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domingo, 6 de abril de 2025

“Летіла зозуля” (Um cuco voava)


Endereço curto: fishuk.cc/zozulia


Meu colega de um curso online de língua ucraniana, Luciano Klusczkowski, está cada vez mais empenhado em trabalhos musicais de diversos tipos, e entre aulas e apresentações, ele quase não para, rs. Morador de Guarapuava, cidade do Paraná com importante colônia de descendentes de ucranianos, ele fez a gentileza de me enviar a execução coral da canção popular anônima “Летіла зозуля через мою хату” (Letíla zozúlia cheréz moiú khátu), Um cuco estava voando através de minha choupana, na qual ele toca o harmônio, instrumento de foles usado primordialmente na música indiana. Luciano está muito feliz por avançar na unificação dos corais das igrejas ucranianas locais de São Nicolau Madeirit e da Assunção de Nossa Senhora, que aparecem no belo vídeo abaixo.

Infelizmente, a letra completa não é cantada, e segue também uma interpretação no YouTube. Dada a falta de tempo, não traduzi diretamente do original ucraniano indicado acima, o qual, porém, usei a título de comparação. Usei as traduções em inglês do coral (que curiosidade!) Béloie Zláto, deste arquivo em formato DOC (que também tem a partitura) e, em menor grau, de um dos maiores portais de letras traduzidas do mundo. Traduzi tanto kozák quanto kozachénko como “cossaco”, ignorando o sufixo diminutivo. E o verbo que designa especificamente o canto do cuco na segunda estrofe, kuváty, não tem tradução exata em português.

Em todas as estrofes, os dois últimos versos são repetidos, o que não indiquei na escrita. E como bônus, segue ao final um vídeo exclusivo com Luciano e outros amigos tocando Щедрик (Shchédryk), composta por Mykóla Leontóvych e considerada a melodia ucraniana mais conhecida no mundo, embora poucos conheçam seu uso original como canção de Ano Novo. Ele mesmo pediu pra divulgar sua arte sempre mais frutífera, portanto, colabore você também pra viralização desse talento:




Um cuco estava voando
Através de minha choupana
Ele pousou num viburno
E começou a cantar

“Oh, pelo quê, cuco
Pelo que você está cantando?
Você por acaso, cuco
Está me ouvindo bem?”

“Se eu não tivesse ouvido
Eu não teria cantado
Sobre você, menina
E contado toda a verdade”

“Oh, meu Deus
Deus, o que foi que fiz?
O cossaco é casado
Mas eu me apaixonei

O cossaco é casado
E tem uns dois filhos
E tem uns dois filhos
Ambos de pele morena”

“Eu vou alugar
Essas crianças
E com você, Marúsia
Ir passear no parque”

O cossaco foi passear
Por um domingo e duas noites
O cossaco veio
Fazer uma visita à menina

“Oh Deus, meu Deus,
O que é que fui fazer
Declarei meu amor
A uma mulher no estrangeiro

Não tanto pela mulher
Quanto pelas duas crianças
Meu coração se partiu
Em duas metades”

Летіла зозуля
Через мою хату
Сіла на калині
Та й стала кувати

“Ой, чого ж, зозуле
Ой, чого ж ти куєш
Хіба ж ти, зозуле
Добро мене чуєш?”

“Як би не чувала
То би б я й не кувала
Про тебе, дівчино
Всю правду сказала”

“Ой, Боже ж мой, Боже
Що ж я наробила
Козак має жінку
А я й полюбила

Козак має жінку
Ще й діточок двоє
Ще й діточок двоє
Чорняві обоє”

“А я й тих діточок
В найми понаймаю
З тобой, Марусино
В саду й погуляю”

Гуляв козаченько
Неділю й дві ночі
Прийшов козаченько
До дівчини в гості

“Ой, Боже ж мой, Боже
Який я й удався
На чужій сторонці
За жінку признався

Не так вже й за жінку
Як за дві дитини
Розкололось серце
На дві половини”



terça-feira, 1 de abril de 2025

Max Barskih – “Буде весна” (Que haja primavera)


Endereço curto: fishuk.cc/budevesna


No domingo passado, 30 de abril, no programa Domingão com Huck da TV Globo, o apresentador que não preciso nomear promoveu o emocionante reencontro da moça ucraniana Ksenia, hoje com 22 anos, com sua mãe e seu irmão, que ela não via há quase três anos, tendo fugido da Ucrânia após a invasão ruSSa em larga escala. Seu pai e seu padrasto, naturalmente, estão no front combatendo os porcos ladrões e estupradores, mas ainda assim ela não acreditou que tinha conseguido realizar esse sonho, depois de refazer sua vida no Brasil. Minha imaginação indócil ficou supondo o que essa escória chamada “ex-querda acadêmica” não ficou falando nas redes sociais ou em conversas privadas, em se tratando de uma emissora grande e de um Luciano que não é lá muito conhecido pela simpatia pela Jararaca ou pelo petê. Mas preferi focar no fato que se tratava de mais uma história entre muitas, que os negacionistas não conseguem refutar e que poderia acontecer em qualquer lugar: Palestina, Sudão, Iêmen, Síria, Mianmar ou até na Colômbia e no México sangrados pelo narcotráfico.

Aquela criatura chamada Celso Amorim, cuja evocação “me desperta os instintos mais primitivos” (como diria Roberto Jefferson) e que deve continuar soprando asneiras “BRICSianas çugrobalistas” no ouvido do Molusco – que repetiu os mesmos lugares-comuns e falsas simetrias da “neutralidade pró-Rússia” ao discursar no Vietnã, um dos maiores violadores de direitos humanos do mundo –, teve a oportunidade de visitar Bucha, onde os invasores cometeram um dos piores massacres de civis na guerra. O fato de dizer que “só viu fotos”, e de nosso nanismo diplomático continuar obcecado com “Pelé Stein, Pelé Stein!” como se nada mais ocorresse nessa droga de planeta, a partir de agora me obriga a conter toda raiva e obscenidade que tenho vontade de proferir em público quando vejo seu rosto murcho na TV. Porém, “respirando fundo e contando até dez”, lembro que justamente ontem se completaram os três anos da libertação daquela cidade-mártir, cujas fotos mais explícitas e não censuradas eu gostaria que decorassem o dormitório do ilustríssimo embaixador durante o resto desta e de todas as suas vidas, em qualquer reencarnação, em qualquer plano...

Esse aniversário, e o fato de que Zelensky e o povo ucraniano “Ainda Estão Aqui”, apesar do ditador bárbaro se achar no direito de sugerir um absurdo “novo governo provisório” tutelado pela ONU (!!!), tornam ainda mais simbólica a tradução desta canção de resistência. Meio que “com o bonde andando”, comecei um curso de ucraniano à distância oferecido pela UNICENTRO do Paraná, na turma da professora Edina Smaha, que nos ofereceu sua própria tradução de “Буде весна” (Búde vesná), Que haja primavera, e pôs o vídeo pra tocar na aula. A composição é do próprio cantor, Max Barskih, de cujo nome mantenho a transliteração que ele mesmo se fez, lançada no YouTube em 5 de março de 2022, ou seja, alguns dias após se iniciar a invasão em larga escala. O áudio também pode ser ouvido em sua conta no Spotify.

Segui a transcrição do original ucraniano dada por Barskih em seu canal, e a partir dela também adaptei a pontuação e a divisão em parágrafos. Mudei ainda uma palavra que estava diferente na transcrição da Edina e fiz algumas mudanças no estilo em português, sobretudo na segunda metade da letra, embora o mérito pela tradução seja todo dela e eu não tenha sido explicitamente autorizado a republicar este conteúdo. Em todo caso, lá vai ele, muito bem ilustrado pelo retorno no tempo que Luciano Huck fez pra encontrar sua futura esposa Angélica nos anos 80, ainda na flor da idade, rs:


A cidade está em chamas,
O coração dói,
A luta é cansativa
E o inimigo não dorme

Balas voam enquanto a neve cai
E o inimigo está deitado, silencioso

Noites sem dormir, não sentimos frio
A família espera nos arredores,
Juntos todos nós venceremos,
Esta é nossa terra natal

Que haja primavera,
Enquanto persistimos até o fim,
E a guerra não vai nos destruir,
Nossa fé une os corações,
A Ucrânia vai viver pra sempre

A Ucrânia é nossa terra

A Ucrânia une os corações

____________________


Місто в огні,
Серце болить,
Втомлює бій
І ворог не спить

Кулі летять поки падає сніг
І ворог лежить, мовчить

Ночі без сну, нам не холодно
Чекає сім’я на околицях,
Разом ми всі переможемо,
Це наша рідна земля

Хай буде весна,
Поки ми стоїмо до кінця,
І нас не зламає війна,
Наша віра єднає серця,
Україна навіки жива.

Україна це наша земля

Україна єднає серця



A multiascendente Angélica, quando viu o Gonzo viajante do tempo, parece ter ficado com cara de pensar duas vezes antes de aceitar tão importante compromisso, rs.



E pra piorar, ela trouxe junto um filho-clone perdido da Giovanna Ewbank!

segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

Zelensky chama Putin de arrombado


Endereço curto: fishuk.cc/mix-politica19



Achou que não ia ter publicação sobre política bem perto do Natal?

Rs... Mas aqui, não posso deixar de dar também uma pequena aula de idiomas, e pra piorar, sobre palavrões. Sim, pois Volodymyr Zelensky (sim, aquele mesmo do seriado Servo do povo) parecia estar assistindo ao monólogo coletivo de Vladimir “Khuiló” Putin no dia 19 de dezembro, durante todas as suas longas 4,5 horas de duração. E ele não deixou escapar justamente uma parte em que o ditador, de forma jocosa, sugere que a OTAN e a Rússia poderiam “fazer um duelo tecnológico militar” na Ucrânia, pra ver quem se saía melhor. Esse foi exatamente o trecho congelado abaixo, mas na cara de um dos “repórteres” que apresentou o suplício televisivo:

Tal foi a indignação do humorista de cáqui ante tamanha desfaçatez e crueldade, que não pôde deixar de a externar lá mesmo onde esse tipo de ódio deve ser despejado: People are dying, and he thinks it’s “interesting”... Dumbass. Deixo a tradução pra você, mas não, ele não está se referindo à região do “Donbás”, embora eu suspeite se não tenha sido um (infame) trocadilho voluntário, rs. O xingamento em inglês pode ter várias interpretações ao gosto e criatividade do freguês, mas acho que Zelensky pensou primeiro um original em ucraniano: Люди гинуть, а йому «цікаво»... Довбойоб. [Liúdy hýnut, a iomú «tsikávo»... Dovboiób.]

A palavra ucraniana, que inclusive tem a cognata russa долбоёб [dolboiób], além dessa tradução, tem várias outras em inglês, segundo o Wikcionário. E me desculpem, mas vou ter que “baixar o nível” nessa língua: uma delas é motherfucker, que na minha adolescência, pelo menos, era muito popular entre os colegas que queriam se fazer de americanizados (pronunciando bizarramente “madafâca”!). Tudo resumido, simplesmente se designa um idiota, um canalha, com os diversos temperos digestório-genitais disponíveis em cada idioma.

Alusões à prostituição materna não pareciam muito adequadas, pois existem termos muito específicos e codificados em diversas culturas. No meio desses vários cruzamentos lengoísticos, o querido Wikcionário me veio brasileiramente com um “c*zão”, e eu mesmo pensei anteriormente em “pau no c*”. Mas pra conservar o calão sem economizar na baixaria, eu diria que Zelensky chamou Putin exatamente como se deve rotular qualquer um que começa e continua uma guerra que sabe não poder ganhar, destrói o país vizinho e ainda mói o próprio povo escravizado: um arrombado.


(Minuto aleatório)



Imagine-se na década de 1990, mesmo que você ainda não fosse nascido. Toda a família está reunida pra assistir a um especial de Natal ou outro programa parecido na TV dos Marinho, no meio da tarde ou na primeira parte da noite. De repente, crianças e idosos quase infartam com uma voz que parece vinda do Além e, em despertar de diarreia, só perde pra vinheta do “Plantão”, jogando na cara pênis, vagina, ânus, esperma, secreção e já arrematando no começo com um vírus (crédito do resgate ao canal Nerd Show):


Fontes diplomáticas acabam de vazar um diálogo entre os chefes de Estado da França e da Turquia sobre uma possível colaboração no socorro à população da ilha africana de Mayotte. Veja um trecho da conversação:


sábado, 7 de dezembro de 2024

Гоп-стоп, Канада! (folclore ucraniano)


Endereço curto: fishuk.cc/hopstopkanada


Mais uma das sugestões dos tempos do Pan-Eslavo Brasil (ou seja, antes de agosto de 2021) que não me lembro quem fez e quando fez, mas estava guardada e julguei valer a pena traduzir na página renovada. Não sei se foi o Tiago Rocha Gonçalves, meu amigo de longa data do Paraná que já traduziu canções ucranianas pra mim, mas em todo caso dedico esta publicação a ele, como homenagem ao fim próximo de sua graduação em Direito, rs. Esta música popular do oeste da Ucrânia se chama “Гоп-стоп, Канада!” (Hop-stop, Kanáda!) e poderia ser traduzida como “Canadá, aí vou eu!”, pois homenageia imigrantes que deixaram a referida região pra se fixarem no extremo norte da América.

Porém, decidi não traduzir o hop-stop, porque em russo, por exemplo, na pronúncia gop-stop, costuma ser o anúncio de um assalto por um delinquente de rua, geralmente jovem, por isso chamado “gópnik”, enquanto no mundo anglófono tem outros significados, geralmente ligados a chamar a atenção. A autoria é desconhecida e o “ucraniano” da letra, característico da era pré-bolchevique, ainda possui alguns traços dialetais ou em comum com o russo, como a expressão “nádo” pra indicar necessidade (hoje se usa mais “tréba”) e a variante “marmeliád” ao invés de “marmelád”. Uma das versões diferentes desta que traduzi foi gravada pelo grupo ucraíno-canadense Burya em 2014.

Como informa esta página folclórica, a canção Hop-stop Kanada data da virada do século 19 pro 20 e se relaciona com um tipo de polca muito popular na região central do Canadá, dançada em compasso 2/4, em movimentos ligeiros que envolvem a alternância entre dedão e calcanhar. É chamada em inglês “heel-(and-)toe polka”, e como parte dos imigrantes ucranianos se fixou naquela região, o estilo de dança se tornou popular também no oeste da Ucrânia sob o nome... “kanáda”. Curioso, não? Esta página do mesmo portal traz outra versão da letra e mais informações, e há inclusive um artigo acadêmico sobre a kanada, cujo título pode ser traduzido como “A dança folclórica ‘kanada’: retratando eventos históricos e sociais na Ucrânia Ocidental no fim do século 19 e começo do 20”. Publicado em 2023 na revista ucraniana Questões Atuais de Ciências Humanas, seu autor é o coreógrafo Oleksándr Zastávny, estudante de doutorado na Universidade Nacional Iván Frankó de Lviv.

A versão que traduzi aqui foi gravada pelo cantor Semión Anatólievich Diúkov (n. 1954), talvez por isso mais conhecido como “Semión Kanáda”, em seu álbum de estreia em 1999, Piánitsa (Bebum), e reincluída em seu álbum de 2002, Rodnáia zhená (Querida esposa). O cantor, compositor e produtor nasceu na Khárkiv soviética, possui dupla nacionalidade ucraniana e russa e desde adolescente trabalha com música, cantando e tocando em bandas. No total, ele só possui cinco álbuns solo, o último tendo saído em 2013, e seu site pessoal não é atualizado desde 2016, quando também gravou seu último clipe. Na Wikipédia em russo (única em que Semion Kanada aparece), seus últimos trabalhos citados são dois inícios de atuação como produtor em 2018 e 2019, depois ele simplesmente some. Por isso, brindei vocês no início da publicação com a capa de uma esquecida conta sua no Facebook, mostrando seu jeitão que mistura Shoko Asahara com José Rico!

Com essa versão, foram feitas pelo menos três montagens que seguem abaixo, publicadas respectivamente em 2015, 2013 e 2018, obviamente antes do clima atual contra a Ucrânia se endurecer. Trata-se de trechos da comédia musical soviética Casamento em Malínovka (Свадьба в Малиновке), de 1967, que se passa no vilarejo de mesmo nome (“Malýnivka” em ucraniano), localizado no território da atual província de Kirovohrád. Durante a Guerra Civil Russa (1918-1920), a aldeia troca várias vezes de mãos entre bolcheviques e “brancos”, e o humor consiste na constante mudança de adereços e atitudes dos habitantes a cada tropa que chega e nas dificuldades de dois jovens camponeses apaixonados em meio aos combates. Apesar do enredo, as filmagens foram feitas nas províncias de Poltava e Khárkiv, nas quais estariam as verdadeiras “Malýnivkas” que serviram de cenário. Curiosamente, em vários trechos aparecem atuações do Grupo “Joc” de danças folclóricas moldovas, e embora o áudio seja totalmente diferente, alguns passos parecem mesmo aludir à referida kanada.

Numa publicação no Facebook do ucraniano Ivan Gerhardt está a versão da letra que serviu de base pra eu traduzir direto do original, sem a ajuda do Google, exceto por pesquisas pontuais sobre alguns conceitos desconhecidos. Porém, seu vídeo se baseia na gravação feita por Borýs Sychévsky em 2007. Sinta-se à vontade pra entrar em contato comigo e dar mais informações culturais ou fazer alguma correção, já que parte da letra parece não fazer muito sentido e não fui muito a fundo na natureza dessa “dança”:






1. Me deem pão e um quilo de geleia,
Adeus, rapazes, estou partindo pro Canadá!
Adeus, rapazes, estou partindo pro Canadá!

Refrão (2x):
Hop-stop, Canadá! Não preciso de caipiras velhas,
Preciso de moças, e vocês, rapazes, toquem!
Hop-stop, Canadá! Não precisamos de rublos!
Deem dólares, e vocês, rapazes, toquem!

2. Vou viajar pelo Canadá, ficar contando dólares,
E onde estiver ao anoitecer, aí que vou pernoitar!
E onde estiver ao anoitecer, aí que vou pernoitar!

(Refrão 2x)

3. As mães têm um morteiro, o pai tem um canhão,
Enquanto iam dormir, explodiram a choupana!
Enquanto iam dormir, explodiram a choupana!

(Refrão 2x)

4. Mesinha após mesinha, depois outra mesinha,
E naquela mesinha está sentado um bêbado!
E naquela mesinha está sentado um bêbado!

(Refrão 2x)

5. O pai tem um canhão, as mães têm um morteiro,
Deitaram na cabana, estão bombardeando Berlim!
Deitaram na cabana, estão bombardeando Berlim!

(Refrão 2x)

(Refrão...)

____________________


1. Дайте менi хлiбу, кiло мармеляду,
Прощавайте, хлопцi, ïду до Канади!
Прощавайте хлопцi, ïду до Канади!

Приспів (2x):
Гоп-стоп, Канада! Cтарих баб не надо –
Молодих давайте, а ви, хлопцi, грайте!
Гоп-стоп, Канада! Нам рублiв не надо!
Долляри давайте, а вы, хлопцi, грайте!

2. По Канадi ходжу, долляри рахую,
А де нiчь застане, там i заночую!
А де нiчь застане, там i заночую!

(Приспів 2x)

3. Мати мають мину, батько ма гармату,
Полягали спати – пiдiрвали хату!
Полягали спати – пiдiрвали хату!

(Приспів 2x)

4. Столик за столиком, за столиком столик,
А за тiм столиком сидит алкоголик!
А за тiм столиком сидит алкоголик!

(Приспів 2x)

5. Батько ма гармату, мати мають мину –
Залягли у хатi, луплять по Берлiну!
Залягли у хатi, луплять по Берлiну!

(Приспів 2x)

(Приспів...)



terça-feira, 19 de novembro de 2024

Zelensky: mil dias da invasão russa


Endereço curto: fishuk.cc/ucrania-mil


À guisa de discurso especial lembrando o milésimo dia da invasão em larga escala da Rússia pela Ucrânia (já parcialmente tomada nas regiões de Donetsk, Luhansk e Crimeia desde 2014) em 24 de fevereiro de 2022, a presidente do Parlamento Europeu, Roberta Metsola, convocou uma sessão especial pra que o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky seguisse tentando convencer os legisladores a fazerem tudo pra cortar as asas de Putin. Dispensando sua típica gravação pelas redes sociais, sua exortação foi muito mais moral, já que não apresentou elementos novos, salvo o aparecimento dos militares norte-coreanos, no contexto em que os EUA acabam de dar mais liberdade pra que Kyiv use foguetes contra alvos dentro da Rússia. Eu traduzi a partir do inglês com a ajuda das legendas automáticas que apareciam no YouTube (o vídeo segue no final), e por vezes recorri às legendas em ucraniano pra tirar uma dúvida específica em meio a uma pronúncia não perfeita:


Estimadas senhoras e senhores, estimados amigos, nossos amigos, amigos da Ucrânia.

Obrigado por apoiarem a Ucrânia. Obrigado, Roberta [Metsola, presidente do parlamento], por convocar esta seção extraordinária do Parlamento Europeu para marcar o milésimo dia da guerra em larga escala. Obrigado por garantir que nem um único desses mil dias dessa terrível guerra se tornasse de traição a nossos valores europeus comuns. Provamos que esses valores não são apenas palavras, não algo abstrato. Os valores e o modo de vida europeus, quando passados à prática, protegem a vida das pessoas reais. Muito obrigado.

Juntos, a Ucrânia, a Europa inteira e todos os nossos parceiros nos EUA e no mundo todo conseguimos não apenas impedir que Putin tomasse a Ucrânia, mas também defender o território de todas as nações europeias. Mesmo unido ao norte-coreano Kim Jong-un, o campo de Putin continua menor do que a força da Europa unida. Advirto-os para que não esqueçam isso, não esqueçam o quanto a Europa é capaz de alcançar. E se pudermos deter a decadência do modo europeu de vida, certamente poderemos impelir a Rússia a uma paz justa.

A paz é o que mais desejamos. Dois anos atrás, propusemos a Fórmula da Paz, e sou grato a todos na Europa e a cada parceiro que a apoiou. E os srs., no Parlamento Europeu, estiveram entre os primeiros a apoiar a Fórmula da Paz. E a única que se opõe a ela foi aquela que começou esta guerra: a Rússia. E devemos impelir a Rússia a uma paz justa.

Cada ataque e cada ameaça vindos da Rússia devem ser respondidos com duras sanções. Pois mil dias foram cruciais para reduzir radicalmente a capacidade da Rússia de financiar sua guerra por meio da venda de petróleo. O petróleo é o sangue que circula pelas veias do regime de Putin, e a frota oculta de navios-tanque é o que o mantém vivo. Enquanto esses navios-tanque estiverem operando, Putin vai continuar matando. Sanções pesadas são essenciais.

Obrigado a cada um dos srs., obrigado novamente, Roberta, e obrigado a cada um dos srs. que apoia nosso povo, nossa resiliência, nossa capacidade de restaurar a segurança, mesmo após os mais devastadores ataques massivos da Rússia. Juntos realizamos muitas coisas, mas não devemos ter medo de fazer ainda mais. Agora, Putin trouxe 11 mil militares norte-coreanos até a fronteira com a Ucrânia. Esse contingente deve atingir os 100 mil. Enquanto alguns líderes europeus pensam em eleições ou algo similar às custas da Ucrânia, Putin está focado em vencer esta guerra. Ele não vai parar por conta própria: quanto mais tempo ele tiver, piores vão se tornar as condições.

Todo “hoje” é o melhor momento para impelir a Rússia com mais força, e está claro que sem certos fatores-chave, a Rússia vai se privar de uma real motivação para se empenhar em negociações significativas. Sem incêndios em seus depósitos de munição em território russo, sem o desmantelamento de sua logística militar, sem bases aéreas russas destruídas, sem a perda de sua capacidade de produzir mísseis e drones e sem o confisco de seus ativos [no exterior], os srs. sabem muito bem que Putin menospreza as pessoas ou as regras. Ele só valoriza o dinheiro e o poder. Isso é tudo de que devemos privá-lo para restaurar a paz.

Se alguém na Europa pensa que pode vender para Moscou a Ucrânia ou qualquer outro país como os Estados bálticos, os Bálcãs, a Geórgia, ou a Moldova e ganhar algo em troca, que se lembre-se desta simples verdade: ninguém pode desfrutar de águas calmas em meio a uma tempestade, e devemos fazer de tudo para terminar esta guerra de forma honesta e justa, como a sra. disse, Roberta, e juntos, claro. Mil dias de guerra é um tremendo desafio. A Ucrânia merece que o próximo ano seja tornado o Ano da Paz.

Obrigado novamente, muito obrigado, obrigado por suas resoluções, suas decisões, seus princípios, suas visitas à Ucrânia durante a guerra, durante seu primeiro ano, o qual foi particularmente tão difícil, e obrigado por sua fé na Ucrânia. Muito obrigado, Slava Ukraini!



sexta-feira, 8 de novembro de 2024

BRODERAGEM FRANCO-ALEMÃ


Endereço curto: fishuk.cc/macrolz



Não existe o conceito de “amizade franco-alemã”, nascido na década de 1960, após a superação dos rancores cultivados desde o século 19 e culminados na invasão nazista? E todo novo governante dos dois países não forma um “casal franco-alemão”? Pois é, aqui no Çú podiam reelaborar o conceito como broderagem franco-alemã, rs. Afinal, onde que foi parar a mão esquerda do Macron nessa foto??? Só é uma pena que...


Seguem agora outras notícias de nosso utilíssimo serviço informativo:






Os ucranianos vão cobrar a promessa do Laranjão!!!


quarta-feira, 25 de setembro de 2024

Zelensky no Conselho de Segurança


Endereço curto: fishuk.cc/zelensky-cs

Em sua conta no Facebook, o presidente da Representação Central Ucraniano-Brasileira, Vitorio Sorotiuk, publicou uma tradução do discurso de ontem do presidente ucraniano Volodymyr Zelensky no Conselho de Segurança da ONU, por ocasião da Assembleia Geral deste ano, reunida em Nova York. Como Zelensky falou em ucraniano, acredito que Sorotiuk tenha traduzido direto desta língua, e agradeço a meu amigo Claudio por ter me enviado a publicação. Segue o texto abaixo, com o mínimo necessário de adaptações:


Suas Excelências!

Um dia, neste salão, eles certamente dirão que a guerra da Rússia contra a Ucrânia acabou: não congelada, não suspensa, não esquecida – verdadeiramente concluída.

E isso não vai acontecer porque alguém está cansado da guerra. Não porque alguém negociou algo com Putin.

A guerra da Rússia contra a Ucrânia terminará quando a Carta da ONU funcionar. Deve funcionar. Nosso direito ucraniano à autodefesa deve prevalecer. Nossa cooperação com os povos do mundo que valorizam a vida tanto quanto nós. Nossa integridade territorial. Nossa soberania, a independência do nosso país. Defendemos o que cada nação gostaria de proteger por si mesma. E o que a Carta da ONU garante para todos.

E é a Rússia que deve sempre mentir para justificar sua guerra. Não nós. A Rússia não pode se referir à Carta da ONU para explicar o que está fazendo contra nós, contra a Ucrânia, contra o povo da Ucrânia. Na verdade, em sua maneira pervertida, em seu mundo distorcido, ela se refere à Carta, mas é simplesmente loucura.

A Rússia permaneceu em silêncio porque não conseguiu explicar por que um míssil russo atingiu recentemente um navio com grãos a caminho de um porto egípcio do outro lado do Mar Negro. A Rússia está em silêncio ou mente sobre por que seus drones e mísseis são detectados no espaço aéreo da Polônia, Moldova e Romênia. Todos os dias os ucranianos são feridos e mortos. Todos os dias. Hoje, bombas russas atingiram edifícios residenciais novamente. Até mesmo uma padaria comum se tornou um alvo. O que é tão perigoso para a Rússia na produção de pão? Putin não tem resposta. E a Rússia nunca tem uma resposta honesta para a questão de por que seu exército mata crianças na Ucrânia, “derrota” escolas e hospitais, luta não pela justiça, mas pela desenergização da nação vizinha. Putin não tem nada a dizer se perguntado por que ele está tentando arrastar Belarus para a guerra, por que seus propagandistas ameaçam os povos do Cáucaso ou da Ásia Central, ou por que a Rússia investe mais não no desenvolvimento da humanidade, mas no ódio. A Rússia não tem nenhuma razão legítima – absolutamente – para tornar o Irã e a Coreia do Norte cúmplices de fato em sua guerra criminosa na Europa, quando suas armas nos matam, matam ucranianos e ajudam Putin a roubar nossas terras de nosso povo.

Sabemos que algumas pessoas no mundo querem falar com Putin. Nós sabemos disso. Conheça, converse, comunique. Mas o que exatamente eles podem ouvir dele? Que ele está chateado porque exercemos nosso direito de proteger nosso povo? Ou que ele quer continuar a guerra e o terror apenas para que ninguém pense que ele estava errado? Isso também é loucura.

Desde o primeiro segundo desta guerra, a Rússia faz o que não pode ser justificado de forma alguma sob a Carta da ONU. Cada cidade ucraniana destruída, cada vila queimada – e já existem centenas e centenas delas – é a prova de que a Rússia está cometendo um crime internacional. E é por isso que esta guerra não pode simplesmente “ser isolada”. É por isso que esta guerra não pode ser acalmada pela conversa. Ações necessárias. E sou grato a todas as nações que realmente ajudam de uma maneira que salva a vida do nosso povo.

Putin violou tantas normas e regras internacionais que não vai parar sozinho. A Rússia só pode ser forçada a fazer a paz. E isso é exatamente o que é necessário – forçar a Rússia à paz como o único agressor nesta guerra, o único violador da Carta da ONU.

Agora, com a aproximação do terceiro inverno desta guerra, a Rússia está novamente tentando destruir nossa energia, e neste outono eles estão agindo de forma ainda mais cínica. Eles estão se preparando para atacar nossas usinas nucleares, três delas, temos essa informação e temos evidências disso. Se a Rússia está disposta a ir tão longe, isso significa que nada do que você valoriza importa para Moscou. Esse tipo de cinismo russo continuará a atacar se for dado qualquer lugar no mundo.

A Carta da ONU não deixa espaço para isso. E é por isso que a Fórmula da Paz também não deixa lugar.

Em 2022, no auge da guerra, quando propus a Fórmula da Paz, propus aderir à Carta da ONU – para tornar efetivo tudo para o qual esta organização foi criada. Cada ponto da Fórmula da Paz é baseado nos princípios, propósitos e normas da Carta da ONU – nos direitos que ela garante aos países e nas resoluções da Assembleia Geral, que já são apoiadas pela maioria dos países.

E não existem versões diferentes da Carta da ONU para diferentes partes do mundo. Não há quase estatutos regionais. Não há uma Carta da ONU separada para os BRICS ou o G7. Não há uma Carta da ONU Rússia-Iraniana separada ou uma Carta da ONU Sino-Brasileira separada. Há apenas uma Carta da ONU que une a todos – deve unir a todos. O caminho para uma paz justa é um: passos claros que todos entendem igualmente, e isso se reflete na Fórmula da Paz. Esta é a implementação da Carta da ONU. E todos nós sabemos o que fazer se avaliarmos honestamente a situação e realmente quisermos parar a guerra da Rússia. E o mais importante, ajam. Juntos, é claro. Claro, em unidade. Sem criar divisões novas e desnecessárias do mundo em blocos ou grupos regionais. A unidade sempre funciona por causa da paz.

Precisamos preparar uma segunda Cúpula da Paz para acabar com a guerra. Todos juntos. E convido todos vocês – todas as nações de princípios – a se juntarem a nós neste processo. Qualquer um que realmente respeite a Carta da ONU.

Convidamos a China. Convidamos o Brasil. Eu já convidei a Índia. Trabalhamos com os países da África, com toda a América Latina, Oriente Médio, Ásia Central, Europa, região do Pacífico, América do Norte. Todos são igualmente importantes para a paz. Todos. Sem exceções. Assim como a Carta da ONU deve funcionar sem exceção. Este é um processo que nos levará à paz. Para uma paz justa. Paz verdadeira. Um mundo que será duradouro. Todos nós já sabemos como alcançá-lo. Temos uma fórmula para a paz. Temos a Carta da ONU. E temos toda a força que precisamos para trazê-la à vida.

Tudo do que vocês precisam é determinação.

Muito obrigado.

Glória à Ucrânia!





sábado, 15 de junho de 2024

Zelensky fala francês no Parlamento


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Esta imagem de Marina Ayrton Senna serve apenas pra introduzir mais um combo de bizarrices da política internacional, a primeira delas sendo Volodymyr Zelensky falando uma pequena frase em francês quando discursou em ucraniano pra Assembleia Nacional (Câmara dos Deputados) francesa, em 7 de junho de 2024. Mesmo assim, o verso podia servir muito bem como uma mensagem do presidente ucraniano a seu inimigo Putin, rs.

Em seu novo tour d’Europe, o presidente conseguiu arrecadar bastante dindim pra financiar a resistência contra a invasão militar e genocida do ditador paranoico, mas em Paris ele teve de exagerar mesmo no “biquinho”... Estes são trechos da publicação no canal Ouest France da transmissão feita pelo Parlamento, e eu tive de pular uns trechos em que os aplausos não paravam, mesmo entre mínimas palavras:


“France, je vous remercie d’être a nos côtés pour défendre la vie !” (França, agradeço-lhe por estar a nosso lado pra defender a vida!) Terminando em ucraniano, interpretado em francês: “Дякую Вам за увагу, дякую Вам за підтримку, слава Україні!” (Obrigado pela atenção, obrigado pelo apoio, glória à Ucrânia!) E meio sem saber o que fazer, Zelensky pergunta a Yaël Braun-Pivet, presidente da Assembleia: “We have [to] go?” (Temos que ir?) Ela diz algo mostrando não entender, e ele refaz: “We can go?” (Podemos ir?) Ela de novo: “No! Just a...” (Não! Só um...) – não, o Kvartal 95 ainda não terminou, me espera trazer o piano! Kkkkk.


Surpresa agradável! A booktuber Taize Odelli, que também é responsável por outros perfis, resenhou brevemente no Instagram dela minha tradução do R.U.R. direto do checo, junto com outros livros que ela estava pra ler! Fiquei feliz com a impressão positiva antes de adentrar o texto, com o fato de ter achado “chique” a tradução direta e por ter pronunciado corretamente meu sobrenome (que é ainda o que uso nas redes!), o que infelizmente não aconteceu com nosso querido dramaturgo, rs.


E pra acabar o dia com um gostinho de esperança, eis mais uma montagem sem graça, depois da feita com o Moshiach, agora com o belo dabke de Mohammed Assaf, Dammi falastini, que tanto voltou à moda nos últimos meses... O dia em que for decretado o fim da guerra e a unificação laica dos Estados da Palestina e de Israel, eu queria que ele se parecesse com essas cenas, rs.


terça-feira, 28 de maio de 2024

Única frase ucraniana dita por Putin


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Meu amigo paranaense Tiago Rocha Gonçalves, descendente de ucranianos e estudioso da questão nacional vista pelos marxistas da Ucrânia no início da revolução bolchevique, me indicou este vídeo de 5 de dezembro de 2008, ocasião em que Vladimir Putin, segundo ele, disse a única frase que sabia em ucraniano. Conforme citação deste site, o então “primeiro-ministro” da Rússia (na verdade, um período-tampão em que Putin ainda era obrigado a seguir a Constituição, antes de conseguir a violar) respondeu à pergunta sobre se a Ucrânia, então governada pelo presidente pró-ocidental Víktor Iúshchenko e que ainda não tinha acertado suas dívidas pelo gás, podia pagar com os preços vigentes ainda aquele ano.

No que parecia ser a conferência anual de imprensa transmitida ao vivo pela TV estatal, ainda no clima mais aconchegante e menos tecnológico dos primeiros anos, ele respondeu: “Мне один мой приятель в прежние годы говорил, когда я ему чё-то там... ставил перед ним какие-то сложные вопросы, он мне говорил: Ти що, з глузду з’їхав, чи що?” (Em anos passados, um amigo meu me dizia, quando eu lhe fazia algumas perguntas difíceis: Ty shcho, z hlúzdu ziíkhav, chy shcho? [tradução: “O que houve, você enlouqueceu?”].)



Em outra entrevista coletiva em que chegou a comentar sobre a Ucrânia, mas desta vez em 18 de maio de 2019, dois dias antes da posse do novo presidente Volodymyr Zelensky, Putin repetiu a mesma frase, mas desta vez se referindo a certas políticas do governo de Petró Poroshenko, que então tinha perdido a tentativa de reeleição e sairia. O ditador já tecia partes de sua narrativa com que tentaria justificar a invasão ao vizinho: as políticas de Kyiv eram “russofóbicas”, russos e ucranianos eram “o mesmo povo” só porque tinham “uma história em comum”, a Ucrânia tentava “perseguir” os russos e impor sua própria cultura e estava difícil dialogar com aquele governo.

De fato, Poroshenko foi muito mais antipático ao Kremlin do que Zelensky foi inicialmente, e o ex-ator judeu era até considerado mais “pró-Rússia” só por causa de sua língua materna e porque teve muito mais votos nas regiões orientais do que nas ocidentais (onde, mesmo assim, também ganhou no segundo turno). Inclusive Aleksei Navalny, em vídeo da época que vi outro dia, receava que Zelensky fosse mais simpático a Putin do que aos povos dos dois países, o que acabou não se revelando verdade, embora Moscou jamais estivesse com a razão, pois ajudou a desestabilizar o Donbás desde março de 2014, quando também roubou a Crimeia, isto é, bem antes da posse de Poroshenko, eleito pelo voto popular.



Descobri também esta entrevista por acaso, enquanto pesquisava o caso da frase em ucraniano. Com seu repórter quase privativo, Pável Zarúbin, Putin comenta em outubro de 2023 o cerceamento cada vez maior do ex-chanceler (ex-premiê) social-democrata da Alemanha, Gerhard Schröder, por sua antiga participação no quadro de acionistas da estatal russa Gazprom e sua recusa a condenar a invasão da Ucrânia. Além da amizade com o ditador, Schröder tem sido acusado, enquanto chefe de governo, de ter ajudado seu país a ficar cada vez mais dependente dos recursos fósseis russos, o que, na verdade, em grande parte também foi culpa de sua sucessora democrata-cristã, “Mutti” Merkel.

Hoje liderando uma instável coalizão entre sociais-democratas, verdes e liberais, Olaf Scholz azedou as relações com o colega de partido e, além de romper completamente com o Kremlin, abandonar todos os contratos de importação de gás e petróleo e ajudar Kyiv militarmente, somou-se às sanções internacionais que visariam enfraquecer a invasão. Obviamente, quem não concorda com Putin é “banderista”, “nazista”, “russófobo”, “imperialista” e o que valha, e nessa linha de desinformação, ele disse a Zarubin: “Quanto mais longe de [Gerhard] Schröder, mais próximo de Anthony Rota, que simpatiza com nazistas”, e depois fez questão de repetir em seu surrado alemão dos tempos do Stasi em Dresden, “pra que os próprios alemães entendessem”: “Je weiter von Schröder, desto näher zu Anthony Rota, der [mit] Nazisten sympathisiert.

Até a preposição mit ele comeu, já que em alemão, assim como em português, não “simpatizamos alguém”, e sim “simpatizamos com alguém”. O perfil da embaixada da Rússia na Alemanha reverberou o teatro, embora mais uma vez o Kremlin estivesse surfando numa onda de desinformação, com direito a mentiras sobre Yaroslav Hunka, o concernido nazista de 98 anos.

No início daquele outubro, o premiê canadense Justin Trudeau e o presidente do Parlamento, Anthony Rota, tinham recebido Zelensky pra uma homenagem na câmara, e a certa altura o deputado declarou que estava sentado nas galerias “um veterano da 2.ª Guerra Mundial que lutou pela independência ucraniana contra os Russos”, assim o homenageando publicamente e lhe dedicando uma salva de palmas. Contudo, seu filho Martin Hunka o trouxe lá sem avisar nenhum dos dois governos envolvidos, mas apenas a Rota, que o aceitou sem ser informado de que se tratava de um ex-combatente do braço ucraniano das Waffen-SS nazistas, ainda passível de condenação e jamais arrependido de seus crimes. Após a revelação pública de seu passado, o escândalo fez com que Rota se desculpasse e renunciasse à presidência do Parlamento.

Bem diferente do criminoso de guerra Putin, que não tendo nenhum escrúpulo em estuprar a Constituição pra se perpetuar no poder, esconde nazifascistas debaixo de suas asas (Prigozhin, Utkin, Dugin), deixa o antissemitismo correr impune entre seus burocratas (Lavrov, o pogrom no Daguestão), mata veteranos antinazistas quase centenários na Ucrânia e adota uma estética alusiva ao nazismo em sua propaganda (ver os clipes de Shaman, “cantor” oficial do regime). Martin e sua família, que em sã consciência praticamente plantaram lá o velho, não sabemos a que interesses atendendo, simplesmente sumiram e fugiram da mídia quando “a bomba estourou”, mas apesar dos esclarecimentos, já era tarde demais. E como sói ocorrer pra toda propaganda bananeira pró-Kremlin, o desmentido não vale nada, a exemplo da “mídia” fake news Brasil 247, que copiou e colou conteúdo do desinformador Sputnik, mas em todo caso comunicou sobre o sumiço voluntário dos Hunka.



Meu amigo Claudio, o célebre paranaense do Rio de Janeiro (rs), publicou em seus stories do Instagram uma montagem mostrando o rosto de Zelensky a cada ano desde sua posse como presidente. Me inspirei nele pra fazer esta outra pequena montagem com Putin, incluindo um retrato de sua juventude como espião frustrado na antiga RDA e a tomada numa de suas “posses” que o fez parecer, após 500 plásticas, um moai da Ilha de Páscoa, rs:


Créditos a meu amigo carioca Raphael, que tirou não sei de onde esta sugestiva foto (eu não sabia que ele assistia a rúgbi...) e disse que podia me dar “a ideia de um meme”. Esta foi a primeira que eu tive, e se alguém tiver outra, me comunique, pois ainda tenho o modelo “liso” (template), rs:


E por fim, vemos neste print um momento da entrevista de Ekaterina Kotrikadze (TV Rain), na semana passada, com um ex-vice-premiê de Israel, que em minha visão parece mais o Silvio Santos careca. Lembremos, claro, que o Homem do Baú tem ascendência judaica de origem grega. Quanto à cara da Katya que captei, ela mesma podia se tornar um meme à parte, rs:


quarta-feira, 27 de setembro de 2023

Crônicas da Defesa de Kyiv (histórico!)


Pra ver e guardar! Um portal especial foi lançado este mês pelo site do Museu de Kyiv com uma cronologia diária da chamada “Batalha de Kyiv”, que durou de 24 de fevereiro a 10 de abril de 2022 pra defender a capital ucraniana da queda sob a invasão do Exército Russo comandado por Vladimir Putin. O projeto denominado Crônicas da Defesa de Kyiv foi criado por historiadores ucranianos e especialistas em TI, em conjunto com o Museu de História de Kyiv, e contém cerca de 6 mil reportagens, informações e mapas oficiais e especializados, histórias pessoais, fotos e vídeos documentais. Todo esse material apresenta de forma abrangente, dia a dia, os acontecimentos nas frentes, na retaguarda, nos territórios ocupados e libertados.

Idealizado, organizado e comandado por Vitáli Nakhmanóvich, historiador, etnopolitólogo, museólogo e ativista nascido em Kyiv em 1966, o projeto Crônicas da Defesa de Kyiv conta com seis seções: “Eventos”, “Situação”, “Mapas”, “Histórias”, “Fotos” e “Vídeo”. Infelizmente ainda só tem em ucraniano, nem mesmo em russo ou inglês, mas mesmo sem se usar um tradutor automático, a orientação é fácil, e a mídia aproveitável e valiosa. Uma iniciativa abençoada que, além de eternizar uma chaga da história contemporânea pras próximas gerações, ajuda no combate à propaganda da ideologia “ruscista” (russa + fascista) do ditador genocida Putin, que infelizmente fincou raízes no Brasil!


E, como não podia deixar de tocar em temas da atualidade, eis que na edição do dia 26 do Jornal Hoje, na reportagem que falava sobre o deslocamento de dezenas de milhares de armênios étnicos da região azerbaijana do Artsakh (que Baku chama de “Qarabağ”) rumo à Armênia, aparece esta tabela da escrita armênia só pra dizer que esse povo tem até “alfabeto próprio”, rs!


sábado, 8 de julho de 2023

Quinhentos dias de barbárie russa


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/500dias


   

Discurso do presidente Volodymyr Zelensky (que os idiotas brasileiros ainda insistem em chamar de “palhaço comediante”, fingindo não ver que o regime de Moscou é totalmente mafioso desde o fim da URSS) diretamente da ilha das Cobras, retomada aos russos pouco depois do começo da invasão em larga escala à Ucrânia, em homenagem aos combatentes mortos durante os 500 dias de conflito aberto que se completam hoje. Joguei no Google Tradutor e revi o texto final:

Desejo-lhes saúde, queridos ucranianos e queridas ucranianas!

Hoje estamos na ilha das Cobras, em nossa ilha que nunca vai ser conquistada pelo ocupante, como toda a Ucrânia, porque somos um país de valentes.

Hoje homenageamos aqui nossos heróis ucranianos, todos os combatentes que lutaram por esta ilha e a libertaram. E embora este seja um pequeno pedaço de terra no meio de nosso mar Negro, é uma grande prova de que a Ucrânia vai recuperar cada pedacinho do seu território.

Quero agradecer aqui mesmo, deste lugar de vitória, a cada um de nossos combatentes por esses 500 dias.

Nossas Forças Armadas, nossos serviços secretos, a Guarda Nacional, nossos guardas de fronteira, o Serviço de Segurança da Ucrânia, a Polícia Nacional, nossos oficiais de ligação, nosso povo... Obrigado! Obrigado a todos que estão lutando pela Ucrânia!

E que a liberdade, que todos os nossos heróis de diferentes épocas desejaram para a Ucrânia e que deve ser conquistada agora mesmo, seja uma homenagem a todos os que deram suas vidas pela Ucrânia. Com certeza vamos vencer! Necessariamente!

Glória à Ucrânia!

Estamos avançando. Obrigado a cada um e a cada uma!



t.me/boletimucrania: Não se esqueça também de se inscrever no canal Boletim da Ucrânia pelo Telegram, em que a equipe liderada por Gabriel Neder está trazendo notícias diretamente do front e de fontes confiáveis, com traduções em que até descendentes de ucranianos no Brasil estão envolvidos. Vacine-se contra a desinformação do Kremlin e ajude a combatê-la divulgando o material entre amigos e contatos!




terça-feira, 6 de junho de 2023

Rússia destrói barragem e afoga povo


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/kakhovka

Na madrugada de 6 de junho de 2023, a barragem da Usina Hidrelétrica de Nova Kakhovka, cidade ucraniana na beira do rio Dnipró, foi destruída por explosões que imediatamente causaram inundações mortíferas, espalharam substâncias tóxicas nocivas ao meio-ambiente regional e ameaçaram o sistema de resfriamento da já prejudicada Usina Nuclear de Zaporizhia. Construída na época soviética, a barragem terá de ser toda refeita, não tem como ser apenas consertada, e seu rompimento já era algo temido pelos analistas militares. Numa semana em que a contraofensiva da Ucrânia tem ganhado mais visibilidade, o Kremlin tratou imediatamente de culpar Kyiv por um “bombardeio” intencional, mas ao que parece, a estrutura explodiu de dentro, isto é, entre as análises mais aventadas estão a ativação de bombas que já teriam sido colocadas pelos invasores (já que a região está sob controle russo) ou o possível colapso de alguma operação de reparo, conserto ou mudança que deu errado, muito errado.

Seja como for, Zelensky e o Ocidente tratam o fato como mais um “atentado terrorista de Putin”, mas observando melhor, a tragédia corre o risco muito mais de arruinar de vez a ocupação russa (soldados já teriam morrido, a população da região teve de ser evacuada e, o principal, a Crimeia vai ficar sem abastecimento de água limpa) do que atrasar a contraofensiva ucraniana, mesmo que não esteja claro se o Kremlin teve essa intenção. É mais um dos reflexos da bagunça que virou o front russo, com tropas abandonadas, comandantes incompetentes e relapsos, falta de equipamentos e briga entre exército oficial e milícias criminosas. Penso pessoalmente que Putin, ou quem quer que esteja controlando, já perdeu as esperanças de manter o controle das regiões ocupadas (o qual, de fato, nunca se consolidou), e que, talvez preparando uma retirada, vai pelo menos deixar tudo em ruínas. Não deixa de ser um crime, em todo caso, que futuramente vai cair na conta do ditador da Rússia.

Esta declaração do Ministério das Relações Exteriores ucraniano sobre o incidente foi traduzida por Vitório Sorotiuk, de quem já publiquei vários artigos aqui, e ressalta o lado terrorista do que pode ter sido uma explosão provocada pelos russos. Infelizmente, tá difícil receber boas notícias sobre essa invasão criminosa, e agradeço ao amigo Claudio pelo envio dos textos. Apenas adicionei algumas notas e fiz algumas mudanças redacionais pra adequar ao estilo da página.



Rússia realiza ato terrorista contra o povo ucraniano

Declaração do Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia sobre o ato terrorista da Rússia na Usina Hidroelétrica de Kakhovka

Na noite de 6 de junho, a Federação Russa explodiu a barragem da Usina Hidroelétrica de Kakhovka, localizada perto da cidade de Nova Kakhovka, no território temporariamente ocupado da região de Kherson.

Dezenas de assentamentos em ambos os lados do Dnipró correm risco de inundação.

Unidades da Polícia Nacional e do Serviço de Emergência do Estado da região de Kherson estão tomando medidas urgentes para evacuar a população civil de possíveis zonas de inundação. Moradores da margem esquerda [em relação ao curso do rio rumo ao mar] temporariamente ocupada da região de Kherson estão sendo alertados.

Consideramos a detonação da Usina Hidrelétrica de Kakhovka pela Federação Russa como um ato terrorista contra a infraestrutura crítica ucraniana, que visa causar o maior número possível de vítimas e destruição. O ataque terrorista à Usina Hidroelétrica de Kakhovka foi anteriormente discutido ativamente no nível das forças de ocupação na região de Kherson e propagandistas na televisão russa, o que indica que foi planejado com antecedência.

O enfraquecimento da barragem Usina Hidrelétrica de Kakhovka é um terrorismo ecológico causado pelo homem, o maior desastre causado pelo homem na Europa nas últimas décadas, outra manifestação do genocídio da Rússia contra os ucranianos. Esta é a resposta do Kremlin aos países que pedem negociações de paz com a Federação Russa.

Devido à diminuição do nível da água no reservatório de Kakhov, pode haver o perigo de um incidente em outro objeto crítico de infraestrutura ocupado pela Rússia – a Usina Nuclear de Zaporizhia.

Apelamos à comunidade internacional para condenar veementemente o ataque terrorista russo à Usina Hidrelétrica de Kakhovka.

O crime cometido pelo homem na Federação Russa confirma a alta relevância da Fórmula da Paz do Presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky. Apelamos aos parceiros internacionais para que se associem à sua implementação o mais rapidamente possível, em particular nos pontos de combate ao ecocídio, segurança nuclear e energética.

A Rússia terá que compensar todas as consequências de seu crime: tanto para as pessoas quanto para a infraestrutura e o meio ambiente.

Apelamos também aos países do Grupo dos Sete [G7] e à UE para que considerem urgentemente a imposição de novas sanções de longo alcance à Federação Russa, em particular à indústria russa de mísseis e à indústria nuclear.

De acordo com os resultados da reunião do Conselho de Segurança Nacional e Defesa da Ucrânia na manhã de 6 de junho, a lista de ações do MRE da Ucrânia, propostas pelo Ministro das Relações Exteriores, sr. Dmytró Kuleba, no contexto da resposta, incluirá, em particular, a convocação de uma reunião urgente do Conselho de Segurança da ONU pela Ucrânia e trazer a questão do ataque terrorista russo para a reunião do Conselho de Governadores da AIEA, bem como acionar o Mecanismo de Defesa Civil da União Europeia.



segunda-feira, 1 de maio de 2023

“Mavka” (conto de Ivan Frankó)


Endereço curto: fishuk.cc/mavka-conto

Novamente meu amigo Tiago Rocha Gonçalves fez uma generosa contribuição ao traduzir diretamente do ucraniano o conto Mavka, escrito e publicado pelo famoso literato Ivan Frankó em 1905. Iván Iákovych Frankó (que o Tiago transliterou originalmente como Iván Yákovytch Frankó), nascido em 1856 e falecido em 1916, foi também um poeta, crítico literário e social, jornalista, intérprete, economista, ativista político, doutor em filosofia, etnógrafo e o autor dos primeiros romances policiais e da poesia moderna na língua ucraniana... ufa! Ele era um radical político e fundou o movimento socialista e nacionalista na Ucrânia ocidental, tendo traduzido pro ucraniano muitos escritores europeus célebres.

Lembremos que os lugares onde ele nasceu (Nahuiévychi) e morreu (Lviv, chamada “Lemberg” em alemão) pertenciam ao Império Austro-Húngaro, e após a 1.ª Guerra Mundial, a outros países que ocuparam o território da finada potência, até serem anexados à RSS da Ucrânia pelos soviéticos durante a 2.ª Guerra Mundial. Junto com Tarás Shevchenko (1814-1861), Frankó foi o maior influenciador do pensamento político e da literatura moderna na Ucrânia independente, por meio da obra legada.

Na mitologia e folclore ucranianos, em especial da região dos Cárpatos, a mavka (plural ucraniano: mávky), também chamada navka ou niavka, é uma entidade feminina representada com cabelos longos e às vezes nua, geralmente descrita como uma tentação que levaria os homens à morte. As mavkas seriam espíritos de meninas mortas de forma não natural, trágica ou prematura, em especial bebês não batizados. Comparáveis às rusalkas russas, não exibem, porém, reflexo na água nem sombra no chão, e por vezes são reputadas por ajudarem fazendeiros a cuidar do rebanho e espantar animais selvagens.

A escritora Lésia Ukraínka (1871-1913) também incluiu as mavkas em seus textos, sobretudo na peça poética Lisová písnia (A canção da floresta, 1911), e a banda ucraniana Mavka, formada em 2015, mistura temas étnicos e folclóricos com música eletrônica e ajudou a popularizar a figura. Além disso, um filme de animação com 90 minutos, inspirado naquele livro de Ukraínka, foi lançado nos cinemas da Ucrânia no último 2 de março, em plena guerra. Originalmente gravado em inglês, também saiu ao mesmo tempo em ucraniano e está sendo dublado e lançado em vários países.

Como bem observou o Tiago no manuscrito original, “Hándzia”, o nome da menininha principal, se pronuncia com o “h” aspirado, o “an” aberto e não nasal (ánn) e a sílaba “dzia” pronunciada de uma só vez, com o “i” breve. Esse “h” aspirado é o mesmo do inglês ou do “g” espanhol na palavra “amigo”, ou um tanto próximo com algumas pronúncias mais suaves do “rr” português, sobretudo no Brasil. A revisão na tradução foi mínima, então, boa diversão!



(Conto de verão)

– Handzia! Handzinha! Pelo amor de Deus, fique em casa, porque eu vou à floresta, pegar cogumelos!

– Me leva contigo, mamãe, por favor! – falou a pequena Handzia, contorcendo seus grossos lábios – Em casa é onde tenho mais medo!

– Ah, vá lá! Já está uma menina tão crescidinha e ainda tem medo de ficar em casa em um dia claro! Continua de caprichos, mas tem medo até dentro de casa! Que vergonha! E como é que eu te deixaria na floresta? Você consegue mesmo andar lá?

– Consigo, mamãe, consigo, não se preocupe – fala Handzia, já se alegrando.

– Não, não, fique em casa! Lá na floresta tem mavkas, – sabe, aquelas com cabelos verdes! Elas levam menininhas embora.

– Oh! Eu não tenho medo de mavkas, mamãe! Eu sonhei com uma num lugar bem longe, – foi tão legal brincar com ela! E ela ria para mim, muito, muito alto! – E fala: “Handzia, u-u!” E eu falo: “Estou aqui!” E ela fala: “Venha, Handzia, na floresta, tem muitos balanços pra nós, hihi hihi!” Me leva, mamãe, me leva, pode ser que a gente a veja! Eu queria tanto balançar com ela!...

– Ah, vá lá, burra! Fica falando baboseira! Pois fique quieta em casa, que eu tranco a porta e ninguém entra. Eu volto daqui a pouco, não fique com medo!

A mãe foi. Girou a chave de ferro na fechadura e deslizou a trava de madeira. A menina chorava em casa.

– Por que a mamãe não quis me levar? Eu teria visto a mavka! E na floresta é tão bonito, quieto, verde, tão quentinho! Ah, essa mamãe! Me trancou em casa! E elas estão sozinhas na floresta, sozinhas...

A casa onde viva a mãe de Handzia ficava no ponto mais à beira da vila. De três direções, podia se ver, não muito longe, uma floresta espessa, escura, e eternamente melancólica, que fazia barulho de vez em quando, e produzia uma canção com um quê de segredos. Estranha, aquela canção. Algumas notas beliscavam o coração como uma ferida já quase curada; outras rugiam o pensamento consigo mesmas no odor sombrio da obscuridade, num espaço um tanto indeterminado e opaco; outras violam as mais profundas e fortes cordas da alma humana, e criam desejo de vida, energia, ânsia ao trabalho incansável, ao futuro brilhante, e ainda inspiram uma tristeza profunda no coração.

Handzya nascera em meio ao barulho daquela canção. Desde quando era capaz de ouvir tons, ouvia, mais que tudo, aqueles, e não é de admirar que aquela canção encantava a criaturinha nervosa por inteiro. Nos sonhos, e na realidade, a escutava em noites de inverno, quando rugia a tempestade, e a floresta gemia, como mil feridos no campo de batalha. Mais lhe agradava a primavera, quando o vento morno agitava devagarinho os galhos úmidos e sem folhas, mas já pingando a sua seiva fresca. Escutava ela no meio-dia de verão escaldante, quando o vento ainda não se ouvia, e, mesmo assim no topo das árvores esfolheadas corria um sussurro misterioso, como que um suspiro, ou como uma tagarelice sonolenta de árvores dorminhocas no calor do sol. A imaginação infantil dia e noite perambulava pela floresta. Achava naquelas vozes, o eco de suas minúsculas, e ainda assim, para a menina, tão pesadas e imensas alegrias e sofrimentos. Logo, não é de se espantar que aquela canção verdejante encantava a criatura delicada e ansiosa. Nos sonhos e na realidade, havia somente um pensamento único. A floresta e seus esconderijos. O que ela melhor e mais carinhosamente recordava na sua curtíssima vida (ela tinha apenas cinco anos!) era tudo o que estava indissociavelmente relacionado à floresta.

Ah, com que alegria, com que satisfação ela ouvia histórias sobre os espíritos da floresta, sobre essas criações da fantasia humana, metade assustadoras, metade atraentes, e principalmente sobre mavkas, com a cara branca como a casca de bétula, e com longos cabelos verdes. Ela não conseguia entender por que as outras crianças tinham medo das mavkas. Afinal, elas são tão lindas, tão boas para boas crianças, brincam tão alegremente com elas entre as vegetações da floresta, balançam em galhos longos e finos de bétula (ah, Handzia adorava tanto balançar!) e riem tão alegremente, cantam tão maravilhosamente! Suas vozes, como sinos de prata, soaram mais de uma vez nos sonhos de Handzia, e ela ficou tão feliz em ouvi-los de longe... Mas ela nunca tinha visto com seus próprios olhos. Que tristeza que a mãe não quis levá-la com ela para a floresta hoje! Hoje com certeza veria uma mavka, ah, com certeza!

Afinal, não foi à toa que ela sonhou com mavkas por várias noites, elas cantavam, riam alto, se balançavam nos galhos e o tempo todo a chamavam para elas, para a floresta... – Handzia, u-u! Handzia, u-u! – elas chamaram, atraindo-a para eles com suas mãos brancas. – Venha até nós na floresta! Conosco é tão quentinho, tão divertido, tão amável! Veja que tranças nós temos! – e você terá uma igual! Veja, que balanço nós temos! – e você vai balançar em um! Uau! Uau! Venha, venha!... Handzia chorou. Ela olhou ao redor da casa. Quão carente, úmida, sombria ela é! Os avós estão parados nos cantos – é assustador! Ela se lembrou de um ditado com que costumavam confortá-la quando às vezes ela chorava:

Corre cotia
Na casa da tia
Corre cipó
Na casa da avó
Lencinho na mão
Caiu no chão
Moça bonita do meu coração.

Ela estremeceu e olhou ansiosamente para o teto, no qual um gancho de madeira preto e tosco, estranhamente cravejado, o segurava. Este gancho era um “cipó” em sua imaginação. Ela, deitada na cama, encarou-o mais de uma vez por muito tempo e sempre sentiu um medo secreto; todas as histórias assustadoras que a velha lhe contava, ela entrelaçava com aquele gancho. E agora, numa ansiedade muda, ela começou a olhar para aquele cipó, e quanto mais olhava, mais expressivamente parecia que o cipó estava vivo, que era aquela velha, malvada, e enrugada mulher com um enorme saco, com o qual sequestrava crianças pequenas. Via ela se endireitando, e batendo com suas pernas de pau, se esgueirando e esgueirando cada vez mais chegando mais perto de Handzia!... Handzia gritou assustada e pulou da lareira até o chão. De lá escalou um banco até a janela, onde era mais claro. Ela olhou ao redor na casa – não havia nada. Timidamente, olhou de relance o cipó. Ele não se movia, mas era assustadora a corcunda preta que avançava nele. Mas lá fora, ah, era tanta claridade, tanto calor! Da janela se via a floresta – Ah, lá com certeza as mavkas se balançavam, esperando por ela! Não, ela não vai ficar dentro daquela casa ruim, com aquele cipó malvado! Ela escala pela janela, para fora, e corre para a floresta, por um minutinho, enquanto a mamãe não volta, pra brincar com as mavkas. Mas e se não voltar? Se a mamãe voltar antes, ela vai levar uma surra. Não, a mamãe não vai voltar antes, afinal é só ela ficar pertinho de casa, numa das valas, que vai ver quando a mãe voltar da floresta com cogumelos.

Handzia saiu de casa pela janela. A leve brisa de verão a envolvia em calor, e bagunçava seus cabelos curtos e brancos, como linho, e trazia uma cor viva àquela cara pálida, somente com os olhos queimando com algum fogo febril enquanto corria adiante pelo curral, em direção à floresta. Se ouvia um leve, porém forte, vento fresco em meio a tal calor, e um cheiro inspirador do campo em flor. A cerca estava um pouco inclinada. Handzia não conseguiria tê-la aberto, pois, como suas mãozinhas fracas aguentariam tal fardo! Ela, como um camundongo, escalou através da estreita abertura, que até um gato poderia escalar com sucesso, e, com um sorriso no rosto, e o corpo tremendo, encontrou-se no pasto oposto ao campo. O vento soprava mais afiado em seu rosto. Handzia só estava de camisa, que ia até o quadril e presa com um cinto vermelho. Nos primeiros minutos ela sentia algo similar ao frio. Mas não, era só impressão, pois o Sol aquece, como estaria frio?!...

A meio caminho do campo, segue-se uma trilhazinha estreita até a floresta. Handzia conhece bem essa trilha, nela ela é mais feliz, adora correr. Dela, se vê claramente a floresta! Lá está, grande, sombria e ruidosa! A alma se cativa com a felicidade, que só mais um minutinho correndo, e ela estará na floresta, sozinha!

Ela corre, só que não consegue correr tão rápido quanto antes. O centeio solenemente balança as orelhas, quando ela passa as mãos nas hastes ao correr. Como ela ama aquele centeio, aqueles ancianos, aquela candelária, que vão de pouco em pouco se aproximando, como estrelas roxas e acinzentadas, numa floresta de hastes douradas!...

– Mavka! Mavka! – grita Handzia feliz, correndo pela trilha. – Eu já estou indo, veja só que rápido! Vamos brincar!

Cada vez mais alto e mais expressivo soa a eterna canção da floresta. Handzia a captura com as orelhas, e se entontece com ela. Entre os barulhos e o som das folhas, ela claramente escuta o som de espirros de peixes na água limpa e cristalina: o riso e grito alegre das mavkas. Escuta também como elas a chamam para si.

– Handzia, u-u! Handzia, u-u

Como elas estão próximas! Estão atrás dos barrancos, é claro! As queridas mavkas com certeza foram até ali me procurar! Mas tinham que ter cuidado! Porque se as pessoas as capturassem, colocariam elas num saco, é claro! Deveriam colocar aquele cipó malvado num saco. Mas não, não seria tão bom quanto as mavkas, elas são tão boazinhas, tão bonitas!...

Mavka! Mavka! – grita Handzia, com todas as forças – Eu já estou aqui, já estou indo, espere só mais um pouquinho!

Ah, aqui está a floresta! Que quieta, gigante e sombria! As bétulas se esquentam no Sol, com suas cascas brancas brilhando de longe. Suas vinhas longas pendiam para baixo, como tranças verdes, se balançando com o vento. Aqui, em algum lugar estão as mavkas. A-ha! Com certeza se esconderam de Handzya, mas ela as chama, que correram, e estão rindo em seus esconderijos...

Mavka! Mavka! Eu já estou aqui! Venha, vamos brincar!

Um bosque! Ela ria sozinha, mas como era longe! E viu o segundo, o terceiro! Mas a Handzia sabia que elas não aguentariam muito no esconderijo. Mas que maravilhoso e sonoro era o riso delas! Amavelmente chamam Handzia para si! Aqui é escuro, mas ali é tão claro, tão cheio de ervas, tão bonito, cheiroso!... Lá os balanços são tão leves. Handzia vai encontra-las, afinal não estão tão longe!

* * *

Já anoitecera. A mãe de Handzia já havia há muito voltado para casa depois dos cogumelos e andara pela vila o dia inteiro perguntando por ela. Ninguém a tinha visto. A pobre da mãe, quanto mais perto da noite, mais alarmada ia de casa em casa, mas não havia nem sinal.

– Vejam o meu infortúnio! Quando nasceu era tão mísera e fraquinha, e agora com cada mês que passa, fica com febre um par de vezes! Umas velhas idiotas fizeram a cabeça dela com essas mavkas, e ela fala delas toda a vez, e nos sonhos só mavkas e mavkas! Agora é minha vez de sofrer! Só Deus sabe onde ela foi parar! Ela nunca se acostumou a correr longe, nunca a deixo sair da minha vista...

Mas a Handzia não aparecia de jeito nenhum. À noite, a mãe pediu chorando a algumas pessoas que fossem à floresta procurar. E passou a noite, e não se pôde achar nada. Passou o segundo dia, e Handzia não fora achada. O quanto se esforçava e por onde andava aquela mãe, nem era preciso dizer. Até que no terceiro dia, cortando lenha na floresta, pessoas acharam uma menininha debaixo de uma bétula. Ela deitara, abraçando a bétula com as mãos entrelaçadas. Os olhos abertos já não brilhavam mais, apenas sobrando um sorriso congelado nos lábios. Pelo visto, Handzia tinha acabado de terminar de brincar com a mavka.



sexta-feira, 21 de abril de 2023

Hino Nacional da RSS da Ucrânia

Este é o Hino Nacional da República Socialista Soviética da Ucrânia (Державний гімн Української Радянської Соціалістичної Республіки, Derzhavny himn Ukrainskoi Radianskoi Sotsialistychnoi Respubliky), adotado em 1949 com letra do poeta Pavló Hryhorovych Tychyna e melodia feita por um coletivo de compositores dirigido por Anton Dmytrovych Lebedynets. A primeira versão continha menções ao então governante Stalin, e assim como ocorreu com os outros hinos de RSS, inclusive o da própria URSS, a letra foi reelaborada em 1978 por Mykola Platonovych Bazhan, pra excluir essa e outras menções agora incômodas. O hino vigorou até 1992, ano em que a Ucrânia se tornou um país independente e adotou uma lei deliberando sobre o novo hino. Desde 2015, por força das leis de “descomunização”, a execução pública do antigo hino foi proibida, assim como a ostentação de outros símbolos soviéticos.

O hino da RSS da Ucrânia jamais se tornou amplamente estimado, e conviva lado a lado com muitas outras canções que davam uma identidade nacional-popular. Nos tempos soviéticos, a maioria das manifestações culturais puramente ucranianas era considerada expressão de “nacionalismo burguês”, mas a postura de Moscou pra com elas oscilou muito ao longo das décadas. O teatro, a música e a literatura, por exemplo, floresceram, mas sob os olhares atentos e o controle dos bolcheviques, de forma que a predominância política, científica e diplomática da língua russa se mantinha imune. Eu traduzi direto do ucraniano, que é muito próximo do russo, e legendei o vídeo em português e, pra seu conforto, numa transliteração ucraniana que eu mesmo criei. Seguem o vídeo, a letra em cirílico e a tradução:


1. Живи, Україно, прекрасна і сильна,
В Радянськім Союзі ти щастя знайшла.
Між рівними рівна, між вільними вільна,
Під сонцем свободи, як цвіт розцвіла.

Refrão:
Слава Союзу Радянському, слава!
Слава Вітчизні на віки-віків!
Живи, Україно, радянська державо,
В єдиній родині народів-братів!

2. Нам завжди у битвах за долю народу
Був другом і братом російський народ,
Нас Ленін повів переможним походом
Під прапором Жовтня до світлих висот.

(Refrão)

3. Ми славим трудом Батьківщину могутню,
Утверджуєм правду безсмертних ідей.
У світ комунізму – величне майбутнє –
Нас ленінська партія мудро веде.

(Refrão)

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1. Viva, Ucrânia, belíssima e forte,
Que encontrou a felicidade na União Soviética.
Igual entre iguais, livre entre livres,
Sob o sol da liberdade abriu-se em flor.

Refrão:
Glória à União Soviética, glória!
Glória à Pátria pra todo o sempre!
Viva, Ucrânia, Estado soviético,
Numa família unida de povos irmãos!

2. Nas lutas pelo destino de nosso povo
O povo russo sempre foi amigo e irmão,
Lenin nos conduziu numa marcha vitoriosa
Sob a bandeira de Outubro a luminosas alturas.

(Refrão)

3. Honramos a poderosa Pátria com o esforço,
Afirmamos a verdade de ideias imortais.
Ao mundo comunista, um imponente futuro,
O partido leninista nos conduz sabiamente.

(Refrão)



quinta-feira, 1 de dezembro de 2022

Bayraktar (música militar ucraniana)


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/bayraktar


Esta canção composta pelo ex-coronel do Exército, produtor, letrista, músico e cantor ucraniano Tarás Borovók foi lançada logo após o início da invasão russa à Ucrânia e se tornou um grande sucesso entre os ucranianos e aqueles que estão se engajando diretamente na guerra. Ela se chama “Байрактар” (Bayraktar) e alude a um tipo de drone turco que tem sido fundamental pra destruir posições russas nos territórios ocupados e pra impedir a tomada completa de Kyiv. Apesar da ampla repercussão, só no último dia 28 eu soube de sua existência, ao escutar uma reportagem da BBC britânica. Curiosamente, o ditador turco Recep Tayyip Erdoğan faz jogo duplo, e ao mesmo tempo em que ajuda militarmente a Ucrânia, não aderiu às sanções ocidentais contra a Rússia, com quem mantém antigas relações comerciais e cujos cidadãos usam muito a Turquia como destino turístico ou até de refúgio político.

A primeira versão em vídeo, citada acima, foi lançada em 28 de fevereiro de 2022, apenas quatro dias após o início da invasão, e enquanto isso Borovok carregou outras versões, como este remix (o vídeo mais visto do canal), o áudio oficial e um clipe legendado em inglês, com cenas do Bayraktar atingindo tropas russas. Porém, tanto esse clipe quanto esta montagem feita pela compositora francesa Lisa Schettner, em cujas descrições estão traduções literais em inglês levemente diferentes que me ajudaram muito a traduzir pro português, estão classificados como proibidos pra menores e, portanto, só podem ser vistos por quem está logado no YouTube. Portanto, por praticidade, incorporei pra você ouvir mais rápido apenas a segunda e terceira versões, mas se possível, não deixe de visitar as outras! No quarto link que listei, há também na descrição uma versão poética inglesa feita por uma colaboradora, vale a pena dar uma olhada.

A Istoé Dinheiro também fez uma ótima reportagem sobre a história da canção Bayraktar, e neste canal há uma entrevista com Borovok, mas em ucraniano. Eu mesmo traduzi pro português a partir do ucraniano, mas as duas traduções em inglês me ajudaram demais, sobretudo com pontos que não puderam ser literalmente traduzidos e esclarecimentos dados nos próprios canais. Uma dessas expressões era “tomar sopa com lápti”, sendo lápti o plural de lápot, isto é, uma espécie de alpargata ou espadrilha, também típica de países não eslavos, feita com fibras vegetais de árvores nativas. A expressão original da língua russa menciona o schi, uma sopa típica de beterraba e couve, muito consumida pelos camponeses pobres, e tanto tomar o schi quanto usar lapti aludem a uma condição muito pobre, em que nem colher se teria pra tomar a sopa, tendo que usar essas sapatilhas! (Deixei “sapatos” mesmo porque figura melhor do que aquele calçado.)

Entre outras explicações pra expressões intraduzíveis, “restaurarem um grande país” está no cirílico ucraniano figurando a pronúncia russa dessa expressão, por isso pus as aspas pra indicar que era a fala do Kremlin. “Putleristas” foi minha adaptação pra “rashisty”, ou seja, uma mistura de “rússkie” (russos) com “fashísty” (fascistas), pois o apelido “Putler” (Putin + Hitler) também é muito difundido entre os ucranianos. Na penúltima estrofe, também se menciona o “glukhár”, ave galiforme só existente no hemisfério Norte e chamada em português “tetraz-grande”, mas que na gíria ucraniana também designa um crime cuja investigação provavelmente não terá sucesso.

O título da canção se refere ao drone militar Bayraktar TB2, fabricado pela empresa privada turca Baykar e que a Ucrânia tem usado massivamente e com grande sucesso na defesa contra a Rússia. Em turco, “bayraktar” significa “porta-bandeira” ou “porta-estandarte”, mas a referência é ao sobrenome de Selçuk Bayraktar (n. 1979), um dos engenheiros que desenvolveu a primeira linha de drones nativos turcos, na qual se inclui o citado Bayraktar TB2. Assim, ao lado de Orkut Büyükkökten, temos o segundo turco cujo sobrenome ficou mundialmente famoso devido a um invento pessoal. Curiosamente, Selçuk também é casado com Sümeyye, uma das filhas do ditador Erdoğan, que usou a criação do genro pra matar curdos na Turquia, no Iraque e na Síria, bem como a vendeu pros governos do Azerbaijão e da Etiópia em guerras recentes.

Quanto a Tarás Borovok, ele nasceu na Kyiv soviética em 1973 e começou sua carreira midiática em 2006, após deixar o Exército Ucraniano. A fama global só veio quando começou a trabalhar com canções patrióticas a pedido do Centro de Comunicação do exército após a agressão russa, sendo a proposta inicial com o Bayraktar TB2 apenas um vídeo de propaganda. Mas Borovok decidiu fazer uma canção em estilo folk a respeito, que saiu em duas horas (a letra em 15 ou 20 minutos) e se tornou um hit imediato, pela batidinha envolvente e pelo tom depreciativo com que trata os russos e seu exército. Bayraktar também rodou o mundo em outras línguas, tendo ficado conhecida na França pela colaboração com a citada Lisa Schettner. Casado, Borovok também é pai de Daria (n. 1998) e de Ostap (n. 2016).

Sem mais, seguem os vídeos de Borovok, minha tradução e o original ucraniano. Ótima forma de começar o último mês deste terrível ano de 2022!




Os ocupantes vieram até nós na Ucrânia
Com uniforme novinho e veículos militares
Mas o estoque deles derreteu um pouco
Bayraktar, Bayraktar...

Os tanquistas russos se esconderam nas moitas
Pra tomarem sua droga de sopa nos sapatos
Mas a água da sopa ferveu um pouco demais
Bayraktar, Bayraktar...

As ovelhas correram do Leste até nós
Pra “restaurarem um grande país”
O melhor pastor de rebanhos ovinos é o
Bayraktar, Bayraktar...

Argumentam que suas armas são diferentes
Os foguetes são poderosos, os veículos de ferro
Nossa única resposta a esses argumentos é
Bayraktar, Bayraktar...

Eles queriam nos capturar imediatamente
E nos seguramos pra não xingar os ogros
Ele transforma bandidos russos em fantasmas:
Bayraktar, Bayraktar...

A polícia russa está conduzindo inquéritos,
Mas nunca vai saber quem matou os putleristas
O caso é que há crimes sem solução entre nós
Bayraktar, Bayraktar...

Os doentes do Kremlin fazem uma propaganda
E o povo engole as palavras da propaganda
Agora o tsar deles conhece uma nova palavra:
Bayraktar, Bayraktar...

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Прийшли окупанти до нас в Україну
Форма новенька, воєнні машини
Та трохи поплавився їх інвентар
Байрактар, Байрактар...

Російскі танкісти сховались в кущі
Щоб лаптьом посьорбати довбані щі
Та трохи у щах перегрівся навар
Байрактар, Байрактар...

Зі сходу припхались до нас барани
Для “вастанавлєнья велікай страни”
Найкращій пастух баранячих отар
Байрактар, Байрактар...

Їх доводи - всяке озброєня різне
Ракети потужні, машини залізні
У нас на всі доводи є коментар
Байрактар, Байрактар...

Вони захопити хотіли нас зразу
І ми зачаїли на орків образу
З бандитів російських робить примар
Байрактар, Байрактар...

Російська поліція справи заводить
Та вбивцю рашистів ніяк не знаходить
Хто ж винен, що в нашому полі глухар
Байрактар, Байрактар...

Веде пропаганду кремлівський урод
Слова пропаганди ковтає народ
Тепер нове слово знає їх цар
Байрактар, Байрактар...