos de controle por parte das redações, infelizmente. Fiz o vídeo abaixo de forma bem despretensiosa, com uma montagem bem tosca, pra ilustrar como é possível fazer o desligamento da autorização pra executar JavaScript. Qualquer sugestão ou crítica, recorra ao WhatsApp citado acima, e se você gostou, baixe também a versão pra celular do pequeno tutorial e espalhe em suas mídias!

Nota (1/10/2022): Descobri que há outro serviço que permite a leitura de artigos pagos, sem comprometer os recursos gráficos, como ocorria com o Outline.com: é o 12ft.io, em que basta adicionar o endereço da página e o chamado firewall é bloqueado. Mas é você quem sabe qual solução prefere usar!



quarta-feira, 1 de junho de 2022

Acorda, Pedrinho (Réveille-toi, Pierrot)


Lien raccourci vers ce billet : fishuk.cc/pedrinho-fr


Ces jours-ci (mai-juin 2022) tout le monde au Brésil connait et chante cette chanson. Elle s’appelle Acorda, Pedrinho (en portugais: Réveille-toi, Pierrot) et est chantée par le groupe pop Jovem Dionísio (à la lettre, “Jeune Dionysos”), qui a lancé le clip complet sur sa chaine YouTube le 7 avril 2022 (la chanson même commence à 2’26”). La chanson est très vite devenue un succès national à cause de ses paroles simples, mais spontanées et populaires, de l’absence de gros mots et thématique sexuelle (trop présents dans les tubes brésiliens) et de sa mélodie tranquille. Beaucoup de Brésiliens se sont identifiés à ce texte, écrit par les cinq jeunes hommes qui forment ce groupe : Gabriel Dunajski Mendes, Gustavo Pimentel Karam, Rafael Dunajski Mendes, Bernardo Crisostomo Pasquali et Bernardo Derviche Hey.

Ces cinq amis habitent à Curitiba et ont crée le groupe en 2019, mais ils se connaissent depuis l’enfance. Les premiers singles réussis sont apparus en 2020, pendant la pandémie, mais seul l’actuel Acorda, Pedrinho a atteint le premier rang parmi les chansons brésiliennes sur Spotify. Ni les auteurs ne savent pas précisément comment ça a été possible, mais peut-être les Brésiliens voient dans les paroles et dans le clip la même ambiance et les mêmes éléments de leur quotidien. La chanson parle d’un des matchs qui se passent dans le bar préféré du groupe à Curitiba. Un de leurs joueurs, le vieux “Pedrinho” (forme diminutive du prénom “Pedro”, c.a.d. Pierre/Pierrot), buvait et dormait à chaque pause entre les parties, mais jouait assez bien tout de même. Les jeunes musiciens trouvaient cette situation marrante et faisaient entre eux-mêmes cette blague: “Réveille-toi, Pierrot, aujourd’hui c’est le tournoi !”

La blague est devenue une amusante chanson, et maintenant tout le monde au Brésil la connait et la chante. C’est pourquoi j’ai décidé de la traduire du portugais (variété brésilienne) vers le français, en tenant en compte que quelques expressions ne peuvent être traduites à la lettre vers d’autres langues. Par exemple, chocolate veut dire “chocolat”, mais dans le milieu sportif au Brésil, le mot est aussi utilisé au sens de “défaite écrasante” ; et le verbe rebolar, littéralement “secouer les fesses” ou “faire/danser le twerk, twerker”, veut dire souvent l’effort pour surmonter une situation complexe. En plus, ils chantent dans un langage très colloquial, avec ses réductions et abrègements. Vous pouvez regarder ci-dessous le clip sous-titré en français et lire les paroles originales et traduites :


Não sei mais pra onde ir
Já que a noite foi...

Acorda, Pedrinho
Que hoje tem campeonato
Vem dançar comigo
Vai ver que eu te esculacho

Sei que não dá pra ver
Mas cê vai ver que hoje não tem chocolate
Nem de segunda a sexta-feira
Não adianta treinar
Cê pode vir, mas vem agora
Não enrola, rebola
Na hora de ir embora, cê chora

Não sei mais pra onde ir
Já que a noite foi longa
Não sei mais pra onde ir
Já que a noite foi longa
Longa, longa

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Je ne sais plus où aller,
Puisque la nuit a été...

Réveille-toi, Pierrot,
Car aujourd’hui c’est le tournoi.
Viens jouer avec moi,
Tu verras comme je t’écrase.

Je sais qu’on ne le pressent pas,
Mais tu verras, aujourd’hui tu n’écrases personne.
Il ne sert à rien de s’entrainer
Même du lundi au vendredi.
Tu peux venir, mais viens tout de suite,
Ne traine pas, dépêche-toi,
Au moment de partir, tu peux pleurer.

Je ne sais plus où aller,
Puisque la nuit a été longue.
Je ne sais plus où aller,
Puisque la nuit a été longue.
Longue, longue...