Devo sempre lembrar que essa não é a tradução brasileira da Internacional. Esta é apenas a tradução literal da versão poética em russo, ou seja, nesta língua, ela segue a métrica artística, e na nossa, não. As traduções poéticas em português, que em geral começam com “De pé, ó vítimas da fome... De pé, famélicos da terra...”, podem ser encontradas aos montes no YouTube. Decidi traduzir literalmente a versão russa porque a julgo como um documento histórico independente da canção A Internacional em si, hino socialista e anarquista traduzido pra centenas de línguas.
A tradução da Internacional que mais se consagrou na Rússia na virada dos séculos 19 e 20 foi a do poeta e tradutor Arkadi Iakovlevich Kots (1872-1943), cujo nome de nascença era Aron e assinava também como “A. Danin”, “A. Bronin”, “A. Shatov” e “D-n”. Sua versão da Internacional é de 1902, quando saiu na revista Zhizn (Vida) de Londres, mas só tinha o refrão e as estrofes 1, 2 e 6 do texto original. Kots só traduziu o resto em 1931, resultado publicado apenas em 1937. Os sociais-democratas russos usavam a tradução de Kots como hino partidário, e Lenin gostava muito da canção, dizendo que era um tipo de símbolo comum que unia os operários do mundo todo. Em 23 de janeiro de 1918, tornou-se hino da República Socialista Federativa Soviética da Rússia e, em 30 de dezembro de 1922, da URSS.
Seguindo o nacionalismo de Stalin, houve nos anos 30 um concurso pro novo Hino Nacional da URSS, encerrado quando uma peça de Sergei Vladimirovich Mikhalkov, Gabriel Arkadievich El-Registan (letra) e Aleksandr Vasilievich Aleksandrov (melodia) foi aprovada em 14 de dezembro de 1943 pelo Birô Político do PC e executada no rádio pela primeira vez na noite de 17 pra 18 de abril de 1944. A melodia desse hino e o famoso começo do refrão – Slavsia, Otechestvo nashe svobodnoie (Glória à nossa Pátra livre) – ainda estão hoje no Hino Nacional da Federação Russa, e a tradução de Arkadi Kots da Internacional é agora o hino do Partido Comunista da Federação Russa (KPRF), do Partido Operário Comunista da Rússia integrado ao Partido Comunista da União Soviética (RKRP-KPSS) e da União da Juventude Comunista Revolucionária (bolchevique) (RKSM(b)).
Na segunda metade de 2016, eu já fiz uma retradução da Internacional em russo encomendada pelo historiador Daniel Aarão Reis pra coletânea que ele estava organizando e anotando, Manifestos vermelhos e outros textos históricos da Revolução Russa. Aliás, eu também traduzi vários textos, atas e manifestos escritos ao longo do ano de 1917, por monarquistas, bolcheviques e mencheviques, inseridos nessa coletânea. O livro saiu há alguns meses, e por isso faço meu “merchan” aqui: como foram minhas primeiras traduções publicadas, comprem e divulguem o livro que saiu pela Penguin-Companhia das Letras! Assim, dado que os direitos autorais ficaram com a editora, fiz algumas alterações nessa nova tradução pra que eu pudesse inseri-la nas legendas do segundo vídeo.
Assim como faço com os hinos das repúblicas da URSS, o áudio do segundo vídeo tirei desta página. Eu fiz a montagem da bandeira da RSFS da Rússia usada de 1918 a 1920, com o brasão que vigorou na mesma época. Seguem abaixo as duas legendagens no canal Eslavo (YouTube), a letra em cirílico que serviu de hino de 1922 a 1944 e a tradução em português. A transliteração no segundo vídeo foi baseada no meu próprio sistema, então vejam este duas vezes, lendo uma legenda de cada vez!
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1. Вставай, проклятьем заклеймённый, Весь мир голодных и рабов! Кипит наш разум возмущённый И смертный бой вести готов. Весь мир насилья мы разрушим До основанья, а затем Мы наш, мы новый мир построим, – Кто был ничем, тот станет всем. Припев (2x): 2. Никто не даст нам избавленья: (Припев 2x) 3. Лишь мы, работники всемирной (Припев 2x) ____________________ 1. Levante, mundo servilizado, Com fome e chagado pela desgraça! Nossa razão rebelde está queimando E pronta para lutar a batalha mortal. Vamos arrasar o mundo ditatorial Desde as bases, e logo depois Edificar uma Terra nova, nossa, Quem não era nada vai ser tudo. Refrão (2x) 2. Ninguém vai nos libertar: (Refrão 2x) 3. Somente nós, operários do Grande (Refrão 2x) |