quinta-feira, 23 de dezembro de 2021

Treze dias em que a URSS quase voltou


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“Todo o poder aos sovietes”... Só que não?


Não sei se foi algum visitante do antigo canal Pan-Eslavo Brasil que me recomendou este vídeo, mas quando o vi na íntegra e descobri seu potencial, decidi baixá-lo, editar o quadro e o áudio e postar sem tradução ou legendas, já que a maior parte são apenas imagens e uma boa parte é falada em inglês por repórteres. Segundo o dono do canal original, trata-se de cenas da crise constitucional na Rússia em 1993, conflito geral desencadeado entre 21 de setembro e 4 de outubro, quando o Soviete Supremo da Rússia e o Congresso dos Deputados do Povo decidiram opor-se às políticas de austeridade e desmonte estatal levadas a cabo pelo presidente pós-soviético Bóris Iéltsin. A edição, obviamente, com informações escritas no começo e no fim, ressalta a propaganda anticapitalista e pró-URSS, mas aqui deixei apenas o material com estas explicações históricas, pra você refletir.

Aquelas duas casas legislativas, herança dos tempos comunistas, ainda existiam em 1993, e em meio à devastação econômica e social provocada pela “terapia de choque” neoliberal sob o comando de Ieltsin e o FMI, começaram a se opor aos projetos de reforma constitucional e às medidas econômicas. O presidente desejou dissolver o legislativo, embora não lhe coubesse essa competência, e os deputados tentaram depô-lo (impeachment), colocando no lugar o vice-presidente Aleksándr Rutskói.

Se em 1991 o povo apoiou Gorbachóv e Ieltsin contra a tentativa de golpe da “linha-dura”, em 1993 o povo que protestava contra a miséria foi duramente reprimido pela polícia, enquanto o exército bombardeava o prédio do Parlamento (a “Casa Branca”) e quebrava a resistência dos legisladores. Em meio aos combates de rua mais letais em Moscou desde as revoluções de 1917 e a prisões em massa, Ieltsin terminou ganhando e conduzindo a adoção da nova Constituição da Federação Russa em 12 de dezembro de 1993. Ela consolidou o atual regime bicameral com a Duma de Estado e o Conselho da Federação, além de maiores poderes ao presidente.

O que indigna, contudo, é a brutalidade com que a população em protesto foi tratada pelo exército e pela polícia. Na primeira parte, vemos o início dos choques, com o povo chegando perto do Parlamento e as primeiras brigas com policiais. Na segunda parte, com ampla cobertura internacional, sobretudo de TVs americanas, vemos soldados atirando nos manifestantes com balas de verdade, assim aumentando ainda mais a letalidade da “resistência” governamental. E no fim, seguem-se as passeatas pacíficas do povo (não sei se durante ou depois da crise), com a ostentação de inúmeros símbolos da antiga URSS, como a foice-e-martelo e a bandeira nacional vermelha.

Na Rússia (as outras velhas RSS fizeram referendos em que o povo aprovou a independência), um referendo realizado em 1991 teve mais de 70% dos votos contra a dissolução da União Soviética, mas o resultado foi solenemente ignorado por Ieltsin e Gorbachov. As reformas iniciadas em 1992 levaram a uma inflação de 2600% naquele ano, e a queda no PIB chegou a estas cifras: -3% (1990), -5% (1991), -14,5% (1992), -8,7% (1993) e -12,7% (1994). Nos anos 90, criminalidade e corrupção dispararam, o serviço de saúde desmoronou e a expectativa de vida despencou.