segunda-feira, 27 de outubro de 2025

Rússia sofre com déficit de... palhaços


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Posso parecer desrespeitoso com os artistas de circo, mas lembre-se de que até mesmo o petê zoou e desceu a lenha no Tiririca em 2010, quando ele anunciou sua primeira candidatura (que se relevaria um sucesso estrondoso), mesmo concorrendo por um partido então aliado a Lula e Dilma. Na edição de sábado, 25 de outubro, do programa ironicamente chamado Notícias Terríveis e apresentado no YouTube da dissidente Novaya Gazeta Evropa, o jornalista Kirill Martynov aludiu a esta reportagem que apareceu no último dia 23 no periódico pró-Kremlin Moskóvski komsomólets. Se você sabe um pouco de história e de russo, já percebeu o saudosismo da URSS...

Assinada por Marina Bliashon, o título é “Anatoli Marchevski falou sobre a escassez de palhaços profissionais na Rússia”, em referência ao idoso artista circense que concedeu a entrevista. Confesso que muito do que ele diz é verdade, sobretudo sobre pedagogia e humor, porém há uma razão pra que Martynov o tenha inserido na rubrica “Cringe” de sua “revista eletrônica semanal” (que é muito melhor, aliás, do que os vídeos aguados e autocensurados do “agente estrangeiro” Aleksei Pivovarov em sua Redaktsia). Muitas de suas preocupações sociais relacionadas ao fenômeno do humor parecem ofensivas, num país que está voltando a ser uma ditadura totalitária e neste exato momento invadindo outro e matando sua população a esmo.

É curioso que a palavra pra “palhaço” (kloun) venha do inglês, assim como o substantivo “feik” e o adjetivo derivado “féikovy”, aplicados, sobretudo, ao que Putler não quer que se diga publicamente sobre a guerra. Depois de traduzir, apenas adicionei algumas notas explicativas e mesmo alusivas a coisas que me vieram à mente sobre o que Marchevski falou. Só canto a bola de que provavelmente os palhaços foram todos mandados pra uma certa “operação especial” contra outro palhaço. E não, você não leu errado, “até” palhaços negros alegram:



Anatoli Marchevski: “Um verdadeiro palhaço é uma mercadoria rara, não um artista de massa.”

Hoje em dia, as artes circenses são de alguma forma negligenciadas, mas é ao circo que vamos pra eterna celebração da vida, pra inspiração e alegria, pra provar que o impossível é possível e pra fé na bondade que os palhaços, ruivos, brancos e até negros, nos dão.

Anatoli Marchevski, artista de circo e Artista Popular da RSFSR [um título honorífico da época], começou recentemente a dar aulas de palhaço. Em entrevista ao MK, o queridinho do público discutiu por que as pessoas vão ao circo hoje em dia, como deve ser um palhaço moderno e como fazer o público rir hoje em dia.

O público de hoje é sofisticado; não é fácil fazê-lo rir. Como o público do circo moderno difere do público soviético?

A questão é que o repertório de um palhaço deve ser moderno e relevante, e as rotinas devem abordar temas familiares e identificáveis para o público. Consequentemente, o repertório muda com a vida: o que emocionava e era engraçado na era soviética é simplesmente incompreensível pro público de hoje. Pra um palhaço, o público mais importante são as crianças; elas reagem de forma muito sincera e direta às piadas do palhaço. Há uma crença comum na comunidade circense de que, se um novo número não fizer sucesso com as crianças, os adultos certamente não o aceitarão.

Há o público do dia a dia — as quintas-feiras são as mais difíceis, as pessoas estão cansadas e ansiosas pelo fim de semana, e o palhaço precisa se esforçar mais e dedicar mais tempo pra estabelecer um contato. Há também o público do fim de semana – avós com netos, pais com filhos, casais apaixonados – que estão em clima de relaxamento e diversão, e é mais fácil pro palhaço. O riso das crianças é sempre espontâneo, muito longo e estrondoso, mas se, por exemplo, a plateia estiver cheia apenas de soldados, a reação às piadas é explosiva, como se fosse um comando (risos): eles começam a rir ao mesmo tempo e depois param de rir ao mesmo tempo. É uma experiência interessante pro palhaço. Em geral, o ritmo da apresentação depende do público. O público também varia de cidade pra cidade.

Qual cidade tem mais circo?

Agora está tudo misturado. Mas, em geral, a cidade mais favorável ao circo é aquela com um circo permanente, funcionando o ano todo e com casas lotadas. Isso significa que o público não vem apenas uma vez por ano, mas regularmente, e, portanto, adquire um melhor entendimento das artes circenses. Na época soviética, todos os artistas de circo aspiravam a fazer turnês por Moscou ou Leningrado [atual São Petersburgo]. Pra um palhaço, Odesa, com seu humor característico e único, era o teste. Acreditava-se que, se suas apresentações fizessem sucesso lá, A URSS e a Europa inteiras estariam abertas pra você. Nosso país é um país circense; fomos líderes no cenário mundial por mais de 60 anos. Nenhum outro país no mundo tem tantos circos permanentes quanto a URSS e a Rússia hoje. As artes circenses sempre receberam apoio estatal e, por sua vez, desempenharam e continuam desempenhando uma função importante: a educação.

Por algum motivo, as artes circenses são menos comentadas do que a pintura, a música, a literatura e o teatro. O que torna as artes circenses únicas?

Fortalecem os laços familiares, porque a família inteira vai ao circo. As artes circenses são envolventes e acessíveis a públicos de todas as idades, não exigindo preparação especial, como ir à ópera ou a uma galeria de arte. E o circo é uma experiência memorável; não há tragédias ou dramas; proporciona uma visão positiva e otimista da vida, surpreende, alegra e impressiona.

O que um espectador deve levar ao sair do circo?

Com certeza, bom humor. O circo nos mostra a importância de acreditar em nós mesmos e em nossas habilidades, e a importância da continuidade geracional, já que os circos são administrados por dinastias, às vezes com duas ou três gerações de artistas na pista. E o circo também responde às perguntas da vida: o que é bom e o que é ruim, como tratar os animais e a natureza e como se comportar em diferentes situações.

Me deixe dar um exemplo. Eu tinha um espetáculo de palhaços chamado Cinderela, no qual as crianças, como espectadoras, participavam ativamente: com seus aplausos, gritos, berros e pisadas, elas salvavam a princesa, impediam que a madrasta malvada a maltratasse e lutavam por justiça. Intuitivamente, elas se aliavam ao bem e entendiam que estavam combatendo o mal. Com esses pensamentos e sentimentos, elas saíam do espetáculo e contavam aos outros como é importante lutar por justiça, ajudar, proteger e demonstrar compaixão pelos necessitados. É isso que as histórias de circo ensinam. Os princípios fundamentais de vida de uma criança são formados por meio da brincadeira, na qual ela se torna parceira dos artistas no picadeiro.

Recentemente você começou a dar aulas de palhaço na faculdade. Como isso se refletiu em sua vida?

Nossas vidas são feitas de acasos, e o acaso é um padrão. Acredito que sim. Agora trabalho no MosITI, o Instituto Iosif Kobzon de Artes Cênicas de Moscou. Lembro-me de Iosif Davydovich [não esqueçamos que ele sempre apoiou os terroristas no Donbás, onde fez shows] com muito carinho; fizemos turnês com ele pela América Central – Cuba, Costa Rica, Panamá – e até fomos ao Japão. Ele era um trabalhador esforçado, uma lenda, um verdadeiro patriota, que elevou a arte dos palcos ao mais alto nível. Sempre tive o mais profundo respeito por ele e, de repente, fui convidado pro instituto que leva seu nome! Se ele estivesse vivo hoje, provavelmente diria: “Oi, Tolia [forma carinhosa de Anatoli]! Vamos trabalhar!” Ele me tratou muito bem, e minha admiração por essa lenda vai permanecer pra sempre.

É ótimo que esse departamento tenha surgido, porque o gênero palhaço tem certos problemas.

Qual?

Há uma escassez de palhaços profissionais. É importante entender que não estamos mais falando de artistas fantasiados de palhaço, mas sim de palhaços com individualidade, filosofia e repertório próprios, que refletem seu mundo interior e sua atitude perante os acontecimentos atuais da sociedade. Se você percebeu, não há novos nomes surgindo no gênero palhaço. Infelizmente, existem programas de circo que funcionam sem um palhaço. O palhaço é o personagem central de uma apresentação circense, o orquestrador do humor do público; ele cria a integridade do espetáculo, ancora o programa; sem um palhaço, não há circo.

Durante 10 anos, apresentei o Festival Mundial de Palhaços no Circo de Iekaterinburg. Era uma celebração mágica de risos e humor. Apenas os melhores palhaços do mundo eram convidados pra este festival. E imagine, de uma população mundial de sete bilhões, só conseguimos encontrar 120 palhaços de verdade – indivíduos que representavam o humor de seus países. Todos tinham repertórios diferentes, mas eram igualmente vibrantes, alegres e talentosos. Repito, palhaços pintados, vestidos e coloridos não são palhaços; um verdadeiro palhaço é uma mercadoria rara. E tal mercadoria não aparece do nada. O nascimento de uma nova estrela dá um baita trabalho não apenas pro próprio artista (além do talento natural, uma atmosfera criativa, ensaios diários e domínio de vários gêneros são cruciais), mas também pra toda uma equipe (diretor, designer, compositor, intérprete, etc.).

Hoje, nós, educadores, enfrentamos uma tarefa ao mesmo tempo emocionante e desafiadora: repor o número cada vez menor de palhaços. Isso é emocionante pra nós porque envolve criatividade e criação. Somos, por assim dizer, pioneiros. Reunimos uma equipe de professores, todos profissionais de circo, experientes e conhecedores, um curso completo de palhaço. Nosso objetivo é não decepcionar.

Diga, o que faz o público de hoje rir? Como você pode fazer os visitantes do circo de hoje rirem?

Do que o público ri? Do engraçado! Mas a questão é o que exatamente é engraçado. O público é diferente e cada um tem um senso de humor diferente. Não há uma resposta específica. O que é engraçado está em constante mudança. O que fazia as pessoas rirem em meus números na URSS não fazia rir em Paris, mas o que era engraçado em Paris não evocava uma reação em nosso público doméstico. Leonid Iengibarov abriu sua própria página na história mundial dos palhaços; ele era um palhaço-filósofo. Ele fez coisas engraçadas e depois entrou num tom menor – um palhaço com o outono em seu coração. Ele tocou em temas de amor, gentileza, solidão. E Iuri Nikulin tinha temas sociais. Ele saía todo enfaixado e lhe perguntavam: “Iura, o que aconteceu? Você foi atropelado por um carro? Caiu da varanda?” E ele respondia: “Não, eu estava na fila pra comprar pratos.” Isso seria engraçado hoje? Não. Eles vão perguntar o que os pratos têm a ver com isso. Durante a era soviética, houve um tempo em que era difícil encontrar utensílios de mesa, com filas enormes nas lojas e, às vezes, até brigas [não lembra em algo a Black Friday?]. Esses eram os conflitos sociais da época...

Pra fazer os visitantes do circo de hoje rirem, você precisa ser capaz de ver o humor na vida a seu redor. Por exemplo, há um piano e um homem sentado numa cadeira, incapaz de alcançar as teclas. O que ele deve fazer pra alcançar o piano? Uma pessoa comum puxaria a cadeira. Mas um palhaço puxaria o piano em direção à mesa! [Tipo Mr. Bean?...] O teatro circense clássico é construído sobre a lógica da ilogicidade. Um palhaço torna engraçado o que não tem graça. Rimos de nossas deficiências, de nosso caráter, mas de uma forma gentil. Um palhaço é uma criança adulta que encara a vida com otimismo. Pra ele, tudo deve ser honesto, justo e, ao mesmo tempo, interessante e educativo, mas de uma forma lúdica.

O que devemos ensinar aos alunos de hoje, futuros palhaços, pra que se tornem verdadeiros artistas de circo?

É desejável que um palhaço domine vários gêneros, porque o circo é uma linguagem corporal, então é importante que ele seja diverso. Você pode tocar piano, pular ou fazer malabarismo. Quanto mais gêneros você dominar, mais expressivo vai ser e mais o público vai se envolver.

Você já teve a chance de “sentir” seus alunos? Que tipo de genética eles tinham?

Os jovens que vieram pra cá são muito bons, levam isso a sério! Alguns planejam trabalhar no teatro mais tarde, e pra eles, esse treinamento é uma maneira de expandir seu alcance de atuação e o aplicar às apresentações. Há aqueles que almejam uma carreira no circo. Muitos têm uma sólida formação de atores. O primeiro passo é determinar em que direção desenvolver cada um deles, e nós vamos lhes dar o máximo de ajuda e apoio possível.



Esse tiozão é um palhaço. Literalmente.

sábado, 25 de outubro de 2025

Por que presidente fica quatro anos?


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Pode chiar, mas ambas as fotos são duas de minhas preferidas da história do Brasil: os dois únicos momentos em que tivemos a passagem de faixa de um presidente eleito a outro presidente eleito de partidos diferentes DESDE 1961! Façamos as “contas”: de 1946 a 1964 vigeu uma Constituição que previa um mandato de cinco anos não prorrogável pro presidente da República, que podia ser eleito por maioria simples, isto é, menos de 50% dos votos (aliás, como ocorre em Taiwan, por exemplo). Detalhe: essa exigência de maioria simples não estava explícita na Carta Magna, de forma que várias posses quase foram meladas por golpes militares e pela agitação da UDN, partido anti-Vargas. Pra piorar, o único que obteve mais de 50% sob esse sistema foi seu inaugurador e candidato de Getúlio, o General Eurico Dutra, em 1945.

Não estou levando em conta a Primeira “Velha” República (1889-1930), cujo sistema eleitoral era completamente desconfiável e excludente, nem a genericamente chamada “Era Vargas” (1930-45), que, apesar das várias composições institucionais, constituiu um período de exceção. Já na Quarta República, era natural que toda contestação viesse da UDN, pois eles sempre perdiam as eleições. Curiosamente, só quando Jair Messias Jânio Quadros foi eleito em 1960 com pouco menos da metade, mas apoiado pela UDN, não houve rebuliço. Pra Vargas (retornando pelo sufrágio em 1950) e Juscelino Cu de Cheque Kubitschek (com seus formidáveis 35,68% em 1955), precisou-se recorrer à Justiça Eleitoral pra validar o pleito.

Durante a “Véia”, o presidente tinha mandato de 4 anos, sem direito à reeleição. De 1946 a 1964, pro estranhamento de nossos jovens, o mandato era de 5 anos, também não prorrogável. Após o golpe militar de 1964 e os primeiros imbróglios pseudolegais antes de 1969, a “Constituição” de 1967 manteve os 5 anos, mas você sabe o resto da história. Quando João Figueiredo assumiu, o regime já estava fadado ao fim, portanto, ele ganhou longos 6 anos, e após a derrota da emenda da eleição direta, seu sucessor civil José Sarney ficou novamente 5 anos. Mas a “Carta Cidadã” seria promulgada em 1988, e as prerrogativas presidenciais não ficariam imunes a discussão.

Em 1951, Vargas (PTB) recebeu a faixa de Dutra (PSD, partido também formado, porém, sob os auspícios do ex-ditador), de quem tinha se tornado um crítico acerbo no fim do mandato, e tirou a própria vida em 1954. Até a posse de JK em 1956, se sucederiam o vice Café Filho, Carlos Luz (cujo mandato foi mais veloz que seu sobrenome) e Nereu Ramos, e finalmente o “prezida bossa-nova” passou a faixa a outro eleito, opositor seu. Isso não se repetiria por um bom tempo, pois o vice João Goulart sucedeu ao ex-professor fujão e golpista e foi ele mesmo derrubado pelo nanopolítico Marechal Castelo Branco. Só em 1989 o Brasil teria Fernando Collor como presidente eleito, ele mesmo, porém, “impitxado” em 1992, o que fez Fernando Henrique Cardoso receber a faixa do vice em exercício, Itamar Franco, em 1995. A passagem de faixa pra Lula que você viu acima, culminância de um dos períodos mais prósperos e estáveis de nossa história, foi no início de 2003.

Como alguns jovens já sabem, Dilma foi eleita e reeleita, mas ela também era do PT, e além disso também foi impedida em 2016, adiando pra 2023 a possibilidade de uma real transição. A sequência é conhecida: o Jenossida perdeu e covardemente não passou a faixa, já nos bastidores da tentativa de golpe em 8 de janeiro, manchando assim duplamente nossa história recente. Mesmo assim, tal tipo de alternância legal ocorreu, mas a Fênix de Garanhuns corre o risco de ser reeleita em 2026 (se não advir nenhum acaso externo) e outra mudança de rostos pode ocorrer só em 2031. Lembremos, contudo, que a reeleição única só apareceu em nossa República com a emenda de 1997 (FHC) e foi criticada pelo PT, que, porém, usou e abusou do “previléjio”.

Os bafões da emenda da reeleição também são conhecidos e não vão ser meu objeto aqui. Esses dias, minha indagação foi sobre por que o mandato de 5 anos, criado em 1946 (curiosidade: com o golpe do Estado Novo em 1937, Vargas tinha se arrogado no mínimo 6 anos, mas enfim...), não teve sequência com o Efeagá. Se o Caça-Marajás ficasse exatos 5 anos, ele sairia em 15 de março de 1995 e o tucano, após a eleição de 1999 e eventualmente sem reeleição, ainda em 2000 (mas com as novas regras, foi reeleito em 1998). Desde minha infância, naturalizei o mandato de 4 anos, mas hoje me pergunto por que ele ressurgiu, lá do fundo do baú das oligarquias. O Gemini integrado ao Google me deu esta resposta:



Mais importante não foi a resposta em si, mas os links que a ela vieram anexados (meio que dando as “fontes” da busca da IA, o que acho interessante) e cujos conteúdos reproduzo aqui na íntegra. Em resumo, é interessante como, antes de tudo, tal resolução não teve caráter essencialmente prático, mas político, se bem que em tal caso é difícil distinguir ambos. Na França, por exemplo, o mandato de 7 anos (!) foi reduzido pra 5 em 2002 pra coincidir com as eleições legislativas: lá, elas ocorrem pouco depois da presidencial, e a relativa popularidade do novo presidente pode influenciar numa formação amigável da Assembleia Nacional. Talvez o raciocínio fosse parecido aqui, embora os pleitos fossem colocados no mesmo dia; nos dois casos, os deputados já tinham os respectivos mandatos de 5 e 4 anos, e falo só das “câmaras baixas”, pois Senados sempre têm dinâmicas diferentes. O lado político da discussão também tem a ver com a duração do mandato de Sarney, eleito indiretamente devido à vergonhosa rejeição da “Emenda das Diretas” em 1984.

Porém, apareceu outro fator: em 1994, estava prevista uma revisão da CF 88, pois em alguns países costuma haver essas revisões logo depois, uma delas prevendo aqui o plebiscito de 1993 que confirmou o sistema presidencialista de governo. Porém, parece que essa revisão “flopou” e poucas mudanças saíram dela, uma delas sendo a redução do mandato presidencial de 5 pra 4 anos. Em tese, Itamar Franco devia encher o buraco deixado por Collor até 15 de março de 1995. Mas a data de 1.º de janeiro escolhida pro dia da posse, embora também naturalizada em minha cabeça, também parece ter sido arbitrária, como disse em aula certa vez o professor Alvaro Bianchi. Tanto é que após mudança em 2021, Lula vai reinar pelo menos até quatro de janeiro de 2027.

Eis o resultado de minhas pesquisas e resgate arquivístico, que também espero servirem pra futuras consultas de curiosos. Apenas atualizei a ortografia e inseri explicações entre colchetes, quando necessário:


Volta a ganhar força o mandato de 4 anos (3 de maio de 1988, p. 3, assinado “C.C.”) – Brasília, Agência Estado

Dentro de três semanas, provavelmente, a Assembleia Nacional Constituinte estará votando o capítulo final do projeto de nova Constituição, das Disposições Gerais e Transitórias. Entrará em pauta, de início, o substitutivo do Centrão, que não aborda o problema do mandato do presidente José Sarney, ao contrário do texto da Comissão de Sistematização. Se aprovada genericamente a proposta do grupo moderado, duas hipóteses se abrirão. A primeira, de que o presidente tem seu mandato fixado em cinco anos, como todos os sucessores, por força do que dispõe o já aprovado artigo 93. Bastaria que se aplicasse o princípio da analogia, reforçado por pronunciamento feito um ano atrás por Sarney, referente ao seu desejo de permanecer cinco anos. Se houver necessidade de abordagem explícita do tema, a subemenda do deputado Matheus Iensen seria votada, estabelecendo que o atual período administrativo terminará a 15 de março de 1990.

A segunda hipótese, meio malandra, é de que não se faça nada a respeito do mandato do atual presidente, retirando-se, inclusive, a subemenda Matheus Iensen. Nesse caso, por força da interpretação jurídica de que Sarney teria direito a permanecer seis anos no poder, estaria criado um caso. Seu mandato seria aquele para o qual foi eleito junto com Tancredo Neves, estendendo-se até 15 de março de 1991.

Como se vê, a questão é política, mais do que jurídica. Se tiver força parlamentar, Sarney garantirá os cinco anos, desejo por ele manifestado, podendo até ceder às pressões de alguns áulicos e permitir o desenvolvimento da tese dos seis anos.

No entanto... No entanto, os ventos podem soprar em direção completamente oposta. Porque já não parece tão certa a aprovação da emenda global do Centrão. O grupo se liquefez. Não existe mais como base de sustentação do governo. Os 314 votos obtidos em favor dos cinco anos, há um mês, deram a impressão de que, de maneira monolítica, o grupo Sarney no mínimo reafirmaria aquela decisão, nas disposições gerais e transitórias. Não é mais assim. O debate sobre a ordem econômica demonstrou o fracionamento do Centrão. Acresce que o governo continua desgastado, ou melhor, desgastou-se ainda mais, de lá para cá. O presidente da República, por cautela, não deu início ao que se chamava de nova fase de sua administração. Preferiu aguardar a decisão definitiva dos constituintes e o tiro está saindo pela culatra. Ao mesmo tempo, a movimentação em torno da CPI da corrupção, no Senado, e de outras que começarão a funcionar nos próximos dias, na Câmara, como a que investigará as importações de carne feitas durante o Plano Cruzado I, contribuirão para aumentar as hostilidades entre governo e Congresso. Refletirão nas discussões e votações finais.

Há quem veja a emenda do Centrão derrotada, sem os 280 votos necessários à sua aprovação. Poderia, dois dias depois, ser aprovado o texto da Comissão de Sistematização, que prevê eleições presidenciais este ano? A princípio parece difícil, e, a resultar da falta de número para as duas alternativas, estará a negociação. Ou o buraco negro. Conclui-se não estar afastada qualquer alternativa.

Será nisso que joga o deputado Ulysses Guimarães? Pode ser. Sua influência surge decisiva, e sempre é bom lembrar que, para o seu futuro político, nada melhor do que eleições presidenciais em novembro próximo. Seria o candidato certo do PMDB, agora. No ano que vem, ou no outro, nem pensar.

Por tudo isso, sente-se o clima ficar tenso, em Brasília. Experiente, o presidente José Sarney gostaria de ver interrompida a guerra com a CPI do Senado. Ela funciona como pedra no sapato, incômoda e capaz de acirrar ainda mais os ânimos, influenciando a opinião pública e grupos constituintes. Mesmo sem se entrar no mérito da atuação da CPI, ou na motivação política de seus integrantes, basta reconhecer os fatos. A possibilidade de se interpelar o próprio presidente, por via judicial, seria menos traumática do que o seu inviável e impossível comparecimento diante dos senadores, mas também aumentaria as sequelas. Em suma, o que parecia certo, semanas atrás, ficou duvidoso: o mandato do presidente José Sarney poderá ser fixado em quatro anos, ainda que, por enquanto, a maioria pareça favorável aos cinco.

A maioria constituinte também sofrerá influência de outro fator, talvez o mais importante de todos: a opinião pública. Muitas vezes deputados e senadores têm decidido contra os anseios nacionais, como no episódio das Diretas Já, mas há um limite em que cada um costuma pensar duas vezes. Naquela época, havia o regime militar, e os cálculos se faziam, em parte, em função do medo. Ninguém garantia que uma decisão contrária aos desígnios do Olimpo não despertasse a ira dos deuses. Hoje é diferente. Os deuses são outros. Não vestem mais farda e perderam a máquina de lançar raios. Portam, isto sim, título de eleitor. A identificação de quem ficar contra os desejos gerais, inequivocamente em favor de eleições imediatas, poderá custar centenas de mandatos. As eleições parlamentares serão em 1990.

Uma informação final sobre os trabalhos da Assembleia Nacional Constituinte: espera-se para julho a promulgação da nova Carta [ela acabaria ocorrendo em 5 de outubro], entrando em discussão a melhor data. Ironicamente, não poderá ser dia 4, quando se comemora a independência dos Estados Unidos. Nem dia 14, queda da Bastilha. Muito menos a 26, aniversário da revolução cubana.


Mandato presidencial será de quatro anos (10 de março de 1994) – Folha de S. Paulo, da sucursal de Brasília

O Congresso revisor aprovou ontem, em primeiro turno, o parecer do relator da revisão [constitucional], deputado Nelson Jobim (PMDB-RS), reduzindo o mandato presidencial para quatro anos. O quórum foi um dos mais altos já registrados desde o início da revisão: 452 congressistas votaram. Deste total, 429 votaram a favor da redução do mandato presidencial, 17 contra e seis se abstiveram. A proposta de Jobim já reduz o mandato do próximo presidente eleito.

Os oito partidos que encontravam-se em obstrução (PT, PDT, PTB, PSB, PV, PC do B, PSTU e PMN) decidiram participar da votação, a partir do momento em que o painel eletrônico registrou que havia sido atingido o quórum mínimo necessário (293). As lideranças de todos os partidos encaminharam que suas bancadas votassem favoravelmente à redução.

A emenda aprovada em primeiro turno substitui a expressão “cinco anos” para “quatro anos”, do artigo 82 da Constituição, que dispõe sobre o mandato presidencial. O relator disse que o objetivo é fazer com que a eleição e os mandatos dos presidentes passem a coincidir com a dos parlamentares.

[Curiosidade: não pude deixar de notar que havia um deputado do PSTU, partido que nunca elegeu pra Câmara, até onde eu saiba. Porém, pelo que pesquisei, trata-se de Ernesto Gradella, eleito pelo PT, mas pertencente à Convergência Socialista, corrente expulsa em 1992 e reunida no novo partido em 1994. A informação é da própria Folha de 8 de abril de 1995, e mesmo não tendo sido eleito pra mais nada, Gradella segue vivo e atuante!]


EMENDA CONSTITUCIONAL DE REVISÃO N.º 5, DE 07 DE JUNHO DE 1994 (Presidência da República, Casa Civil, Subchefia para Assuntos Jurídicos)

Altera o art. 82 da Constituição Federal.

A Mesa do Congresso Nacional, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, combinado com o art. 3.º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, promulga a seguinte emenda constitucional:

Art. 1.º No art. 82 fica substituída a expressão cinco anos por quatro anos.

Art. 2.º Esta Emenda Constitucional entra em vigor no dia 1.º de janeiro de 1995.

Brasília, 7 de junho de 1994.

HUMBERTO LUCENA
Presidente [do Senado Federal]


Revisão constitucional acabou após oito meses (10 de março de 1994) – Folha de S. Paulo, da sucursal de Brasília

Após oito meses o Congresso revisor encerrou terça-feira seus trabalhos. Em todo esse período, apenas seis mudanças na Carta foram aprovadas, quase todas elas de pouco interesse.

As emendas mais importantes foram a que reduziu o mandato do presidente da República de cinco para quatro anos e a que criou o Fundo Social de Emergência.

Em quase todas as sessões, faltou quórum ou houve obstrução. A última não foi diferente. A resistência do PDT e do PPR e, novamente, a crônica falta de quórum impediram a aprovação de proposta que permitiria a retomada da revisão em 1995.

Fracassada a revisão, os partidos começaram a discutir formas de viabilizar mudanças na Constituição no próximo ano.

Agora, a única forma é através de emenda constitucional, cuja aprovação exige quatro votações (dois turnos na Câmara e Senado, separadamente) e quórum de três quintos (302 na Câmara e 49 no Senado).


O fracasso da revisão constitucional de 1994 (19 de agosto de 2008) – da Redação da Agência Senado

A revisão constitucional, prevista na própria Carta de 88 para cinco anos depois, acabou em fracasso, com apenas seis emendas aprovadas no primeiro semestre de 1994. Quando os constituintes colocaram na Carta a previsão de que ela seria revisada pelo Congresso, imaginavam que então seria o momento para modificar o que não dera certo e melhorar alguns pontos.

No entanto, a revisão chegou em uma época de crise e de paralisia, pois o Congresso, depois da CPI do PC Farias, havia enfrentado a CPI do Orçamento, que levou à cassação de seis parlamentares e à renúncia de outros. O senador Marco Maciel (DEM-PE) afirma ainda que o presidente Itamar Franco também não se interessou pela revisão. Um ano antes, os brasileiros haviam manifestado em plebiscito que não queriam mudar a forma e o sistema de governo, mantendo a República presidencialista.

Fora isso, a revisão constitucional foi realizada quando os brasileiros estavam voltados para as primeiras medidas do Plano Real, a começar por uma estranha “moeda de referência” chamada URV – Unidade Real de Valor. Os supermercados exibiam preços em cruzeiro real e em URV. O ano de 1994 também teria eleições e os deputados e senadores não queriam mexer em uma Constituição que fora saudada com entusiasmo pela sociedade, lembra o senador Marco Maciel.

Some-se a isso o temor que tinham os parlamentares oposicionistas quanto à possibilidade de reorganização do grupo político conhecido na imprensa por “Centrão”, o qual poderia impor retrocessos aos avanços sociais obtidos cinco anos antes. Nos seus primeiros anos, a Constituição foi muito criticada por empresários, sob o argumento de que ela apresentava direitos em excesso e poucos deveres para os trabalhadores e cidadãos.

Assim, as seis emendas de revisão, que tratavam de assuntos específicos, foram aprovadas sem maiores polêmicas. Uma delas reduziu o mandato do presidente da República de cinco para quatro anos e outra criou o Fundo Social de Emergência, considerado como essencial para implantar o programa econômico do governo Itamar Franco, permitindo ao governo dispor com autonomia de parte da arrecadação para o saneamento financeiro da União. Foi aprovada ainda a suspensão dos efeitos da renúncia de parlamentar submetido a processo de perda de mandado.



sábado, 18 de outubro de 2025

Tião Chifrudo sodomiza ex-querdista


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Meu ministro preferido do quase-rei parisiense Mané Marcão, desde que ele assumiu o cargo em 2017, é seu “fiel de primeira hora” e o equivalente a nosso ministro da Defesa de 2022 a 2025. O nome de Sébastien Lecornu pode ser traduzido literalmente como “Sebastião, o Chifrudo” ou simplesmente Tião Chifrudo. Mas outro de que também gosto muito, não ministro, mas ex-deputado, foi um dos dois únicos (sendo o outro Franck Riester, e todos os outros foram contra) membros da então UMP, atual LR, a votar a favor da lei do “casamento igualitário” sob o governo do pinguim de geladeira Francês Holanda François Hollande. Ele se chama Benoist Apparu, literalmente “Benedito Aparecido” ou, como chamamos aqui no sítio, Dito Cido. Torço pela ascensão desse homem!

Só um aparte: a UMP era o partido do marido da Carla Bruni, que conseguiu perder a reeleição presidencial em 2012 e se tornar recentemente o primeiro ex-chefe de Estado preso no período republicano, por causa do financiamento que recebeu em 2007, pra sua eleição, de Muammar Gaddafi, o manequim mais estiloso de todas as Áfricas. Outro rebento dessa legenda é Éric Ciotti, o “Doutor Abobrinha da Quinta República” de voz irritante e que se juntou ao clã Le Pen pra tomar o Castelo, isto é, desestabilizar o governo.

Voltando a nosso herói principal: ainda perto de fazer 40, é uma daquelas figuras macronoides pseudojovens da política nacional que carrega nas costas, porém, uma vasta experiência política e administrativa iniciada no plano local. Um currículo do qual carece até mesmo seu patrão, como gostam de lembrar os analistas franceses. Tendo ocupado várias pastas desde 2017, Tião Chifrudo foi finalmente escolhido premiê por “Júpiter” (apelido quase oficial do ex-banqueiro), este acusado de ignorar as sucessivas derrotas do bloco presidencial nas eleições parlamentares de 2022 e 2024 e continuar escolhendo gente de seu próprio círculo pra formar governos.

Outro aparte: a constituição semiautoritária gaullista de 1958 tem inúmeros dispositivos bizarros que, por minhas conclusões, funcionariam melhor se todos os inquilinos do Élysée seguissem regras não escritas que terminaram se sedimentando ao longo das décadas. Primeiro, o regime é considerado “semipresidencialista”, mas o presidente francês tem muito mais prerrogativas, digamos, que um presidente “presidencialista” brasileiro, como a de (ah, que sonho pros desafetos de Bolsonaro!) dissolver a Assembleia Nacional (a câmara baixa, sendo que o Senado é indissolúvel e não é eleito por sufrágio universal, o que também acho bizarro). Acredito que o nome se deva muito mais à divisão de funções entre “Júpiter” e seu protegido, muito mais favorável ao segundo em países como o Reino Unido, do que ao poder de cada um. Segundo, o artigo 49.3 permitiu que em governos recentes, leis simplesmente passassem sem a aprovação da Assembleia, na mera canetada, o que Tião Chifrudo teve de “prometer não fazer”, apesar de ser direito seu. E terceiro, embora o presidente possa escolher quem ele quiser pro Palácio de Matignon, as chamadas “coabitações” (isto é, governos liderados pela oposição) são um costume consolidado, e não uma regra escrita, e por isso os deputados não têm dado sossego aos últimos ministérios do “Manú do Lula”.

Esse é um resumo da tão falada “crise política” francesa, na verdade as lacunas e contradições da Carta Magna (um documento ad hoc empurrado goela abaixo no meio do cul de sac de uma guerra colonial) levadas ao paroxismo. A real crise é econômica e social, que só termina agravada pela birra partidária coletiva, a qual, porém, não é sua causa primeira. E em todo esse trajeto, Tião Chifrudo ganhou fama de discreto, quieto, cinzento e lacônico, o que lhe teria “mineiramente” facilitado a ascensão, apesar de sua situação ser considerada frágil. Essa imagem sofreu uma chacoalhada durante seu “discurso de política geral” em 14 de outubro, quando teve o plano de governo escrutinado pelos líderes (chamados na ocasião de “presidentes”) das diversas frações parlamentares.

Cada um deles comentava os pontos apresentados e até exprimiam o desejo ou não de apresentar uma moção de censura contra o primeiro-ministro, e no final este podia lhes responder individual ou coletivamente. Olha, se você não gosta do “piçol” (confesso, votei no Boulos, ele é um verdadeiro lutador democrata!), conheça Mathilde Panot, líder da bancada da França Insubmissa (LFI) e marionete do extremista Jean-Luc Mélenchon, primo da tiazinha da Casa do Pão de Queijo. Ela dissecou tão minuciosamente os podres do “Júpiter” que, nesse aspecto, não tenho nenhum reparo a fazer e a parabenizo pela exposição corajosa. Porém, como toda filha radicalizada de família abastada, Thithi detesta ser contrariada e geralmente afoga seus argumentos em surtos e bufadas. Premiês derrubados, Michel Barnier chegou a “elogiar” sua “verve”, mas François Bayrou preferiu dizer que ela “não precisava berrar (hurler)” bem enquanto ele lhe respondia uma pergunta.

Ao responder a mais um dos chiliques da passadora de pano do Hamas (lembrando que, dada a falta de educação, eles ocorrem mais na resposta do que nas perguntas mesmas, em geral pontuadas por sua estudada oratória), que acusou Tião Chifrudo de “colaborar pro jenossídeo de Israel em Gaza”, ele perdeu sua calma habitual, já tendo no próprio ato de acusação tido uma reação que contrastou com os momentos restantes de concentração. Após o devido enquadramento por um cara-de-bobo, a despeitada ficou tão deputada que, se não fingia grunhir alguma coisa, inchava e fazia caretas à la Greta Thunberg por não ter sido mimada.

Seguem os trechos selecionados e minhas traduções com as transcrições, que não precisei tirar de ouvido porque já se encontram na página da própria Assembleia Nacional, com as devidas interpelações de colegas mais críticos. Apenas tornei os textos mais próximos dos áudios, porque foram bastante editados:


Mathilde Panot: Senhor primeiro-ministro, o senhor personifica, sobretudo, a cumplicidade da França no genocídio perpetrado por Netanyahu contra o povo palestino. O senhor mentiu ao afirmar que a França não estava fornecendo armas a Israel. Foi o povo francês que o impeliu a agir com a mais elementar decência: reconhecer o Estado da Palestina, que está agonizando perante o abandono do mundo. É o povo que está salvando a honra da França, agitando a bandeira palestina por toda a parte. Foi o próprio povo que se lançou ao mar para romper o bloqueio ilegal de Gaza.

(Vous incarnez surtout, monsieur le premier ministre, la complicité de la France dans le génocide mené par Netanyahou contre le peuple palestinien. Vous avez menti en affirmant que la France ne livrait aucune arme à Israël. C’est le peuple de France qui vous a contraint à la plus minime des décences : reconnaître l’État de Palestine, qui agonise à l’abandon du monde. C’est le peuple qui sauve l’honneur de la France en brandissant le drapeau palestinien partout. C’est le peuple lui-même qui a pris la mer pour briser le blocus illégal de Gaza.)

Tião Chifrudo: Senhora líder Panot, sua energia é bem conhecida aqui e, como disse Michel Barnier, tenho respeito pela senhora e repito isso. A única coisa que não posso aceitar realmente, realmente, é que diga que a França participou de um genocídio em Gaza. Nem uma única arma francesa partiu destinada ao Tsahal. Não paro de repetir há três anos, e a senhora mantém essa mentira. Nunca menciona a atuação das forças armadas quando distribuíram mantimentos, gêneros alimentícios e medicamentos à população de Gaza! Nunca se refere ao que o exército francês fez em Al-‘Ariish, notadamente com o navio-hospital Dixmude! Nunca fala do envolvimento das forças armadas na FINUL [Força Interina das Nações Unidas no Líbano] na fronteira, notadamente com soldados que foram feridos! Portanto, pare de caricaturar e mentir sobre a posição da França num assunto tão sério e tão sensível! Pare de colocar as francesas e os franceses uns contra os outros! A senhora tem o direito de se opor, tem o direito de ser brutal, mas não tem o direito de mentir sobre um assunto tão sério. É uma questão de dignidade. E é pela República!

(Madame la présidente Panot, votre énergie est bien connue ici, et comme avait dit Michel Barnier, j’ai du respect pour vous, et je vous le redis. La seule chose que je ne peux pas accepter vraiment, vraiment, c’est de dire que la France a participé à un génocide à Gaza. Pas une arme française n’est allée à la destination du Tsahal. Je ne cesse de le répéter depuis trois ans, et vous maintenez ce mensonge. Jamais vous ne faites état de l’action des forces armées lorsqu’elles ont distribué des vivres, des denrées alimentaires, des médicaments aux populations à Gaza ! Jamais vous ne faites référence à ce que l’armée française a fait à Al-Arich, avec notamment ce bâteau-hôpital, le Dixmude ! Jamais vous ne parlez de l’engagement des forces armées dans la Finul [Force intérimaire des Nations unies au Liban] à la frontière, avec notamment des soldats qui ont été blessés ! Donc, arrêtez de caricaturer et de mentir sur la position de la France sur un sujet aussi grave et aussi sensible ! Arrêtez de remonter les Françaises et les Français les uns contre les autres ! Vous avez le droit de vous opposer, vous avez le droit d’être brutale, vous n’avez pas le droit de mentir sur un sujet aussi grave. C’est une question de dignité. Et c’est pour la République !)


      

      

A LFI ocupa uma posição intermediária entre o “piçol” e o “peceó”, pois enquanto ainda compartilha muitas das posições libertárias do primeiro, adota a estrutura caudilhista e a complacência com jihadistas do segundo. Eu queria lhe poupar desta visão, mas assim que acessei por acaso o Instagrão de Rui Costa Pimenta dizendo que no Catar lhe falaram em árabe (quem? Os çaçinos do Hamas? Foi ajudar nas negociações com os cyoneshtas mauvadõens?) mais de uma vez, achando que ele era árabe, não pude deixar de reproduzir este arroubo cringe. O mais legal, porém, são os comentários zoeiros, um deles dizendo que ele era “nosso aiatolá”: afinal, mesmo dentro da ex-querda bananeira ele consegue fazer inimigos.

Montagem feita e sugerida por um amigo: “Free, free PalestAAAIIIIN!”. Qual dos dois é mais charmoso?

E esta é uma eleitora média do Dick Pepper que comenta por lá (só apaguei metade do nome pra não perder totalmente a graça):


Como vimos, a Thithi Barraqueira citou “o povo rompendo o bloqueio ilegal a Gaza” (que povo? Só tinha youtuber, acadêmico e político, kkkkk). A referência era à famosa flotilha cujos organizadores sabiam muito bem que iam ser presos pelo Bibi do Hamas a qualquer momento, sem entregarem um só falafel aos gazauís, e que quem quisesse “se conscientizar”, que fosse procurar as devidas mídias e leituras.

Vou evitar discorrer muito sobre essa presepada hipócrita, que faria melhor em aportar no Irã, na Ucrânia, no Sudão ou em Mianmar. Mas o fato da lógica dos likes, do engajamento e da fama súbita terem levado até os canhotos à “mamãe-falei-zação” da militância geopolítica me preocupa muito, sobretudo ao notar perto da Greta (a “filha do He-Man”, como alguns chamaram, rs), checando o alcance da lacração, um certo Thiago que disse no Inteligência Ltda. que “a Rússia não é uma ditadura”, mas lá “é complicado”.

Sempre temo repercutir materiais que possam ter sido tirados de contexto, mas não pude deixar de trazer isto. ATENÇÃO: não procurem por “Ana Alcalde” no Google!


E pra terminar esta semana lutando por uma Nova (Des)Ordem Mundial sem gordofobia:


sábado, 11 de outubro de 2025

A boiafake que você gosta (meme)


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Embora gramaticalmente a frase correta seria “A mina de que você gosta”, resolvi adotar a forma coloquial que se tornou mais difundida. Se você usa a “rede mundial” e não vive dentro de uma caverna, deve ter se deparado com o meme “A mina que você gosta”, que começa com uma moça ou mulher muito bonita de um determinado setor da sociedade e termina com “Você”, geralmente moço ou homem que encarna a antítese ou “ovelha negra” desse mesmo setor.

Já encontrei tantas montagens geniais (uma delas com o nome “No Japão é assim”, rs) que decidi fazer uma partindo da Ana Castela, maior “ídola” atual do que insistem em chamar de “sertanejo”, acabando com o humorista Barnabé e passando, além de algumas “participações especiais”, por vários astros e estrelas sertanejos de várias épocas. Alguns já faleceram e muitos não são amplamente conhecidos, mas gosto muito de vários deles, ao contrário dos “arteiros” que povoam hoje esse universo...

Uma das coisas com que tentei caracterizar é exatamente a presença do chapéu, embora nem sempre isso tenha sido possível (num dos casos, inclusive, saiu muito melhor do que se tivesse!). Além de aludir a sua ridícula autonomeação como “boiadeira”, me lembra uma das cenas do Chaves em que Seu Madruga o critica porque “não tira esse boné nem pra dormir”. Alguns são muito óbvios, mas não vou nomear todos, e se você quiser “jogar bingo” comigo, tenho uma sugestão. Compartilhe a foto (ou melhor ainda, a publicação) numa rede social sua, liste todas as pessoas na descrição (não precisa batizar a galinha e a vaca, rs) e me mande um print pra eu publicar aqui. Ou simplesmente me mande um e-mail ou um “Zap” com os nomes que você conseguiu encontrar!

Agora vou ser sincero: não gosto da música da Ana Castela, e não é hate de pós-adolescente incel mesmo, porque ela é realmente muito bonita quando produzida. Mesmo assim, sou mais acostumado com o “modaum” antigo e com o romântico dos anos 90 e começo dos 2000, cresci com isso e virou memória afetiva. Pra mim, a Ana simboliza aquela porção da geração Z que cresceu com redes sociais e valoriza muito mais a lata, com toda a apelação e dancinhas inúteis de TikTok, do que a sardinha. Além disso, pessoalmente penso que, dependendo da tomada, ela tem, sim, uma carinha meio acabadinha. Não posso a julgar pelo excesso de trabalho ou por possíveis diversões pouco saudáveis, mas enfim.

Um dado impreciso é que Ana Castela era nova demais pra ter votado na primeira eleição do Jeno, pois não tinha nem 15 anos. Até pensei em colocar 2022 e 2026, mas não só pareceria um suposto apoio descarado meu à Jararaca, como também suponho (me arriscando um pouco em teoria literária) que a protagonista seja sempre uma personagem atemporal e sem idade definida. Fique agora com o “meme”, cujo humor e escolhas podem ser completamente duvidosos, mas fiz um esforço pra parecer “descolado”. E não se esqueça: mesmo se você conseguir a pegar, você tem que suportar “a mina que você gosta” exatamente do jeito que ela acorda... e vestindo uma camiseta com o retrato do sogrão, rs:





segunda-feira, 6 de outubro de 2025

Canções partisans balcânicas (4)


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Em tese, minha publicação com traduções de algumas das chamadas “canções partisans” iugoslavas seria a última, por isso, sugiro que a visite pra poder ter todos os detalhes a respeito desse gênero. Porém, fiquei com vontade de traduzir outras duas, a primeira porque acho importante, e a segunda porque acho muito bonita e tocante. A primeira, em servo-croata, se chama Uz Maršala Tita (Com o Marechal Tito), e a segunda, em búlgaro, se chama “Партизан се за бой стяга” (Partizán se za boi stiága), Um partisan se prepara pra luta (ou ainda “combate”, se quiser). Embora “Iugoslávia” signifique originalmente “terra dos eslavos do sul”, e os búlgaros também sejam eslavos meridionais, a Bulgária só não se uniu ao vizinho por pouco. Portanto, mesmo mantendo a numeração, intitulei estas canções como “balcânicas”.

Na Wikipédia em inglês, achei a história da canção Uz Maršala Tita, a tradução literal em inglês e a versão poética em outros idiomas iugoslavos. Porém, mesmo não tendo feito como no passado (jogar o original no Google Tradutor), me baseei essencialmente nessa tradução, procurando também as palavras no Wikcionário, quando necessário. Isso porque tanto no caso do servo-croata quanto do búlgaro, as letras são bastante simples e conheço razoavelmente os dois idiomas. No caso de Partizan se za boi stiaga, achei o texto original e uma tradução italiana neste famoso portal de canções de protesto, que já utilizei muito no passado. Aí também, fiz várias buscas no Wikcionário.

A canção iugoslava, que tem claros traços dialetais croatas (notadamente o uso de -(i)je- ao invés de e, como em smjelo, osjetiti e svijest), também é conhecida como Pjesma o pesti (Canção sobre o punho) sendo “pjesma” também croata típico. Ela foi composta em 1943 por Vladimir Nazor (letra, um croata) e Oskar Danon (melodia, um judeu bósnio), originalmente começando com o verso “Uz Tita i Staljina, dva junačka sina” (Com Tito e Stalin, dois filhos heroicos). Segundo Danon, o povo espontaneamente “rebatizou” a canção, até a versão original ser oficialmente proibida com a ruptura entre Tito e Stalin, em 1948. A referência aos godos se deve à ideia corrente entre os fascistas croatas pró-Hitler, segundo a qual seu povo teria mais origens góticas do que eslavas, algo refutado pelos comunistas. Enquanto essa era uma peça do culto à personalidade do marechal, Partizan se za boi stiaga tem autoria anônima, datando essa gravação de 1974 pelo Coral do Comitê de Televisão e Rádio da Bulgária socialista.

Escolhi usar a palavra partisan em francês, mais adequada ao contexto de 1939-45 e mais abrangente, equivalente ao eslavo meridional partizan (com “z”) e ao italiano partigiano Em francês, significa literalmente “partidário” ou “relativo a partido(s)”, mas evitei “guerrilheiro”, que às vezes é justamente traduzido como partisan fora do contexto europeu, porque a meu ver os partisans era apenas alguns dos adeptos, como vários em outros tempos e lugares, da “tática de guerrilha”. Não sei se também foi o Partizanski pevski zbor que gravou a canção iugoslava, mas o mesmo áudio está em vários vídeos, inclusive algumas traduções pro português que ignorei. Um dos vídeos em búlgaro tem a letra original, e o outro, em tom um pouco distinto, apenas o áudio lançado com direitos autorais:


Com o filho heroico Marechal Tito,
Nem o inferno vai nos deter.
Andamos valentes, de cabeça erguida
E punho fortemente cerrado.
Andamos valentes, de cabeça erguida
E punho fortemente cerrado.

Somos todos de antiga linhagem, não godos,
Somos partes dos eslavos seculares.
Quem diz outra coisa, calunia e mente,
E vai sentir nosso punho.
Quem diz outra coisa, calunia e mente,
E vai sentir nosso punho.

Todos os dedos nas mãos, na miséria e tormento
A consciência partisan se consolidou.
E agora se preciso, pro Sol ou pro céu
Erguemos o punho bem alto.
E agora se preciso, pro Sol ou pro céu
Erguemos o punho bem alto.

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Uz maršala Tita, junačkoga sina
Nas neće ni pakao smest’.
Mi dižemo čelo, mi kročimo smjelo
I čvrsto stiskamo pest.

Rod prastari svi smo, a Goti mi nismo,
Slavenstva smo drevnoga čest.
Ko drukčije kaže, kleveće i laže,
Našu će osjetit’ pest.

Sve prste na ruci u jadu i muci
Partizanska složila je svijest.
Pa sad kad i treba, do sunca do neba
Visoko mi dižemo pest.

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Уз маршала Тита, јуначкога сина
Нас неће ни пакао смест’.
Ми дижемо чело, ми крочимо смјело
И чврсто стискамо пест’.
Ми дижемо чело, ми крочимо смјело
И чврсто стискамо пест’.

Род прастари сви смо, а Готи ми нисмо
Славенства смо древнога чест.
Ко друкчије каже, клевеће и лаже
Нашу ће осјетит’ пест.
Ко друкчије каже, клевеће и лаже
Нашу ће осјетит’ пест.

Све прсте на руци у јаду и муци
Партизанска сложила је свијест.
Па сад кад и треба, до сунца до неба
Високо ми дижемо пест.
Па сад кад и треба, до сунца до неба
Високо ми дижемо пест.




Um partisan se prepara pra luta,
Joga um fuzil sobre o ombro!
“Adeus, mamãe, adeus, papai,
Adeus, querida irmãzinha!
Adeus, mamãe, adeus, papai,
Adeus, querida irmãzinha!”

“Estou indo à luta feroz,
Lá onde se morre e é morto!”
Seis meses se passaram,
A mãe ainda não viu o filho.
Seis meses se passaram,
A mãe ainda não viu o filho.

Certa manhã chegou uma carta.
A mãe pensa que o filho escreveu,
E na carta, duas-três linhas,
Comunicam do monte Chumerna:
E na carta, duas-três linhas,
Comunicam do monte Chumerna:

“Seu filho já foi morto
Na luta feroz contra o inimigo!
Foi um bom camarada nosso
E um excelente partisan.
Foi um bom camarada nosso
E um excelente partisan.”

A mãe, ao invés de chorar,
Ergueu orgulhosa sua cabeça,
Pois foi assim que educou o filho –
Pra que morresse pela pátria.
Pois foi assim que educou o filho –
Pra que morresse pela pátria.

____________________


Партизан се за бой стяга,
Мята пушка на рамо!
“Сбогом, майко, сбогом, татко,
Сбогом, мила сестрице!
Сбогом, майко, сбогом, татко,
Сбогом, мила сестрице!”

“Аз отивам в боя люти,
Де се гине, де се мре!”
Шест месеца изминаха,
Майка сина не виде.
Шест месеца изминаха,
Майка сина не виде.

Една сутрин писмо стига.
Майка мисли син пише,
А в писмото два-три реда,
От Чемерник съобщават:
А в писмото два-три реда,
От Чемерник съобщават:

“Твоят син е веч загинал
В боя люти със врага!
Той ни беше добър другар
И отличен партизан.
Той ни беше добър другар
И отличен партизан.”

Вместо майка да заплаче,
Гордо вдигна тя глава,
Че отгледа такъв сина –
За родината да мре,
Че отгледа такъв сина –
За родината да мре.

____________________


Partizan se za boi stiaga,
Miata pushka na ramó!
“Sbogom, maiko, sbogom, tatko,
Sbogom, mila sestritsé!
Sbogom, maiko, sbogom, tatko,
Sbogom, mila sestritsé!”

“Az otivam v boia liuti,
De se gine, de se mre!”
Shest mesetsa izminakha,
Maika sina ne vidé.
Shest mesetsa izminakha,
Maika sina ne vidé.

Edna sutrin pismo stiga.
Maika misli sin pishé,
A v pismoto dva-tri reda,
Ot Chemernik sâobshtavat:
A v pismoto dva-tri reda,
Ot Chemernik sâobshtavat:

“Tvoiat sin e vech zaginal
V boia liuti sâs vragá!
Toi ni beshe dobâr drugar
I otlichen partizan.
Toi ni beshe dobâr drugar
I otlichen partizan.”

Vmesto maika da zaplache,
Gordo vdigna tiá glavá,
Che otgleda takâv sina –
Za rodinata da mre,
Che otgleda takâv sina –
Za rodinata da mre.



sábado, 4 de outubro de 2025

Odair José traduzido ao esperanto


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Eu traduzi estas duas músicas do português pro esperanto em 3 de outubro de 2025, ambas compostas e gravadas pelo cantor brasileiro Odair José. Seus títulos são Eu vou tirar você desse lugar, que traduzi como Forportos mi vin el ĉi tiu lok’, e Uma vida só (Pílula), que traduzi como Niaj vivoj estas unu nur (Pilolo). Embora não seja considerado uma “grande estrela”, Odair José é muito estimado por suas canções sobre temas muito polêmicos, mas com letras muito simples e rapidamente inteligíveis.

Eu vou tirar... (1972) fala de um homem que frequenta uma prostituta, mas no fim se apaixona por ela e a convida pra se casar e começar uma vida nova. Pílula (1973) fala da contracepção, então um tema muito moderno, mas aqui abordado do ponto de vista masculino, o que atraiu muitas críticas contra Odair José. Segundo informação sobre o LP original, Pílula foi composta junto com sua então esposa, Ana Maria Iório (outra famosa cantora conhecida pelo nome artístico Diana), mas essa colaboração não é mencionada em outras fontes.

Mi tradukis ĉi tiujn du kanzonojn el la portugala al Esperanto la 3-an de oktobro 2025, ambaŭ komponitaj kaj registritaj de la brazila kantisto Odair José. Iliaj titoloj estas Eu vou tirar você desse lugar, kiun mi Esperantigis Forportos mi vin el ĉi tiu lok’, kaj Uma vida só (Pílula), kiun mi Esperantigis Niaj vivoj estas unu nur (Pilolo). Kvankam ne konsiderata “granda stelo”, Odair José estas tre estimata pro la kanzonoj pri temoj tre polemikaj, sed kun tekstoj tre simplaj kaj rapide kompreneblaj.

Forportos mi... (1972) parolas pri viro, kiu iras ĉe prostituitino, sed fine ekamis ŝin kaj invitas ŝin por edziniĝo kaj komenco de nova vivo. Pilolo (1973) parolas pri kontraŭkoncipo, tiam tre moderna temo, sed ĉi tie pritraktata el vira vidpunkto, kio alvokis multajn kritikojn kontraŭ Odair José. Laŭ informo sur la originala disko, Pilolo estis komponita kune kun lia tiama edzino, Ana Maria Iório (alia fama kantistino konata per la artnomo Diana), sed oni ne mencias tiun kunlaboron en aliaj fontoj.


Forportos mi vin el ĉi tiu lok’

(originala teksto)

1. Aŭdu
La vizit’ unua mia tie ĉi
Estis simpla amuziĝ’
Seksumi nur ekvolis mi

Aŭdu
Tiam mi ekkonis, trovis vin
En nokto tre malvarma
Viaj brakoj
Min forportis al trankvil’

Aŭdu
La vizito dua mia tie ĉi
Estis ne por iluzi’
Mi ĉe vi revenas pro pasi’

Aŭdu
Viaj karesoj al mi mankis
Pro l’ kunesto mi al vi ne dankis
Kaj sola mi forgesis povis ne

Rekantaĵo (x2):
Forportos mi vin el ĉi tiu lok’
Kunportos vin por vivo en mia hejmo
Kaj neniom gravas
L’aliula kontraŭvok’

2. La ver’
Estas ke vi timas fiaskon nian
Timas estintecon agonian
Timas, ke min iam ekprenos pent’

Mi volas,
Ke pri malbonaĵoj vi ne pensu
Al amo vi permesu
Esti nia sola komunsent’

(Rekantaĵo)


Niaj vivoj estas unu nur (Pilolo)

(originala teksto)

Mi ne scias, jam de longe
Niaj vivoj estas unu nur
Nenio pli

Pasas, volas niaj tagoj
Kaj prokrastas viajn agojn
Nepre ĉiam vi

Ĉiutage ni amoras
Sed neniam naski volas vi
La frukton de la am’

Ne komprenas vi bezonon
En viv’ nia havi iun
Iel, gravas ne

Amon vi min dediĉas
Kaj nomas vin fidela virin’
Do, faru tiel, ke naskiĝu
Bela filo aŭ filin’
Bela filo aŭ filin’

x2:
Ĉesu gluti la pilolon
Ĉesu gluti la pilolon
Ĉesu gluti la pilolon
Ĉar ĝi
Naski infanon ne permesas al ni



quinta-feira, 25 de setembro de 2025

Marcelo Rebelo ou Fernando Rosa?


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Em outras ocasiões, quando publiquei aqui trabalhos de fins de semestre, já tive a oportunidade de falar sobre Fernando Rosa Ribeiro, meu professor de História da África na Unicamp, no primeiro semestre de 2008, com quem simpatizei bastante e cujas aulas eram muito agradáveis. O que não falei foi que nas primeiras aulas, ele tinha o hábito de primeiro nos falar (em público, não pessoalmente!) as coisas em inglês, depois em português, atitude que ele dizia “ser benéfica no futuro” pra nós, mas bastante zoada nos corredores.

No final do semestre, ou pouco depois do fim das aulas (não me lembro ao certo), Fernando simplesmente desapareceu da Unicamp, não foi mais localizado nem mesmo por sua PED e até foi exonerado por “abandono de cargo”. A única foto pública que encontrei dele foi na página deste centro de pesquisa, no qual ele parece, porém, ter ocupado um cargo conhecido (e depois abandonado de novo?...) na década de 2010.

Em seu discurso de anteontem, 23 de setembro, Marcelo Rebelo de Sousa, presidente de Portugal, parece ter encarnado o espírito do Fernando e decidido deixar os intérpretes loucos em suas cabines (ou lhes poupando trabalho?). Em alguns trechos, ele simplesmente falava breves frases em português e depois traduzia em inglês, embora na maior parte do tempo lesse em inglês com forte sotaque. O trecho apenas em português não foi muito longo, sendo irônico que tenha sido o único representante de país de maioria lusófona que não fez todo o discurso na língua de Camões, Machado e Coelho.

Mas pra piorar, ao contrário de alguns governantes e do próprio secretário-geral António Guterres, conterrâneo de Sousa, o presidente fazia essas alternâncias sem um critério claro, sem blocos bem distintos apenas num ou noutro idioma. Chegou a subitamente enxertar um trecho em francês, ao falar do Haiti, e outro bem curto, em espanhol, ao falar da América Latina! Nesse trecho, a tecla SAP do véio ficou simplesmente desregulada e parecia não atender aos comandos do controle remoto... Nos outros, como eu disse acima, é puro suco de Fernando Rosa que você pode desfrutar agora:







Aqui, então, parece que ele tá fazendo um bizarro cálculo matemático na EMEF Dilma Rousseff pra no fim, como seria de se esperar, não chegar a lugar nenhum:


terça-feira, 23 de setembro de 2025

Química de Trump e Lula: MEMES


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Hoje, 23 de setembro de 2025, Lula e Trump fizeram os primeiros discursos na Assembleia Geral da ONU que marca os 80 anos de criação da instituição. Dada a evolução recente das relações entre Brasil e EUA, tudo levaria a crer que um encontro dos presidentes seria pouco provável, muito menos nesse foro internacional. Porém, pra surpresa mundial, logo depois de criticar a “destruição da democracia” brasileira, o republicano soltou que tinha encontrado o petista nos corredores, no intervalo entre os discursos de ambos, durante 39 (que precisão!) segundos. Pior, que tinham se abraçado, que ele tinha gostado de Lula e que tinha “rolado uma química” entre ambos. Só faltou um sanduíche com Amorim no meio!

Imagine o ódio que teria queimado Bolsonaro e seus apoiadores sul-americanos... É claro que mesmo nos EUA a fala de Trump espantou pelos delírios, mentiras, banalidades, negacionismo e mudanças erráticas de assunto. Mas a declaração se tornou, do ponto de vista simbólico, um evento histórico, tanto mais pelo palco que o “Rei do Mundo” deu a nosso presidente. Tanto mais que, perto dos diversos tipos de críticas indiretas feitas por este, sem citar nomes, os discursos delirantes feitos neste primeiro dia de assembleia pareceram uma jogada geral de fezes no ventilador.

Com seu “espírito memético”, os brasileiros não perdoariam o arroubo romântico, e como sempre registro eventos geopolíticos interessantes, fiz minha própria seleção dentre a seleção maior já feita pela Folha de S. Paulo, a partir de diversas redes sociais e incluindo montagens feitas por IA. Se até Obama dizia que Lula era “o cara” (the man), quem sou eu pra contrariar?




Versão melhorada, repassada por um amigo meu (7 de outubro):








Esta conta-paródia lembrou bem como alguém que já dizia pro próprio pai no Zap-Zap que sua experiência no Zesteites tava sendo “horrível”, agora está se sentindo mais lixo ainda depois de tentar “no exílio” sabotar o próprio país. Ainda mais numa semana em que Hugo Laquê Motta parece estar descendo do muro e acabando com a graça da “oposição” com a ameaça de cassação do falso paulista:


No dia 24 seguinte, a própria ONU lançou uma foto do “programão” televisivo, e não tive como não fazer este paralelo (live que na própria época já tinha gerado inúmeros memes):


sábado, 13 de setembro de 2025

Golpe do “guia turístico no Brasil”


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Este primeiro print não é meu, mas ilustra um tópico no Reddit sobre o mesmo fato que aconteceu comigo. Queria primeiro recomendar esta página em português, pois é uma perfeita compilação das principais tentativas de golpe online mais recentes, enviadas pelas vítimas potenciais pra confirmação pelos colegas. Algumas resvalam pro humor e dá até pra rir um pouquinho, de tão toscos que são os enredos, mas outras são realmente sérias. Sei que a probabilidade de encontrar informações é próxima de zero, mas em todo caso apaguei qualquer foto ou número de telefone relacionado à pessoa do outro lado da tela. E infelizmente, aqui estou eu de novo tendo que lançar um “alerta de utilidade pública”...

Depois do falso marqueteiro Allen Marvin, que me aborreceu por e-mail duas vezes, semana passada recebi em minha conta reserva do Telegram a mensagem abaixo de uma simpática japonesinha que parecia muito verdadeira. O começo, como você pode ver, é idêntico ao do sujeito acima, mas resolvi copiar aqui o conteúdo completo da conversa, tirando o que não interessava. A seguir, meus comentários:









Várias coisas imediatamente cheiram a golpe, por mais que queiramos fugir da realidade. Primeira e primeiríssima, por que a pessoa continuaria conversando, se viu imediatamente que não era quem estava procurando, ou seja, um “guia turístico no Brasil”? Segundo contam, é realmente dirigido a guias turísticos, mas sobre isso leia mais abaixo. Por enquanto, se lidamos com um adulto ou coroa carente e tarado, vamos pro segundo ponto: à resposta mais seca que você dá, começa toda uma jogação de confete e massagem de ego com elogios e reações de emojis amorosos. Quem não deseja a atenção de uma japinha nova e bonita, mesmo que ela nunca tenha te visto na vida?... Típico de qualquer golpe envolvendo relacionamento, sobretudo o da “loira russa” que calha ser um detento de país da África Ocidental.

O terceiro, mais gritante: por que a sujeita estaria escrevendo em português se vive em Londres? Bem, de fato continuei a conversa no número de WhatsApp indicado (antes de bloquear e denunciar como se deve) e recebi a seguinte história. “Jennifer”, 28 aninhos, teria nascido em Osaka, moraria na City há 20 anos (ou seja, desde os 8) e teria o desejo de conhecer o mundo. Ela disse que usava o Google Tradutor, o que até justifica os erros de concordância de gênero, mas há ainda outros erros meio inexplicáveis. Além disso, a forcei a falar em inglês, o que fizemos por umas mensagens, até que inexplicavelmente ela voltou com o português estropiado. Estranho pra uma londrina quase nativa, não?...

E quarto, mais irritante, na verdade: sei que isso às vezes ocorre com novinhas monossilábicas depois de um match em aplicativo de namoro, mas nossa “Jennifer” simplesmente se esquivava de várias perguntas que exigiam as respostas mais simples. Nem preciso falar do momento em que ela “achou” que eu me chamava “aberto”, mas veja como certos pedidos de detalhamento simplesmente eram encobertos por respostas não relacionadas ou pela mudança de assunto. Fiquei pensando na possibilidade de estar falando com um robô, mas realmente eles ainda não têm esse poder de personificar certas falas, e mesmo um presidiário golpista podia, querendo ou não, carregar nos erros de redação, o que os vítimos da “loira russa” em geral deixam passar.



Chega, não tinha jeito. Mesmo esperando antes de mandar um “I guess you’re a scammer” (Suspeito que você seja uma golpista) na cara “dela” e então bloquear, resolvi pesquisar no Google antes. Realmente, a partir deste ano, parece ter surgido um golpe no Telegram – que depois leva a gente pro WhatsApp, onde é muito mais fácil mandar link de armadilha – em que moças de feição oriental, geralmente japonesas, procuram esses guias brasileiros, realmente tentando enganar guias reais pedindo informações de roteiros. Vários dos casos, inclusive, ocorrem com números com DDI de países completamente diferentes daqueles aos quais as “moças” afirmam estar ligadas. Não foi meu caso, pois “Jennifer” dizia ser do Reino Unido e o número era de lá mesmo.

Dois ou três casos pelo menos foram publicados na página citada do Reddit, mas acabei tirando o print de traduções automáticas pro inglês antes de perceber que os originais eram em português. Como acredito que meu público tem um nível razoável na leitura daquele idioma, fiquei com preguiça de procurar de novo as fontes e tirar novos prints. Portanto, segue o material, que já resumi acima, um deles (original) tendo sido tirado do Facebook:






Porém, consegui guardar o link com o original desta publicação, que alerta pra grave hipótese dessas golpistas serem, na verdade, vítimas de tráfico humano obrigadas a enganar pessoas em outros países (não assisti ao vídeo). Por que o Brasil, não sei exatamente, mas isso pode ajudar a entender por que a conversa não parece tão “robótica”, por que os erros de tradução, apesar do uso do Google, parecem ter inputs humanos e por que os agrados parecem mesmo ser de uma fêmea bem entendida:




segunda-feira, 8 de setembro de 2025

Você recebeu a corrente abençoada de são Carlo Orkutis


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Protege contra cancelamentos, tias reacionárias do grupo da família, golpistas do bet e fotos sem camisa de homem grudento.

Repasse pra 5 pessoas e sua internet nunca mais vai cair nem seu 5G vai parar mais de pegar.

Repasse pra 10 pessoas e todos os bolsominions e lulaminions vão parar de brigar online pra sempre.

Repasse pra 50 pessoas e você nunca mais vai receber recomendações do Frei Gilson, do Café com Deus Pai, de pastores engomados ou de perfis bibliacoach em seu feed.

Repasse pra 100 pessoas e as comportas do Forno vão se abrir pra queda direta de Zuckerberg, Bezos, Musk, Durov, Trump e Bananinha juntos, o Équis, as redes da Meta, o Telegrão e o TicoTeco vão parar de funcionar imediatamente e todos os influenciadores de moda, estilo de vida, dancinha, maquiagem, desafios, céquiço e o escambau vão ficar eternamente presos numa ilha deserta sem qualquer acesso ao mundo exterior.

Repasse pra 200 pessoas e você nunca mais vai receber correntes de oração nem ver esta página zoando com o “primeiro santo millennial”, que teve a sorte de nunca ter usado smartphone!