domingo, 27 de novembro de 2022

Fim da pena de morte na Rússia (1917)


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Este é o quarto texto que traduzi pra coletânea Manifestos vermelhos e outros textos históricos da Revolução Russa (Penguin Companhia, 2017), organizada pelo professor Daniel Aarão Reis por ocasião dos 100 anos dos eventos na Rússia em 1917, mas que não foi incluído na publicação. Trata-se de um editorial da revista Níva, a maior e mais popular publicação ilustrada de variedades que circulou na Rússia do fim de 1869 até setembro de 1918, quando foi interditada pelos bolcheviques. Ela foi lançada pelo imigrante alemão que curiosamente se chamava Adolf Marx, mas aparentemente não tinha parentesco com nosso conhecido Karl Friedrich (de fato, é um sobrenome muito comum, tem Marx até no Brasil), e após sua morte, a publicação foi continuada pelo comprador de sua editora.

Niva atingia públicos muito variados, sendo pioneira em seu gênero na Rússia imperial, e sua pretensão inicial era ser uma espécie de entretenimento leve e apolítico pra toda a família. Mas com o tempo, se tornou um grande vetor da cultura erudita, inclusive de clássicos da literatura, e muitos escritores famosos também contribuíram com textos pra revista. Apesar de seu denso conteúdo, era zombada pelos intelectuais urbanos como uma distração das classes menos letradas ou pouco engajadas, as quais, porém, nem sempre se aprofundavam no conteúdo de Niva. Eu mesmo traduzi o texto, e ele segue abaixo junto com o curto original:


Abolição da pena de morte
Editorial da revista Niva. Março de 1917

Foi realizada uma das mais importantes reformas: a abolição da pena de morte...

Tal devoção ao ideal da liberdade, da lei suprema do amor ao próximo, não tem paralelo na incrível história das revoluções nos países europeus...

À 01h08min do dia 8 de março, o ministro da Justiça A. F. Kerenski assinou o decreto do Conselho de Ministros abolindo para sempre a pena de morte na Rússia. O decreto que extingue a pena capital percorreu todas as instâncias com excepcional rapidez e responde a uma exigência do momento.

Por proposta do ministro da Justiça, o projeto de lei foi elaborado com pressa, ficando sua redação a cargo de um catedrático de direito penal que se instalou nas dependências do Ministério da Justiça durante a elaboração do texto. O decreto se distingue pela extraordinária brevidade e consiste de três pontos, prevendo a abolição da pena de morte não apenas nos tribunais civis e militares, mas também em todos os tribunais de exceção, como as cortes marciais que atuam no front durante a guerra.

Às 4 horas da tarde de 8 de março, o decreto que extingue a pena de morte foi enviado pelo Ministério da Justiça para publicação, tendo o ministro da Justiça A. F. Kerenski, ao promulgar esse histórico documento, assim se dirigido em prantos aos presentes: “Que fortuna a minha receber o encargo de assinar o édito abolindo para sempre a pena de morte na Rússia”.

Niva. 1917. Março. N.º 12.


Отмена смертной казни
Передовая статья в журнале «Нива». Март 1917

Исполнилась одна из крупнейших реформ – отмена смертной казни…

Такой верности идеалу свободы – высшего закона любви к ближнему нет примера в мировой истории революций европейских стран…

8-го марта, в 1 час 8 мин. министр юстиции А.Ф.Керенский скрепил декрет Совета Министров об отмене навсегда в России смертной казни. Декрет об отмене смертной казни прошел все инстанции с исключительной быстротой и вызван требованием момента.

По предложению министра юстиции, законопроект был спешно разработан, причем редакция его была поручена профессору уголовного права, находившемуся во время разработки законопроекта в помещении министерства юстиции. Декрет отличается необычайной краткостью и состоит из трех пунктов. Он предусматривает отмену смертной казни в судах не только гражданских и военных, но и во всяких исключительных судах, как военно-полевых, действующих на фронте во время войны.

В 4 часа дня 8-го марта декрет об отмене смертной казни был отправлен из министерства юстиции для распубликования, причем министр юстиции А.Ф.Керенский, передавая этот исторический документ, обратился к окружающим со слезами на глазах и сказал: «Я счастлив, что мне выпало на долю подписать указ об отмене смертной казни в России навсегда».

Нива. 1917. Март. № 12.