Pra nos lembrarmos dos 30 anos do fim da União Soviética, que serão completados no dia 25 de dezembro de 2021, estou trazendo algumas matérias do Jornal Nacional que achei por acaso, enquanto procurava outros vídeos históricos. Alguns vídeos são do YouTube, outros do próprio site do Globoplay, de cuja seção de jornalismo eu consegui craquear algumas pérolas pra lá de históricas.
A razão pra eu ter feito esta postagem, além do próprio aniversário redondo desses importantes eventos, foi que eu queria ter um suporte pros referidos vídeos, já que originalmente eu os tinha postado no antigo canal Pan-Eslavo Brasil, do YouTube, que foi, porém, derrubado pelo Google em agosto de 2021. Infelizmente, por eu não ter feito o backup de algumas informações antes que ocorresse esse incidente, não pude indicar de novo o endereço original de alguns dos vídeos.
Não repostei nem incorporei aqui a famosa reportagem de Pedro Bial falando de Moscou, quando Mikhail Gorbachov deixou a presidência da URSS (fato que selou a dissolução da União), porque ela pode ser facilmente encontrada no YouTube. Porém, há muitos anos já postei aqui o célebre discurso de renúncia nas versões escrita e legendada. Após cada vídeo, seguem também as descrições reconstituídas ou originais que podiam ser lidas no Pan-Eslavo Brasil.
Quem na prática governava a URSS desde Stalin era o secretário-geral do Partido Comunista único, embora nunca houvesse uma lei a respeito. Gorbachov assumiu o posto em 11 de março de 1985, e em 1.º de outubro de 1988 passou a acumular a liderança do Soviete Supremo (parlamento), renunciando ao segundo em 15 de março de 1990. Nesse mesmo dia, assumiu o recém-criado posto de “presidente da União Soviética”, que absorveu parte das funções da chefia parlamentar e deveria comportar o chefe de Estado.
Gorbachov só renunciou à liderança do partido em 24 de agosto de 1991, pouco antes da organização ser suspensa após a tentativa de golpe de Estado, e no Natal passaria a presidência da URSS a Boris Ieltsin, presidente da Rússia eleito em 1990. Com as independências nacionais das repúblicas gradualmente proclamadas, o cargo perdia sua razão de ser.
Gorbachov diz que pode renunciar se as reformas falharem (Jornal Nacional, 4 de julho de 1990)
O então presidente da antiga União Soviética, Mikhail Gorbachov, disse no dia 4 de julho de 1990 que se as reformas econômicas em curso, batizadas de “perestroika” (reconstrução, reestruturação), não dessem certo, ele poderia renunciar ao cargo. Era uma espécie de chantagem emocional contra os “conservadores”, que ainda estavam pesando nas decisões do último congresso do PCUS, o partido único. Foi profético: a URSS se dissolveu, a economia foi pro saco e ele renunciou no Natal de 1991.
Em maio de 2021 eu assisti no YouTube à íntegra do Jornal Nacional daquele dia, e encontrei a referida matéria por acaso. Além da chamada no bloco inicial, deixei uma cômica referência ao Maradona no final (que era o final daquele bloco), hehehe. Na época, Cid Moreira e Sérgio Chapelin ainda apresentavam em épica dupla, e Sílio Boccanera fazia a cobertura de Moscou. Este repórter tinha ficado famoso após cobrir a queda do Muro de Berlim em 1989 e ser filmado na célebre reportagem em cima da obra, em ângulo de aproximação gradual. Após 31 anos de serviço, Boccanera se aposentaria em 2019.
Mikhail Gorbachov sofre tentativa de golpe de Estado na URSS (Jornal Nacional, 19 de agosto de 1991)
Mikhail Gorbachov foi eleito secretário-geral do Partido Comunista da União Soviética em 1985, assumindo, portanto, o comando efetivo da superpotência comunista. Porém, ele mesmo criou logo depois o cargo de “presidente da URSS”, que o próprio também ocupou, como forma de separar o partido único do aparelho de Estado. Altamente impopular e com um governo desgastado pela saída militar do Afeganistão, pelas privatizações corruptas, pela perda do bloco comunista na Europa Oriental, pelo fracasso das reformas estruturais e pelo colapso econômico, Gorbachov sofreu uma tentativa de golpe militar da chamada “linha dura” do PCUS, mais ligada às antigas práticas.
Em 19 de agosto de 1991, ele estava tirando férias na península da Crimeia (hoje parte da Ucrânia, mas ocupada pela Rússia desde 2014), quando uma parte opositora das Forças Armadas tomou os principais prédios públicos de Moscou, encontrando, porém, resistência popular. Essa resistência ao golpe, que visava retroceder em todas as reformas liberalizantes instauradas por Gorbachov, foi comandada do parlamento da RSFS da Rússia pelo presidente russo eleito no ano anterior, Boris Ieltsin. Ocidentalizante e liberal, ele tinha rompido com Gorbachov e agora protagonizava o combate ao comunismo e às velhas práticas.
Naquela madrugada, o parlamento foi bombardeado e severamente avariado, e a população estava sob toque de recolher, mesmo não o respeitando plenamente. Ainda noite no Brasil, o Jornal Nacional com os lendários Cid Moreira e Sérgio Chapelin informava que, na falta de informações exatas, dizia-se que Gorbachov tinha sido levado dos balneários da Crimeia a um local desconhecido, ou mesmo a Moscou. Como saberíamos depois, o golpe fracassou e Gorbachov retomaria suas funções, renunciando ao cargo de secretário-geral e, finalmente, ao de presidente da URSS em 25 de dezembro, data que ficou marcada como a dissolução efetiva da União. Ieltsin promulgaria a constituição da Federação Russa em 1993 (alterada em meados de 2021 por emendas propostas por Vladimir Putin), e seria reeleito presidente em 1996, mas não impediria, naquela década, de levar a Rússia a um abismo muito maior.
Como correspondente especial em Moscou, usando o velho telefone fixo, num tempo em que a popularização da internet (então já inventada) ainda era um sonho, falava Pedro Bial, ex-apresentador do BBB antes de Tiago Leifert e atual apresentador, ainda na Globo, do programa Conversa com Bial.
Gorbachov nos 25 anos da queda do muro (Berlim, Jornal da Globo, 7 de novembro de 2014)
Reportagem do Jornal da Globo apresentada pelo ex-global William Waack em 7 de novembro de 2014 mostra Mikhail Gorbachov participando da celebração dos 25 anos da queda do Muro de Berlim, na capital da Alemanha hoje unificada. O último dirigente da União Soviética (como secretário-geral do Partido Comunista e como seu único “presidente”) teve um papel fundamental no fim da chamada “guerra fria” e do antigo bloco comunista da Europa, mas deixou seu país falido e desorganizado.
Admirado, contudo, como um grande líder pela comunidade internacional, participou então do aniversário, deixando a marca de suas mãos no Checkpoint Charlie, o mais famoso posto de fronteira entre as duas Alemanhas. De 1949 a 1989, o país foi dividido pelas potências vencedoras da 2.ª Guerra Mundial em um lado ocidental (capitalista) e outro oriental (comunista), sendo Berlim, encravada no lado comunista, também dividida em duas. A fuga de pessoal qualificado do lado oriental levou o então líder comunista Walter Ulbricht, com a anuência do soviético Nikita Khruschov, a construir em 1961 um grande muro de concreto, cheio de postos de vigia armados, cortando as duas partes de Berlim.
O muro se tornou na “guerra fria” um símbolo infame da hostilidade e ruptura entre os dois blocos mundiais, mas terminou sendo retirado pela pressão popular, em 1989, durante protestos sociais que sucederam a comemoração dos 40 anos da Alemanha comunista. Evento inesperado que levou abaixo os já terminais regimes comunistas vizinhos, escapou ao controle de Gorbachov, que teve de ver passivo a reunificação das Alemanhas em 1990 e a dissolução da própria URSS em 1991.
Após sua renúncia, Gorbachov nunca mais ocupou cargos públicos, tendo recebido uma votação irrisória como candidato à presidência da Rússia em 1996. O próprio William Waack, mesmo sendo jornalista, escreveu vários livros sobre partidos e regimes comunistas, sendo o mais famoso deles Camaradas, com uso pioneiro, embora ilegal, da documentação da Comintern em Moscou no início dos anos 90.