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quinta-feira, 15 de agosto de 2019

Enver Hoxha, chefe militar e histórico


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/hoxha1


Nos últimos tempos, tenho conseguido reunir mais alguns vídeos informativos e documentais sobre a Albânia comunista no período em que Enver Hoxha a governou. É raro achar material que esteja traduzido ou explicado em português, mas ainda assim estou sem tempo pra estudar a fundo a língua albanesa, que acho muito bonita e que seria essencial pra eu traduzir essas coisas direto do original. Por isso, tenho me contentado em postar materiais alheios que já estejam em português ou coisas antigas lançadas na internet, mas das quais só pude melhorar a qualidade de áudio e vídeo.

Na última sexta-feira, por exemplo, o Globo Repórter, apresentado por Glória Maria (que foi até o país) e Sérgio Chapelin, fez uma visita e contou parte da história da Albânia, nação encravada entre Sérvia, Montenegro, Macedônia do Norte e Grécia, tendo o lindo mar Adriático como litoral. Sua topografia é incomumente montanhosa, e a língua não tem nenhum parentesco próximo com outras da Europa, mas possui muitas belezas e riquezas culturais ainda pouco tocadas pelos estrangeiros.

Uma das razões desse desconhecimento, assim como com a maioria dos países dos Bálcãs, foi a existência de um regime comunista autoritário entre 1943, ano em que os partisans expulsaram os nazistas e fascistas, e 1992, quando ocorreram as primeiras eleições multipartidárias (mesmo com o abrandamento do regime desde 1990). Valendo-se de seu prestígio de libertador, o professor Enver Hoxha (lê-se “rôdja”) instaurou uma ditadura brutal, mais do que as outras do antigo Leste europeu (exceto, talvez, a cleptocrática Romênia), apoiado no prestígio que adquiriu junto a Iosif Stalin e Mao Zedong. À medida que esses líderes morriam e a URSS e China se livravam de suas piores heranças, Hoxha rompia com essas potências e os países que orbitavam em torno delas, isolando a Albânia de contatos externos sob o pretexto de manter a pureza do “marxismo-leninismo”.

Hoxha só morreu em 1985, e desde então começaram as ondas de refugiados albaneses em outros países, sobretudo na tão próxima Itália. A ditadura era tão estrita que se você fosse pego com calça jeans ou Coca-Cola, ou captando o sinal de TV de outros países, podia ser imediatamente preso. As religiões foram proibidas e o Estado se declarou “ateu” (algo que não ocorreu nem mesmo na “revisionista” URSS), e 1/5 da população já chegou a estar presa ou encerrada em campos de “reeducação”. A paranoia de Hoxha com invasões externas povoou a paisagem com inúmeros bunkers, os famosos “iglus” que chegavam a custar o preço de uma casa popular e hoje são usados até como “motel” dos pobres. Nos anos 90, o saldo foi de uma Albânia, dizia-se, “paracapitalista”, como escreveu Suely Forganes à Istoé, ou seja, em que nada se produzia, mas se comprava e vendia de tudo, até os próprios bens e objetos velhos no meio da rua.

É claro que a análise dos regimes comunistas em conjunto deve ser bem matizada, pois havia muitas diferenças entre os países e até as ideologias, enquanto muitos arquivos ainda estão sendo abertos e pessoas entrevistadas. Porém, é sempre bom lembrar pra esses moleques retardados de classe média, que ainda defendem Hoxha e outros carrascos semelhantes em seus smartphones, como era “boa” a vida sob o comunismo europeu: só os russos sentem saudades, porque eles parasitavam a economia de meia Europa, e os húngaros, porque depois de 1956 permitiu-se uma forma de regime mais branda após uma quase guerra civil contra as tropas do Pacto de Varsóvia! “Ain, mas o Bozonaro é fascista...” Até agora tem cubano, congolês, angolano e venezuelano correndo pra cá, achando o melhor dos mundos essa “ditadura machista, racista e homofóbica”, como se deleitam em chamá-la os franceses. “Ain, mas a Globolixo é anticomunista, imperialista e apoiou a ditadura militar...” Claro que reportagem com mais fins turísticos que outra coisa (porque é de turistas e visitantes que a Albânia justamente precisa!) é sem dúvida parcial, mas os fatos são doloridos e a maioria deles vai contra Hoxha: pergunta pros velhinhos se gostavam dessa época, façam propaganda pra eles das “façanhas do Partido do Trabalho da Albânia”...

Esta repostagem, em que selecionei os melhores trechos abordando o “Paraíso” comunista da Albânia, tem o mero fim de documentação e curiosidade. É claro que quem quiser saber mais vai pros livros ou pesquisar na internet, mas pra quem gosta de cultura e história, divirta-se:


Se algum de vocês é tarado pela história do comunismo ou pela Albânia de Enver Hoxha, já deve ter se deparado há muitos anos em vários canais com um vídeo chamado Enver Hoxha nderon dëshmorët e Atdheut (Enver Hoxha homenageia os mártires da Pátria). Eu particularmente sempre fui fascinado pelo breve desfile militar que aparece no segundo e terceiro minutos, um dos raros registros de paradas daquele local e época. Tentei então fazer a experiência de baixar o vídeo original e o melhorar usando o programa VirtualDub Portable, que conheço melhor, e melhorar o áudio pelo Audacity.

Como o vídeo-fonte já era muito ruim, consegui apenas melhorar a cor e o brilho e o deixar menos embaçado, e com o áudio consegui tirar o chiado e aumentar o volume. Nesta postagem, deixei apenas a parte em que é cantado o Hino Nacional da Albânia e o rápido desfile militar, no qual acho muito bonita a postura dos soldados. É notável que no regime de Enver Hoxha, a saudação oficial não era nem uma continência, nem um elevar de braços, mas o leve erguimento do punho direito fechado, mais ou menos na altura da orelha. Esse gesto, inclusive, era repetido por todos os que passavam pelo caixão no funeral de Hoxha, em 1985.

Pra aumentar o prazer de vocês, ainda repeti o desfile militar, dispensando a necessidade de voltar o filme. Espero que gostem e que me perdoem pelos erros de minha incipiente carreira de editor de vídeos! Depois, leiam também outra postagem minha com vídeos e textos sobre o culto à pessoa de Enver Hoxha:


quinta-feira, 19 de abril de 2018

Enver Hoxha e mprehi shpatën (PPSh)


Link curto para esta postagem: fishuk.cc/tungjatjeta


Esta breve canção tem um papel especial na minha vida, embora eu nunca simpatizasse com sua ideologia. No primeiro ano da graduação em História, continuei minha pesquisa na internet por curiosidade pessoal sobre os antigos regimes comunistas europeus. Em 2006, a ditadura implantada por Enver Hoxha na Albânia em 1943 estava começando a despertar meu interesse, não só porque eu nada sabia dela, mas também porque a suntuosidade das manifestações culturais contrastava com a austeridade política e econômica. E nos sites especializados, esta foi a primeira canção que me chamou a atenção, por sua simplicidade e tipicidade balcânica, e deduzi que era um louvor ao poder, embora eu não entendesse a língua albanesa.

A música se chama oficialmente Enver Hoxha e mprehi shpatën (Enver Hoxha afiou sua espada), porém é mais conhecida na internet por algumas de suas palavras, Enver Hoxha Tungjatjeta! (Vida longa a Enver Hoxha!). A palavra tungjatjeta (lê-se “tunndjatiêta”) parece complicada, mas quer dizer um simples “Olá!” ou “Salve!” em albanês, ou literalmente “Vida longa a você”. Em russo é traduzida por da zdravstvuiet (viva), e em inglês, long live, então poderíamos traduzir a frase como “Vida longa a Enver Hoxha!”. Mesmo assim, fiz uma pequena adaptação pra inseri-la bem na letra em português, e além disso há também a variante Tunjatjeta, sem o G, que aparentemente se canta no áudio. Neste caso, deve ser variação dialetal ou eufônica.

O sobrenome “Hoxha” se lê “rôdja”, e esse dígrafo XH também existe no nome de batismo da madre Teresa de Calcutá, cuja origem é albanesa. O governo do líder antifascista durou de 1943, quando os comunistas se apossaram totalmente da Albânia e extinguiram a monarquia, até 1985, quando Enver finalmente faleceu. As primeiras eleições livres só ocorreriam em 1992, após o mando do sucessor de Hoxha, Ramiz Alia, e houve nos últimos anos do regime grandes massas de albaneses migrando pra Itália, atravessando o Adriático como loucos. O comunismo da Albânia era considerado o mais duro da Europa, pau a pau com o romeno Ceaușescu (“tchauchêscu”) e conhecido pelas torturas nos campos de prisioneiros, sobretudo de religiosos. O pós-guerra representou a primeira oportunidade dos albaneses terem um Estado digno do nome, e assim o PPSh (partido comunista) também elaborou algo que pudesse ser denominado “cultura/folclore albanês”, reproduzido à exaustão pelo governo. O regime era totalmente espartano, com a Albânia vivendo apenas do básico e necessário, mas certamente, mesmo sob uma ditadura, era a melhor coisa a que tinha até então chegado um pobríssimo povo nômade de pastores montanheses.

Como não sei albanês, e como o material de pesquisa na internet ainda é precário (idioma muito pouco falado no mundo), me arrisquei a traduzir diretamente de duas versões em inglês, cotejando-as, mas por vezes também buscando algumas palavras no Wiktionary. Uma delas pode ser lida nesta página, e a outra se lê nas legendas que podem ser ativadas em inglês ou albanês, nesta montagem de um canal com muito mais material interessante sobre o comunismo europeu. A língua albanesa é muito bonita e fácil de aprender a pronunciar, constituindo um ramo isolado na grande família indo-europeia, assim como o grego e o armênio. Com algum esforço, podemos reconhecer palavras com raízes remotas iguais às do latim ou português: shpatë (espada), shkrep ou shkarp (penhascos), que lembra “escarpa” ou “escarpado”, e flamur (flâmula = bandeira).

Carreguei no meu antigo canal do YouTube três versões legendadas dessa canção. A primeira é aquela mesma montagem a que me referi acima e que creio ter sido feita pelo administrador do canal, inclusive melhorando a qualidade do áudio original. Pelo que consta, a gravação foi feita pelo cantor albanês Arif Vladi, que continua na ativa, mas nos tempos comunistas fazia (obrigação ou pragmatismo?) propaganda do governo. Neste vídeo podemos ver a ocasião em que é gravado esse áudio, num show bem simples e de imagem pouco nítida. A segunda é uma montagem minha com legenda bilíngue, a bandeira da Albânia comunista e o áudio que eu realmente escutava em 2006: assistam duas vezes, lendo uma legenda de cada vez! Eu baixei o áudio deste famoso site russo, tendo apenas tirado um ruidinho que toca no começo, mas não há dados sobre cantor, ano, compositor etc. Pode-se ler nesta página a letra original toda, com ortografia e gramática certas.

O terceiro vídeo é uma versão dançada e apresentada da música, que decidi legendar porque achei muito bonita a execução dos dançarinos, impressão que tenho com a cultura da Albânia em geral. Legendei apenas a parte cantada, que eu já tinha traduzido, e não o que o narrador do vídeo fala na segunda metade, por eu desconhecer a língua. Nesta página está o vídeo sem legendas, e eu não quis recortar o enquadramento, pois isso tiraria muito material visual importante. Omite-se a segunda estrofe. Como a cultura independente não era muito desenvolvida, sendo toda controlada pelo Estado, Enver Hoxha Tungjatjeta! devia ser como um mantra chiclete que grudava e perseguia a cabeça das pessoas. Seguem minhas três legendagens, a letra em albanês da canção e a tradução em português:





Minha impressão pessoal é que a dança parece uma coisa orwelliana, o que a Europa teve de mais próximo da Coreia do Norte dos Kim. Pra muitos lá que não gostavam do regime, devia parecer um inferno, ter de sentar no salão escuro, com aquele retratão do “Grande Irmão” vendo todos e o locutor começando a música como uma trilha de filme de terror. Seu tom autoritário e intimidador lembra a todos quem é que manda! A cor vermelha onipresente e as batidas compassadas dos pés agravavam a impressão, ainda mais quando tinham o andamento acelerado, perto do fim. Com os dançarinos de traje típico em cima e os de roupa sport embaixo, dá também a figura de várias camadas rumo ao abismo. Ao final, a velha saudação ritual e repetitiva a Enver Hoxha, mecânica e insincera, revelando um culto à personalidade muito mais bisonho do que o feito com o inimigo Marechal Tito. Com o povo sendo inculcado de que a Albânia podia entrar numa guerra a qualquer momento, isolando-se totalmente depois de romper primeiro com a URSS e depois com a China, acredito que o pós-comunismo tenha sido o combate a uma psicose de guerra.

João Amazonas teria múltiplos orgasmos internos e externos se visse este vídeo, hehehe:


1. Enver Hoxha e mprehi shpatën
Edhe’j her o për situatën
Kjo asht shpata qe u rrin tek koka
Gjith armiqve o që ka bota

Refren:
Enver Hoxha heu Tunjatjeta!
Sa kto male e sa kto shkrepa
Zanin Shqipes o lart ia ngrite
Gjithë kët popull në drit e qite

2. Ylli i kuq o shëndrit mbi maja
Bjen daullja edhe zyraja
Porsi nuse asht ba Shipnia
Flamurtare i prin Partia

(Refren 2x)

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1. Enver Hoxha afiou sua espada
Mais uma vez para o combate
E ela pende sobre as cabeças
Dos inimigos do mundo todo

Refrão:
Enver Hoxha, viva tanto qual
Essas montanhas e penhascos
Você levou alto a voz da águia
E trouxe o país todo às luzes

2. A estrela rubra luz nos cumes
Soam tambores, gaitas de fole
A Albânia é levada como noiva
Pelo Partido com sua bandeira

(Refrão 2x)