sexta-feira, 22 de março de 2019

Tito e Fidel, comunistas dos anos 1960


Link curto para esta postagem: fishuk.cc/comunas60


Estes dois vídeos meus na TV Eslavo (YouTube) foram iniciativas de postagem isoladas, por isso não se encaixavam a princípio num tema comum que pudesse ser transformado num texto desta página. Mas sendo filmagens com dois líderes destacados do movimento comunista no início dos anos 1960, achei que valia a pena apresentá-los juntos aqui. Nessa década, o movimento comunista chegaria ao auge de seu prestígio, e as lutas anticoloniais e de libertação nacional, apoiadas ainda pelos chamados “países não alinhados”, constituiriam um novo campo fértil pra experiências políticas vindas de Moscou.

Contudo, a partir do fim da década, sobretudo depois da intervenção contra as reformas na Tchecoslováquia em 1968, a popularidade do comunismo soviético caiu gradualmente. Desde o mesmo ano, com as explosões de revolta juvenil em Paris e outras capitais ocidentais, o maoismo chinês parecia ser uma nova alternativa, mas ele também logo se revelaria autoritário e dogmático. Tito, da antiga Iugoslávia, tinha ganhado prestígio como chefe da resistência antifascista nos Bálcãs, mas sua experiência já estava fortemente institucional. Fidel Castro, de Cuba, gozava da aura jovem que passava a maioria dos líderes de sua revolução, e ainda hoje exerce razoável fascínio nas esquerdas latino-americanas. Mas o experimento real do socialismo cubano perdeu grande parte da atratividade, pois as lideranças não se renovaram, Fidel morreu em 2016 e as presentes reformas convivem com estagnação e pobreza.



O primeiro vídeo é um trecho de documentário soviético que eu mesmo já traduzi e legendei, contando a visita de Fidel Castro Ruz, líder de Cuba, a Moscou e outras localidades da URSS em 1963. Comandante da Revolução Cubana de 1959, ele está fazendo o encerramento do discurso aberto ao público em 28 de abril, na tribuna do mausoléu de Lenin na Praça Vermelha. Parece que só existe uma cópia sem legendas da cinecrônica inteira no YouTube, postada por alguém que fala espanhol e ainda com poucas visualizações.

Na montagem que eu fiz, vocês podem escutar o discurso três vezes, com legendas em português, espanhol (língua original) e russo. Nesta edição em PDF do jornal soviético Krasnoe znamia podem-se ler os discursos completos de Nikita Khruschov e Fidel Castro em russo. Como o que foi dito durante a interpretação consecutiva não é idêntico ao que foi transcrito no jornal, segue o texto em russo, com algumas divergências entre colchetes:

“Позвольте мне от полноты чувств [как самое справедливое выражение моих чувств] [в честь того, кто больше был достоин] воскликнуть – слава Ленину! Да здравствует пролетарский интернационализм! Да здравствует дружба между кубинским и советским народами! Да здравствует Советский Союз! Родина или смерть! Мы победим!”

(Permitam-me, como a mais justa homenagem a quem teve o mérito maior, exclamar: Viva Lenin! Viva o internacionalismo proletário! Viva a amizade entre o povo soviético e o povo cubano! Viva a União Soviética! Pátria ou morte! Venceremos!)



O segundo vídeo são breves frases de um famoso discurso público de Josip Broz, o Marechal Tito, presidente da Iugoslávia socialista, feito na cidade croata de Split, em 7 de maio de 1962. Um vídeo com os principais trechos do discurso está há mais de 10 anos no YouTube, mas nunca achei a transcrição da fala. Mesmo tendo estudado um pouco de servo-croata por algum tempo, ainda não me sinto capaz de transcrever só de ouvido, até porque às vezes o líder fala meio rápido.

Só sei que na Biblioteca de Belgrado há um exemplar, não disponível online, desse discurso completo em Split, e certamente sem grandes alterações. Após algum esforço, consegui achar apenas a transcrição da segunda parte deste vídeo, cujo editor felizmente lhe melhorou a qualidade. São dois trechos isolados, usuais em sites de citações. O grande problema foi que, assim como outros trechos do discurso, não consegui achar nem mesmo o que Tito fala na primeira parte.

Comparando com várias fontes e com o áudio de Tito, eu mesmo fiz uma transcrição fixa, traduzi, legendei e cortei o quadro e alguns trechos do upload citado, cujo canal recomendo que vocês visitem com mais atenção. Ao final, Druže Tito, mi ti se kunemo (Camarada Tito, somos fiéis/leais a você) era uma espécie de refrão popular cantado na época da ditadura, sob diferentes versões. Seguem o texto em servo-croata (alfabetos latino e cirílico) e as traduções em português e francês (esta feita pra um grupo de debates):

“Mi smo more krvi prolili za bratstvo i jedinstvo naših naroda. E nećemo nikome¹ dozvol’ti da nam dira ili da nam ruje iznutra, da se ruši to bratstvo i jedinstvo. [...] Ni jedna naša republika ne bi bila niko i ništa, da nismo svi zajedno! A mi moramo stvarati... a mi moramo stvarati svoju istoriju, svoju jugoslavensku² socijalističku istoriju i jedinstvenu ubuduće.”

¹ Forma mais comum: “nikomu”.
² Forma mais comum: “jugoslovensku”.

“Ми смо море крви пролили за братство и јединство наших народа. Е нећемо никоме дозвол’ти да нам дира или да нам рује изнутра, да се руши то братство и јединство. [...] Ни једна наша република не би била нико и ништа, да нисмо сви заједно! А ми морамо стварати... а ми морамо стварати своју историју, своју југославенску социјалистичку историју и јединствену убудуће.”

(Derramamos um mar de sangue pela fraternidade e unidade de nossos povos. E não permitiremos que ninguém nos ataque, nem conspire de dentro, nem destrua essa fraternidade e unidade. [...] Nenhuma república nossa seria algo ou alguém se não estivéssemos todos juntos. E devemos escrever... e devemos escrever nossa própria história, nossa própria história socialista iugoslava e unida para o futuro.)

(Nous avons versé une mer de sang pour la fraternité et l’unité de nos peuples. Nous ne permettrons pas que personne ne nous attaque, conspire de dedans, détruise notre fraternité et unité. Aucune république à nous ne serait rien si nous n’étions pas tous ensemble. Nous devons créer notre propre histoire socialiste yougoslave et unie pour l’avenir.)