sexta-feira, 1 de março de 2024

FUNERAL DE NAVALNY: vídeos e fotos


Link curto pra esta publicação: fishuk.cc/navalny

O advogado e político russo Alekséi Naválny, principal figura de oposição à ditadura de Vladimir Putin desde o fim da década de 2000, foi velado hoje em (quase) extremo segredo na Igreja do Ícone da Mãe de Deus, localizada no distrito (raión) de Márino da captal Moscou, onde ele viveu a maior parte de sua vida. Preso várias vezes durante protestos ao longo dos anos, Navalny foi vítima de um envenenamento em 2020, em pleno avião que fazia um voo interno, e após um pouso de emergência ele foi transferido pra Alemanha, onde recebeu tratamento médico. Mesmo sabendo dos riscos de ser preso em mais um dos processos-farsa forjado pelo Kremlin, ele voltou com a família pra Rússia em fevereiro de 2021, e desde então foi transferido de colônia penal em colônia penal, pra que ficasse cada vez mais distante do resto do mundo e tivesse suas condições de detenção pioradas.

Falamos em “colônia penal”, mas o sistema de detenção não mudou muito desde os infames tempos do GULAG de Stalin, isto é, a “administração estatal dos campos” de detenção e trabalhos forçados. A diferença é que, ao contrário da era socialista, atualmente os presos não constituíam uma grande massa de mão-de-obra barata, praticamente escrava, pra construir as grandes obras de infraestrutura da industrialização acelerada. (E se algum maconheiro cabeludo das Humanas te disser que “eram apenas campos de reeducação pelo trabalho”, não acredite: “reinserir na sociedade” os “inimigos do povo” não estava nos planos dos bolcheviques, até porque o próprio Adolfinho dizia que “O trabalho liberta”...) Sua “última morada” foi a colônia penal do vilarejo de Kharp, no extremo norte da Rússia, além do Círculo Polar Ártico, reservada apenas pra estupradores, assassinos e outros criminosos comuns perigosos. Mesmo se admitíssemos que Navalny foi vítima de algum escândalo de corrupção, jamais seria o caso de o mandar pra esse fim de mundo, algo feito especialmente pra piorar suas já frágeis condições de saúde.

Em 15 de fevereiro, numa das audiências por vídeos com seus algozes, o político demonstrou bom humor, disposição (o quanto estava disfarçando, não posso dizer) e até brincou com o juiz, pedindo pra que dividisse com ele um pouco de seu “enorme salário federal”, pois ele estava sem nada na cadeia. Os próprios funcionários na corte chegaram a rir quando Navalny se despediu, mas no dia seguinte a administração da colônia de Kharp anunciou seu falecimento, algo que os observadores já vinham esperando, mas não tão subitamente, dada a tortura praticamente constante, inclusive psicológica, a que era submetido. Putin chegou até a participar de um evento com jovens no dia 16, antes do qual ele foi avisado do ocorrido por assessores, e justamente durante a palestra fez brincadeiras e deu risada (não de Navalny, claro, mas certamente a notícia elevou seu humor sádico e psicopata). As causas da morte mudaram diversas vezes, e as autoridades quase se recusaram a entregar o corpo à mãe de Navalny, Liudmila (a esposa Iulia, que quer retomar o combate do marido, e seu casal de filhos está exilada na Europa, sempre mudando e nunca revelando o local de residência), a qual, porém, após intensa luta, conseguiu o recuperar e combinar um enterro conforme à fé cristã ortodoxa.

Entre as hipóteses aventadas pelos especialistas, haveria uma negociação em curso, mediada pelo empresário exilado Román Abrámovich, entre as autoridades russas e alemãs pra que Navalny e mais dois jornalistas acusados de “espionagem” fossem “trocados” por um agente do Kremlin que cumpria prisão perpétua na Alemanha por ter matado em plena Berlim um guerrilheiro pela independência da Chechênia. Porém, ao saber que Navalny estaria incluído na “troca”, Putin, que o odeia de forma obsessivamente pessoal e sequer pronuncia seu nome em público, teria ordenado o assassinato, cujo encobrimento, em tais circunstâncias, é uma especialidade desde os tempos de Stalin. A máquina ditatorial vive afirmando que o opositor era “fraco” e “pouco influente”, mas o que justificaria tamanha reclusão do mundo, tamanha demora em dar satisfações sobre a morte e tamanho medo de permitir um funeral público – e ainda por cima com um policiamento desproporcional ao “perigo” – pouco antes das eleições que já se consideram “ganhas” por Putin? Por mais reservas que muitos têm às opiniões de Navalny, e por mais fragmentada que esteja a oposição russa no exterior (os outros políticos mais fortes também estão presos), acontece que ele era o único com potencial pra tirar o genocida do Kremlin, e por isso, gradualmente, quando mais Putin temia as consequências de não estar blindado pelo poder, mais ele apertava o cerco ao “insignificante”. Por isso, o destino de Navalny diz muito menos sobre ele mesmo do que sobre a distopia em que se transformou a Rússia pós-Ieltsin.

Os funerais foram permitidos, mas abertos apenas a familiares, alguns poucos conhecidos e poucos visitantes. Mesmo assim, algumas imagens puderam ser feitas (dentro e fora da igreja), uma fila imensa se formou até o templo e muitos populares se reuniram pra gritar “Navalny! Navalny!”, “Não devemos ter medo!” ou “Não à guerra!”. Quando o carro com o caixão saiu pra (aí sim) “última morada”, os populares também jogaram rosas sobre o veículo. O começo da cerimônia foi às 15h de Moscou, 8h de Brasília, e quando esta publicação foi ao ar, Navalny já tinha sido enterrado no Cemitério Borísov, a poucos metros da igreja.

Já existem algumas informações sobre os funerais nos principais portais de notícias em português, como CNN Brasil, Euronews Portugal e Agência Brasil, mas por serem esparsas, e como ainda não há nada em nossa língua publicado no YouTube (pelo menos por volta do meio-dia desta sexta-feira), estou acompanhando a cobertura completa feita pela TV Rain, atualmente sediada em Amsterdã, e que está se valendo de importantes contribuições discretas mandadas por testemunhas locais. Seguem algumas mídias separadas (fotos e vídeos) que eu mesmo selecionei ou mesmo “printei” dos próprios vídeos: espalhem, pois certamente a desinformação pró-Putin já está comendo solta na Banânia!

Veja também parte da playlist dedicada à carreira de Navalny, do canal independente Sotavision, com as filmagens desse dia histórico que foram a fonte pra maioria das mídias do mundo.



Pais de Navalny chegam à igreja chorando.



Interior da igreja. Sentado bem à esquerda, o pai de Navalny com uma jaqueta com detalhes vermelhos, e a seu lado, toda de preto, de óculos e segurando uma vela, a mãe de Navalny.



Caixão de Navalny chega à igreja (fonte: Associated Press).



Caixão de Navalny chega e entra na igreja; vista aérea (fonte: TV Rain).



Entrada gradual de populares no funeral de Navalny, na Igreja do Ícone da Mãe de Deus (fonte: TV Rain).



Cenas da parte religiosa do velório, no interior da igreja no distrito de Marino (fonte: TV Rain).



Populares gritam: “A Rússia vai ser livre!” e “Navalny, Navalny!” (fonte: TV Rain).



Populares gritam: “Ele não teve medo, e nós não temos medo!” (fonte: TV Rain).



Populares gritam: “Não vamos perdoar, não vamos perdoar!” (fonte: TV Rain).



Populares cumprimentam e abraçam a mãe de Navalny (de preto e de óculos) dizendo: “Obrigado! Obrigado por seu filho!” (fonte: TV Rain).



Chegada do corpo e início da cerimônia no Cemitério de Borisov (parte do vídeo está sem som, que é apenas a música). Em dado momento, pode ser vista a mãe de Navalny, e no fim do vídeo aparece uma grande afluência de pessoas chegando de metrô (fonte: TV Rain).



Preparando o buraco; desculpe, não resisti ao trocadilho, rs (fonte: TV Rain).



Caixão começa a ser preparado pra sepultura sob os gritos de “Não à guerra, não à guerra” (fonte: TV Rain).



Desolada, mas impassiva como toda mamushka soviética, mãe de Navalny assiste à cobertura da cova, enquanto anoitece em Moscou; o vídeo tem mais de 14 minutos (fonte: TV Rain).

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